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Entrevistas diárias com pessoas de todas as áreas. Artistas, cientistas, professores, economistas, analistas ou personalidades políticas que vivem na França ou estão de passagem por aqui, são convidadas para falar sobre seus projetos e realizações. A conversa é filmada e o vídeo pode ser visto no nosso site.

Location:

Paris, France

Networks:

RFI

Description:

Entrevistas diárias com pessoas de todas as áreas. Artistas, cientistas, professores, economistas, analistas ou personalidades políticas que vivem na França ou estão de passagem por aqui, são convidadas para falar sobre seus projetos e realizações. A conversa é filmada e o vídeo pode ser visto no nosso site.

Language:

Portuguese


Episodes
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Artista e chef, Danilo Zocatelli apresenta pai vestido de drag queen para discutir afeto e gênero

8/6/2025
Depois de formado em gastronomia no Brasil, Danilo Zocatelli Cesco, de Marialva (PR), decide seguir carreira em Londres. A fotografia cruza o seu caminho e ele passa a desenvolver projetos artísticos, como “Dear Father” (Querido pai), que concorreu ao prêmio Dior de Jovens Talentos durante os Encontros de Arles, no sul da França. Patricia Moribe, enviada especial a Arles Um homem de meia-idade, maquiado ostensivamente e com uma peruca de cabelos pretos, longos e encaracolados, está de pé em cima de um trator, no meio de um campo. De braços erguidos, ele segura um pano vermelho, esvoaçante. Ele veste camiseta polo listrada e calça jeans. Barriga saliente. A imagem diverte, interpela. O trator faz pensar em trabalho árduo sob o sol a pino. Mas o homem em cima do trator é quem traz a chave, as informações para decifrar o conjunto incongruente. “A ideia começou toda baseada na necessidade de falar sobre mim mesmo. Comecei a pensar muito na minha relação com o meu pai, nessa ideia de que eu nunca o entendi, mas ele também nunca me entendeu. Comecei a pensar no meu pai como um buraco negro, metaforicamente”, explica Danilo Zocatelli. Danilo refletiu sobre sua criação, obrigado a se conformar em um ambiente machista, rural, onde menino joga bola e vai para a igreja. E se perguntou: "Por que eu não peço para o meu pai performar a minha queerness?" “A ideia é que, se meu pai performar a minha queerness, eu seria normalizado naquele ambiente em que sempre tive que performar, e do qual sempre me senti de fora, embora também me excluísse.” Danilo ligou para o pai e explicou o projeto. O pai respondeu: "Desde que você traga uma peruca bonita para mim, uma para a sua mãe, eu faço". “Aprendi a fazer a maquiagem para maquiá-lo, porque queria que o processo começasse desde o toque, não para transformá-lo em outra pessoa, mas para estar junto dele, tocá-lo e criar essa reversão de papéis. Juntos, criamos essas imagens no sítio, ressignificando memórias negativas de crescimento”, conta. Juntos, pai e filho recriaram imagens da infância de Danilo, como cuidar das plantas, ir à igreja e o sacrifício de um carneiro. “O carneiro é minha carne favorita e meu pai sempre tinha um à minha espera, sempre que eu voltava para o Brasil e o ritual representa um ato de amor”. O projeto é estruturado em torno de uma carta escrita por Danilo após as fotografias feitas, intitulada "Dear Father". Nesta carta, ele se expressa sobre seus sentimentos com o pai. Cada imagem do projeto é acompanhada por um trecho dessa carta, permitindo uma leitura conjunta de texto e imagem. O projeto foi desenvolvido durante mestrado no Royal College of Art e Danilo Zocatelli foi finalista em Arles do Prêmio Dior para Jovens Talentos, uma competição internacional destinada a estudantes e recém-formados de escolas de arte e fotografia. Da gastronomia à fotografia Danilo conta que apesar de sempre ter se interessado por arte, nunca se imaginou atuando profissionalmente. Mas, incentivado por um amigo, ele voltou à universidade para estudar fotografia. Um dos primeiros projetos foi "Flipside Prison Stories" (algo como “o outro lado das histórias de prisão”). Danilo atuou como chef em uma prisão feminina, ensinando as detentas a cozinhar e estabelecendo amizade com elas. Depois de soltas, ele criou um vídeo pedindo que elas relatassem "momentos cômicos da prisão", buscando reverter a percepção de que a prisão é um lugar puramente triste. Em Arles, Danilo também apresentou "Takeaway" (2022), que aborda o consumismo desenfreado de comidas entregues a domicílio. Danilo usou um scanner encontrado na rua e fez uma série de imagens – sem câmera – a partir de uma embalagem descartável de comida, onde ele colocou objetos diversos. Até o papel usado para as impressões foi criado artesanalmente, triturando menus de restaurantes distribuídos como flyers. A intenção era transformar algo "super consumista em algo único", ressignificando o ato. O prêmio Dior 2025 de Jovens Talentos...

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Escritor boliviano radicado no Brasil lança na França premiado romance "Seul, São Paulo"

8/5/2025
O romance “Seul, São Paulo”, vencedor do principal prêmio literário da Bolívia em 2019, acaba de ser publicado na França, pela editora Métailié. O autor Gabriel Mamani Magne nasceu em La Paz em 1987, fez mestrado em literatura comparada na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutorado em Goiânia, onde mora atualmente. “Seul, São Paulo” foi traduzido também para o hebreu e para o português. No Brasil, foi publicado pela Todavia em 2024. Este é o primeiro romance de Gabriel Mamani Magne, que já havia escrito livros infanto-juvenis. A inspiração para a obra veio quando ele chegou ao Brasil em 2016. A história navega entre a capital paulista, El Alto, também na Bolívia, La Paz e uma Seul simbolizada pelas canções de K-pop e pela comunidade sul-coreana de São Paulo. Para ele, mergulhar na cultura, na política e na academia brasileira foi uma experiência forte e importante. “Só o fato de acordar cada dia, falar uma palavra que não estava na minha língua original, que é o espanhol, já me gerava muitas questões, muitas perguntas. O que é legal é que quando você viaja, você é o outro, você vira o outro”, explicou. A descoberta da comunidade boliviana em São Paulo, uma das maiores da cidade, foi um ponto de partida fascinante. O autor valorizou na narrativa as estratégias históricas de preservação cultural e a mistura linguística dessa comunidade. “Foi uma experiência para mim, bem legal. Me ajudou a entender mais a Bolívia do que o Brasil, porque só olhando de fora do país, só pensando a partir de outra geografia, você vai entendendo, você vai se identificando, você vai fazendo perguntas que de repente eu não teria feito se eu tivesse ficado na Bolívia”. Romance de formação Os dois personagens principais do romance são dois primos: Tyson, que cresceu em São Paulo e volta para a Bolívia, e Pacsi, o narrador, que está fazendo o serviço militar. Os dois exploram as experiências do final da adolescência e descobrem o álcool, o sexo, as paixões. A história aborda questionamentos sobre identidade migrante, indígena, boliviana e linguística, sendo um romance de formação. Quando questionado sobre elementos autobiográficos da narrativa, Mamani é taxativo: “Na verdade, não. Seria legal que a minha vida fosse tão interessante quanto a vida dos personagens”. Ele diz que o mercado editorial sempre busca histórias autobiográficas. “Acho que a editora brasileira, a editora boliviana, francesa, adorariam que eu fosse um migrante que trabalhasse nas oficinas de costura no Brasil, com uma história de superação, mas eu sou uma pessoa padrão. Fui fazer mestrado. Eu tenho a minha história pessoal que não se parece com isso”. A crítica boliviana elogiou o livro por revelar uma “outra Bolívia”, mas Mamani discorda dessa visão. Para ele, o país tem uma tradição cultural historicamente dominada pelas classes privilegiadas, assim como o Brasil e a França. "A Bolívia dos mercados, a Bolívia indígena, que é imigrante, é a oficial. Só que esses críticos moram numa bolha tão distante da realidade social que isso parece exótico para eles. Você vai para a rua, você vai para a Avenida Paulista, em São Paulo, tem bolivianos migrantes, tem bolivianos que falam português, tem bolivianos que escutam K-pop", argumenta. Ele considera uma vergonha que seu livro seja um dos primeiros a falar sobre essa realidade. Estilo ágil e divertido O estilo narrativo de Mamani é ágil e divertido, misturando poesia e falas coloquiais. “Eu penso que a parte mais difícil na tarefa do escritor é encontrar sua voz. Percebi que gosto muito da poesia, mas, ao mesmo tempo, eu gosto também das falas coloquiais, eu gosto do xingamento, eu sinto que a vida real é isso”, indica. O escritor boliviano acredita que seu estilo foi potencializado pela vivência no Brasil. “Se você acrescentar a isso o que o português faz com o meu espanhol, a gente tem uma coisa bem dinâmica, uma coisa que é quase como uma dança”, define. O prêmio e as traduções de “Seul, São Paulo” mudaram...

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Projeto de restauro traz à tona filme inacabado sobre chegada de nadadores japoneses ao Brasil em 1950

8/4/2025
O pesquisador Tomyo Ito Costa, pós-dourando em Cinema, da ECA-USP, participou em Lyon, em junho, de um colóquio internacional sobre a produção cinematográfica nipo-brasileira. Ele falou sobre o misterioso e inacabado filme "A Visita dos Nadadores Japoneses ao Brasil", de 1950, e sobre o projeto Nitratos, de recuperação de antigos filmes do acervo da Cinemateca Brasileira. Patrícia Moribe, enviada especial da RFI a Lyon O Projeto Nitratos (2023-2024), integrante do programa Viva Cinemateca, teve como objetivo a conservação, catalogação e digitalização de filmes em nitrato de celulose, um material antigo e frágil, que compõe a coleção mais antiga do cinema brasileiro. Essas obras foram produzidas nas cinco primeiras décadas do século XX. Até maio de 2024, o projeto recuperou e digitalizou cerca de 3.000 rolos de filmes, totalizando aproximadamente 1.895 títulos. O pesquisador Tomyo Costa Ito trabalhou no projeto de fevereiro a novembro de 2023. A Cinemateca Brasileira possui o maior acervo audiovisual da América do Sul, com cerca de 40 mil títulos e mais de 1 milhão de documentos. Sua principal função é preservar a memória da produção audiovisual brasileira, armazenando e restaurando filmes há 75 anos. Nadadores Japoneses O pesquisador Tomyo Costa Ito participou do Projeto Nitratos. Ele escolheu trabalhar um filme específico: "A Visita dos Nadadores Japoneses ao Brasil", de 1950, que registra a turnê dos melhores nadadores japoneses da época pelo país. Eles visitaram diversas cidades, principalmente em São Paulo, que possuíam grandes comunidades de imigrantes e seus descendentes. A análise de Tomyo revela que o filme, com elementos estéticos de cinejornais, funciona como uma "certa propaganda do desenvolvimento do estado de São Paulo na época", detalha o pesquisador. Os governantes buscavam transmitir uma imagem de modernidade e desenvolvimento, associando o desempenho dos atletas japoneses ao progresso econômico. Além das competições, o filme também promove as cidades, destacando a economia e a agricultura, como a produção de café. A obra contribui para a "construção de uma imagem dessa comunidade japonesa, que é muito, no filme, associada ao trabalho, à performance", explica Tomyo. O filme apresentou um desafio de pesquisa, pois é anônimo, sem créditos ou cartelas. Tomyo precisou pesquisar o próprio conteúdo do filme e usar jornais da época para obter informações sobre a visita dos nadadores. Paralelos de propagandas de governo Embora temática e geograficamente distinta, a pesquisa atual de Tomyo Costa Ito mantém a relação com a história e o cinema. Ele agora investiga a propaganda do Khmer Vermelho, o regime autoritário do Camboja nos anos 1970. Segundo Tomyo, esses filmes "dialogam" com a produção sobre os nadadores japoneses por buscarem transmitir uma mensagem específica. No caso do Camboja, a propaganda visava promover o governo socialista, mesmo que grande parte de seu conteúdo não refletisse a realidade, sendo usada para manipular.

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'Estamos só no começo da crise', diz cientista político sobre desdobramentos do tarifaço de Trump

7/31/2025
Mais do que uma medida econômica, o chamado "tarifaço" assinado por Donald Trump na quarta-feira (30) carrega um forte componente político e ideológico, na avaliação do cientista político Gaspard Estrada, da London School of Economics. Em entrevista à RFI, Estrada analisa os desdobramentos da decisão, os impactos para setores estratégicos da economia e suas implicações diplomáticas, além de possíveis consequências políticas no contexto das eleições presidenciais brasileiras de 2026. RFI: O tarifaço de Trump não é apenas mais uma ameaça. Qual o componente ideológico e político dessa iniciativa, na sua opinião, e como isso impacta nas negociações entre os dois países? Gaspard Estrada: O tarifaço imposto pelos Estados Unidos ao Brasil, evidentemente, tem um componente político que está escrito explicitamente na ordem executiva assinada pelo presidente dos Estados Unidos. Isso, a meu ver, vai dificultar as negociações sobre essa problemática comercial, e é evidente que não se trata só de um assunto econômico, e sim, sobretudo, de um problema político. RFI: Que resultados você acha que podemos ter no curto e médio prazo para o Brasil? Gaspard Estrada: Haverá uma consequência econômica, porque há vários setores econômicos que são afetados por esse tarifaço. Agora, é evidente que o impacto será menor do que o planejado num primeiro momento, porque houve um grande volume de produtos que não fazem mais parte desse tarifaço. Isso vai permitir que o governo brasileiro possa dar apoios aos produtores e focalizar esses programas de apoio nos itens que, sim, serão afetados. Mas, de modo geral, não será uma catástrofe econômica para o Brasil. RFI: Vamos falar de outro gigante latino-americano, que é o México e que também é comandado por alguém que está à esquerda do espectro político, a presidente Claudia Sheinbaum, assim como Lula no Brasil. Em um passado muito recente, o México enfrentou ameaças tarifárias semelhantes, mas conseguiu negociar. O Brasil deixou de fazer ou fez algo errado nessas negociações com Trump? Gaspard Estrada: Eu sinceramente diria que não, porque o Brasil fez, tentou fazer uma coisa similar ao México, quer dizer, tentar ter um diálogo diplomático, complementando com toda uma associação com o setor empresarial, justamente para deixar claro quem ganha e quem perde com esse tipo de imposição. Então, do ponto de vista do México, esse anúncio unilateral dos Estados Unidos foi visto com muita preocupação, porque o país tem um acordo de comércio com os Estados Unidos que, inclusive, foi assinado pelo presidente Trump. Não é o caso do Brasil, que não tem acordo de livre comércio. Agora, o que fez com que a coisa mudasse de rumo e de patamar entre — se a gente compara México com o Brasil — é que tem, em Washington, um ator público brasileiro com acesso ao poder executivo americano e que está trabalhando contra os interesses do seu país. Leia tambémAusência de argumentos técnicos escancara viés político do tarifaço de Trump contra o Brasil RFI: O senhor está falando do Eduardo Bolsonaro? Gaspard Estrada: Exatamente. Não tem o Eduardo Bolsonaro no caso do México. Então, é evidente que isso faz com que a negociação entre os dois países possa acontecer de uma maneira muito mais racional e que os interesses não só dos Estados, mas também os interesses empresariais, sejam ouvidos de maneira muito mais clara pelas autoridades americanas. A meu ver, esse é o grande diferencial entre México e Estados Unidos e Brasil. RFI: O fato de alguns setores da economia brasileira, setores estratégicos, não terem sido taxados, como aviação, por exemplo, já mostra que houve uma pré-negociação com outros atores, como o Congresso norte-americano, empresas ou aliados europeus, para preparar o terreno para esse tarifaço? Gaspard Estrada: Eu acho que o setor privado brasileiro tem tido sucesso em justamente conseguir destravar algumas partes dessa tarifa. Penso, em particular, no trabalho que foi feito pelo presidente da Embraer nos...

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Brasil em Avignon: presidente da Funarte defende 'formação, difusão e permanência' nas artes internacionais

7/25/2025
No Festival de Avignon de 2025, o Brasil ocupou um lugar de destaque como país homenageado da mostra paralela do maior evento de artes cênicas do mundo, em cartaz até o dia 26 de julho no sul da França. À frente dessa missão estava Maria Marighella, presidente da Funarte, que, em entrevista à RFI falou sobre os desafios, os significados e os desdobramentos dessa presença brasileira em solo francês. Márcia Bechara, enviada especial a Avignon “É uma alegria estar aqui de novo, falando das nossas experiências, mas agora dentro desse ano cultural, esse ano de diálogo Brasil-França, França-Brasil, com nossas perspectivas comuns, tarefas, responsabilidades e, sobretudo, sonhos compartilhados”, afirmou Marighella, destacando o caráter "simbólico e político" da participação brasileira. A presença brasileira em Avignon não é inédita, mas desta vez, segundo a presidente da Funarte, o objetivo foi mais ambicioso: apresentar um panorama amplo, "polifônico" e representativo da cena artística nacional. “O que nós imaginamos é que o Brasil seja lido não apenas por uma obra ou por artistas isolados, como se fossem descobertos. Um país sabe se contar quando consegue apresentar sua multiplicidade, seu conjunto”, explicou. A construção dessa participação envolveu uma articulação complexa entre instituições públicas, artistas, curadores e organizações culturais. A parceria entre a Funarte, a Mostra Internacional de Teatro de São Paulo (MITsp) e a associação francesa Avignon Festival & Compagnies (AF&C) foi fundamental para viabilizar a vinda de 13 espetáculos brasileiros ao festival. “Isso exige a promoção de consensos entre agentes, governos, instituições, estéticas e vozes. Estamos muito felizes de ter conseguido apresentar esse conjunto do que somos”, disse. Leia tambémCia brasileira traz materialidade radical do teatro em diálogo com a pornografia para Avignon Presença internacional mais "permanente" Para Marighella, o ano cultural Brasil-França funciona como uma plataforma de "experimentação e diplomacia cultural". Mas ela ressalta que a ambição da Funarte vai além da temporada cruzada. “Queremos uma presença mais permanente, mais estruturante. Estar aqui não é mais apenas prospecção, mas também uma forma de pensar políticas que garantam a continuidade de ações.” Um dos destaques da participação brasileira foi o programa de formação voltado à nova geração de artistas. Em parceria com o Avignon Off — a mostra paralela do festival, conhecida por sua diversidade e experimentação — a Funarte selecionou, por meio de edital público, jovens artistas brasileiros de até 29 anos para residências artísticas em Avignon e Lyon, nas áreas de teatro e dança. “É uma missão importantíssima. Esses jovens estão em processo de formação e agora têm acesso a um espaço de intercâmbio internacional. Eles participam de uma comitiva de mais de 80 jovens de vários países, com oficinas, mediações, ingressos para espetáculos. É uma forma de viver Avignon de maneira protegida, no melhor sentido da palavra: com mediação, com apoio institucional”, explicou Marighella. Segundo a presidente da Funarte, esse tipo de ação é essencial para uma política de internacionalização das artes brasileiras que inclua também a formação. “Estar em Avignon não é apenas estar na França. É estar num território internacional. Este ano, por exemplo, o festival dedica sua programação à língua árabe. Estamos falando de políticas de fronteira, de territorialidades, temas que também são fundamentais para o Brasil.” Leia também'Azira’i' emociona Avignon com ancestralidade, canto e resistência indígena do Brasil Ela também destacou a importância de levar não apenas espetáculos, mas pensamento crítico e conceitual. “Internacionalizar não é apenas garantir que uma obra seja vista, mas tornar um pensamento relevante em um contexto além do nosso país”, disse, citando a fala da intelectual Leda Maria Martins. “Estar presente com uma mirada conceitual é tão importante quanto apresentar...

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Água produzida a partir da umidade do ar na Amazônia gera renda e vira bebida premium em Paris

7/23/2025
A ideia surgiu há mais de duas décadas, mas foi em 2015 que começou a se tornar realidade com a criação da marca Ô Amazon Air Water, empresa que hoje exporta água engarrafada para o mundo inteiro. Em Paris, hotéis de luxo, como o Ritz, já aderiram ao produto único. Cal Junior nasceu no Rio de Janeiro, mas sempre manteve forte conexão com a natureza pelo fato de sua mãe ter origens amazônicas. Há mais de uma década, ele resolveu empreender em algo inusitado: a transformação da umidade dos “rios voadores” da Amazônia em água potável. O empresário contou à RFI que a ideia surgiu por volta de 2009, quando realizou pesquisas sobre a tecnologia AWG (Atmospheric Water Generator). "Eu comecei a estudar energia, resíduos sólidos e água. Em um determinado momento, acessei a tecnologia que produz água da umidade do ar. O primeiro insight foi desenvolver a tecnologia e desenvolver máquinas que possam produzir água. Dessa forma, atender uma necessidade da água para consumo humano". Mas após uma análise de mercado, Cal entendeu que seria mais interessante vender o resultado da produção desta tecnologia. A partir disso, o carioca foi em busca do "ar mais puro do mundo", onde instalou sua empresa. Fundada às margens do rio Negro, em Barcelos, no estado do Amazonas, no prédio de uma antiga fábrica de palmito inserida em uma área de 175 hectares dentro da floresta, a Ô Amazon Air Water se diferencia por sua tecnologia, criada para condensar a umidade do ar em água de alto padrão de qualidade. Como é o processo de captura da água do ar O empresário conta que a operação é mais simples do que se imagina. “É um processo de condensação. O ar é atraído, bate em uma serpentina. No nosso caso, todo o ambiente ao entorno é bombardeado de raio ultravioleta que é bactericida e faz a água pingar. Aquela água que pinga é transformada depois em um produto para consumo” diz, também ressaltando o alto nível de mão-de-obra especializada que participa do processo, além de equipamentos. “É uma metodologia de acelerar o processo natural de condensação. As pessoas confundem, pensam que é água da chuva, mas não. É uma máquina que fica, no nosso caso, a dois metros da altura do solo, de frente para o rio Negro, aproveitando o que hoje nós temos de mais intenso na Amazônia, que é a umidade. É importante falar que os 'rios voadores' são o resultado da transpiração das árvores. Então, o que a gente faz, na verdade, é pegar uma água produzida pelas árvores. A gente só acelera o processo de condensação”, detalha o carioca. Geração de emprego e renda na Amazônia Cal Junior descreve que a empresa se integra à economia da região e às comunidades indígenas desde a sua fundação. “Não existe projeto social melhor do que a geração de emprego e renda. E depois nós temos nossos trabalhos na área social e uma integração agora com a Cufa Amazonas, que faz a curadoria dos projetos sociais que a gente desenvolve”, destaca. “A relação com os nossos povos ancestrais, tanto o ribeirinho quanto os povos indígenas, já foi pensado no início. Nós acreditamos que para trabalhar a proteção, o desenvolvimento e a defesa da Amazônia, só o amazônida pode. Então a gente investe em quem está lá, 90% da nossa equipe é ou morador, ou nasceu, ou escolheu viver na Amazônia”, afirma Cal. A Ô Amazon Air Water exporta atualmente para vários países. A empresa tem como foco hotéis e restaurantes de alto padrão, especialmente onde há demanda por produtos premium e sustentáveis, como o hotel Ritz, em Paris, um dos clientes da marca. Livro sobre empreendedorismo e COP30 Cal Junior também lançou o livro “Empreendendo Alto Valor na Amazônia” e falou sobre o tema na Expo Favela Paris, no último 4 de julho, em convergência às temáticas levantadas sobre a próxima Conferência da ONU sobre o clima, a COP30, em novembro na cidade de Belém, que também integra a região amazônica. “Empreender no mundo já é difícil. Empreender no Brasil é mais difícil ainda. E empreender na Amazônia é um verdadeiro desafio....

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'Cirurgia robótica se democratiza': médico brasileiro destaca avanços em congresso mundial

7/23/2025
O Congresso Mundial de Cirurgia Robótica, encerrado no domingo (20) em Estrasburgo, no leste da França, revelou avanços na democratização dessa tecnologia. A RFI conversou com o ginecologista paulista Giuliano Borrelli, especialista em cirurgia minimamente invasiva e cirurgião robótico. Durante o congresso, ele apresentou trabalhos relacionados com a endometriose, doença que se caracteriza pela presença de tecido endometrial, normalmente encontrado apenas no útero, em outras partes do corpo. Com entusiasmo, o médico paulista disse à RFI que uma das grandes novidades vistas nesta edição do Congresso internacional, que tem se tornado um dos maiores eventos no mundo nessa área, foi "um caminho para a democratização da cirurgia robótica". Segundo Giuliano Borrelli, os principais países que hoje atuam com essa tecnologia enfrentam uma dificuldade comum, que são os custos associados a esse tipo de operação. "A cirurgia robótica é praticada há 15 anos no Brasil, mas a gente esbarra muito nessa questão do custo" elevado do procedimento. Ele conta que durante quase 18 anos, só existia uma única empresa no mundo que possibilitava esta cirurgia para diferentes especialidades, como ginecologia, cirurgia geral, cirurgia torácica e urologia. Esse fabricante pioneiro, dos Estados Unidos, manteve a patente da ferramenta, dificultando a redução dos custos. "O que a gente viu nesse Congresso, em 2025, é que dois anos depois da quebra da patente, nós já temos pelo menos oito a dez concorrentes da indústria no mundo inteiro, em diferentes países, fazendo com que esta competição saudável torne o preço e o acesso muito maior", destacou o médico. "Países como China, Japão, Reino Unido e Coreia do Sul estão com tecnologias próprias, além dos Estados Unidos, que foram os pioneiros. São muitas as alternativas de plataformas que estarão disponíveis no mercado mundial e com certeza isso trará mais acesso. Podemos sim falar em democratização da cirurgia robótica", ressaltou Borrelli. Precisão e segurança A endometriose é uma doença que atinge milhões de mulheres no Brasil e no mundo, com consequências para a vida da pessoa: dores crônicas e dores relacionadas principalmente ao período menstrual reconhecidas como incapacitantes para a paciente. "As mulheres portadoras de endometriose têm nos seus períodos menstruais, nos seus ciclos, o momento de maior exacerbação dos sintomas de dor e são dores que normalmente não cessam com medicações convencionais, como anti-inflamatórios e analgésicos", assinala o ginecologista. "Esses casos são aqueles que normalmente precisarão de um tratamento cirúrgico para remover as lesões de endometriose", explica Borrelli. A patologia ainda atinge os órgãos relacionados à parte reprodutora: útero, ovários, tubas uterinas e órgãos ao redor do útero, como bexiga, intestino, podendo comprometer a fertilidade. Em cerca de 50% dos casos, estima-se que a fertilidade da mulher pode ser afetada. "A cirurgia é desafiadora porque precisamos remover a doença desses órgãos e tecidos, mas ao mesmo tempo temos que preservá-los para que essas mulheres jovens tenham ainda o seu futuro reprodutivo mantido", destaca Borrelli. Para essa doença, a cirurgia robótica se mostrou ainda mais segura e eficaz, diz o médico, sobretudo no aspecto da precisão. "Ela adiciona a visão em três dimensões. Então, diferente da tecnologia da videolaproscopia convencional, nós temos na robótica uma visão em 3D, o que traz uma maior capacidade de identificarmos os tecidos doentes e os tecidos sadios", aponta. Outro aspecto inovador é que "o braço do robô é calculado de uma maneira que o braço humano não conseguiria replicar", detalha Borrelli, oferecendo precisão e segurança para o cirurgião. As operações por robótica proporcionam menos sangramento, melhores resultados na recuperação e volta mais rápida às atividades normais do paciente. IA vai acelerar treinamento de novos cirurgiões Borrelli, que tem uma clínica especializada em endometriose em São...

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'La Roue de la Vie': Antônio Interlandi traz roda viva de memória e afeto para o Festival de Avignon

7/21/2025
Durante o Festival de Avignon de 2025, um dos destaques da mostra paralela dedicada ao Brasil é o espetáculo La Roue de la Vie, do ator, diretor e produtor brasileiro Antônio Interlandi. Inspirado na canção “Roda Viva”, de Chico Buarque, o título em francês carrega mais do que uma tradução poética — é o eixo simbólico de uma dramaturgia que gira entre o exílio, a memória e a música. Márcia Bechara, enviada especial da RFI a Avignon “Na peça eu conto basicamente a partida de alguém do Brasil para França, claro, baseado um pouco na minha história”, diz Interlandi, que vive há três décadas na França. A narrativa parte de uma lembrança pessoal: aos 17 anos, prestes a embarcar para a Europa, recebeu de uma amiga uma fita cassete com músicas brasileiras. “Estava escrito assim: ‘para você não esquecer as músicas do teu país’. Quando eu estava montando o espetáculo, isso voltou à minha memória. Eu falei: ‘Gente, o espetáculo é essa fita cassete que se desenrola’.” A metáfora do desenrolar da fita se transforma em estrutura dramatúrgica. Por meio de canções de Chico Buarque e de fragmentos de memória, Interlandi constrói uma dramaturgia do deslocamento — ou, como dizem os franceses, do déracinement, o desenraizamento. “No avião, eu sentia que a cada avanço, um pouco mais da minha raiz ficava para trás”, lembra. Apesar do caráter autobiográfico, o artista evita o rótulo. “Não quis fazer uma autobiografia. Passei de coisas que eu vivi, que eu adaptei, e adicionei a isso uma boa parte do repertório do espetáculo, que são músicas do Chico.” A escolha do compositor não é casual: “Usei esse olhar radiográfico que o Chico tem da sociedade para contar ao mesmo tempo coisas do Brasil.” Entre o pessoal e o político O espetáculo transita entre o pessoal e o político. Canções como Sinhá e Apesar de Você servem de ponto de partida para reflexões sobre a escravidão, o racismo e a ditadura militar. “Eu nunca entendi o racismo no Brasil, porque tanta mistura… então quem é o quê e de qual cor, né?”, provoca Interlandi. Mas o espetáculo também mergulha no afeto. “Não dá para fazer um espetáculo sobre música brasileira sem falar de amor e de desamor”, afirma. Canções como Bastidores e O Meu Amor revelam camadas emocionais que, segundo ele, “interessam muito aos franceses, talvez até mais o desamor do que o amor”. Leia tambémDa ancestralidade à identidade: espetáculos brasileiros ocupam o OFF do Festival de Avignon A música, aqui, não é trilha sonora, mas matéria dramatúrgica. Ao lado do pianista francês Mathieu El Fassi — parceiro de longa data — Interlandi constrói um espetáculo de voz e piano, sem percussão, sem clichês tropicais. “Mathieu é um pianista clássico, antes de tudo. Então tem uma riqueza nesse repertório respeitando tudo aquilo que o Chico ou os outros escreveram.” Mesmo cantadas em português, as canções atravessam a barreira da língua. “A música toca diretamente no ponto, sem passar pelo cérebro, por compreensão”, observa. A resposta do público francês, segundo o artista brasileiro, tem sido comovente. “Outro dia tinha duas francesas chorando no final. Disseram: ‘A gente também saiu de um lugar, foi para outro. Não era o Brasil, mas a gente se identificou tanto’.” La Roue de la Vie é, segundo Interlandi, um espetáculo sobre "travessias" — geográficas, afetivas, culturais. Um solo que se desdobra em muitas vozes, embalado por uma trilha que é, ao mesmo tempo, "memória e resistência". O espetáculo La Roue de la Vie fica em cartaz até o dia 26 de julho, às 15h45 no Théâtre 3S, durante a programação da mostra paralela do Festival de Avignon. *Para ouvir a entrevista na íntegra, clique no botão PLAY acima

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Ensino da língua portuguesa na Guiana Francesa é uma “necessidade”, diz professor

7/18/2025
A comunidade brasileira na Guiana Francesa é uma das mais expressivas. Segundo uma estimativa de 2022 do Ministério das Relações Exteriores, mais de 90 mil brasileiros vivem no território francês de 300 mil habitantes, que faz fronteira com o norte do Brasil. Proporcionalmente, isso significa que quase um em cada três moradores fala português. Essa realidade aumenta a “necessidade” de aprender o português no território, diz Rosuel Pereira, professor e pesquisador da Universidade da Guiana, responsável pelo departamento de inglês e português e vice-reitor de Relações Internacionais da instituição. Em entrevista à RFI em Caiena, Rosuel Pereira abordou a crescente importância do ensino e do domínio da língua portuguesa no território, especialmente devido ao aumento da população brasileira. A maioria desses imigrantes busca oportunidades de trabalho na Guiana Francesa, principalmente na construção civil e no garimpo. Eles vêm majoritariamente de três estados, Amapá, Pará e Maranhão, informa o professor e vice-reitor da Universidade da Guiana. Muitos imigrantes brasileiros são indocumentados. Por isso, é difícil saber com precisão o número exato de brasileiros no território francês. Mas ao andar pelas ruas de Caiena, por exemplo, é possível ouvir o português em cada esquina, revelando uma presença realmente prolífera. Desde a criação da Université de Cayene há cerca de 10 anos, o ensino do português vem se consolidando, com alunos não só brasileiros, mas também guianenses interessados em aprender o idioma. Segundo Rosuel Pereira, “há um interesse de aprender o português não somente dos filhos de brasileiros, mas também de guianenses que falam o português da rua, com colegas e amigos, e depois vêm aperfeiçoar na universidade”. O curso de português-língua estrangeira aplicada da universidade recebe 140 alunos por ano. A língua é também lecionada no ensino fundamental e médio. Além disso, o intercâmbio educacional entre o estado do Amapá e a Guiana tem impulsionado o ensino bilíngue, com classes de português em liceus na fronteira. Português nas instituições francesas A presença crescente de brasileiros na região exige profissionais capacitados para atender essa comunidade e essa realidade cria a “necessidade” de aprender o português no território francês, indica Rosuel Pereira. O professor, responsável pela licenciatura de inglês e português da Universidade da Guiana, diz que já foi procurado por várias instituições locais, como a polícia, hospitais e o sistema judiciário, visando capacitar seus funcionários. A taxa de criminalidade relacionada a atividades ilegais, como o garimpo ou o tráfico de drogas, está em alta, elevando o número de brasileiros também nas prisões da Guiana Francesa. Somente em um dos complexos penitenciários locais, o Remire-Montjoly, que tem mil presos para apenas 600 vagas, 15% dos detentos têm nacionalidade brasileira. “Já formamos profissionais ligados à alfândega, polícia, saúde e serviço social”, explica o professor, lembrando que há um esforço para que “esses profissionais possam estar em contato com brasileiros no dia a dia, seja para tratar de saúde ou questões judiciais”. Agora, universidade está desenvolvendo um diploma universitário voltado ao ensino prático do português. Vantagem profissional Falar português se tornou uma vantagem profissional significativa na Guiana Francesa, especialmente nos setores de comércio, saúde, segurança pública e serviços sociais. “Há uma necessidade de que pessoas formadas falem português e que possam servir também de intérpretes”, destaca o vice-reitor de Relações Internacionais. Com a imigração contínua e o desenvolvimento econômico da região, “é necessário acolher bem essas pessoas, para que elas possam se integrar à sociedade guianense”, salienta. Mas o interesse pelo português vai além da necessidade prática e envolve "tudo o que está ligado à cultura”. Cresce o interesse pelo estudo da variante “brasileira” falada no território. Palavras e...

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Marcos Yoshi trabalha memória e percalços da imigração dekassegui em novo documentário

7/17/2025
O cineasta e pesquisador Marcos Yoshi, doutor em Cinema pela USP, está desenvolvendo seu próximo longa-metragem documental, intitulado “Toshi Voltou do Japão”. O projeto foi apresentado durante um colóquio em junho em Lyon, no leste da França, que discutiu o cinema feito por nipo-brasileiros, as histórias de imigração e retorno entre o Japão e o Brasil. Patrícia Moribe, em Lyon “Toshi Voltou do Japão” é centrado na complexa trajetória de Toshi, tio paterno do diretor. Toshi imigrou para o Japão em 1990, como dekassegui [brasileiro descendente de japoneses que vai ao Japão para trabalhar, principalmente em fábricas]. Quatro anos depois, ele precisou retornar ao Brasil, relatando ter sido vigiado e perseguido. Segundo Marcos Yoshi, "muito da experiência que ele teve no Japão de isolamento social, de alienação, desencadeou os transtornos mentais que ele acabou tendo". Posteriormente, esses transtornos foram diagnosticados como esquizofrenia. Toshi viveu quase metade de sua vida sob o estigma de sua condição psíquica, com períodos de internação em hospitais psiquiátricos, falecendo em 2022, aos 60 anos. Marcos Yoshi explica que a memória que tem de seu tio é fragmentada: "as poucas memórias que as pessoas têm dele são restritas à família, às irmãs dele e ao meu pai". Essa escassez de lembranças o levou a uma reflexão central para o filme: "isso me levou a pensar que, no fundo, por conta dessa condição dele, ele acabou virando um fantasma. E o filme parte um pouco desse vazio e dessa ideia de que eu vou filmar o fantasma do meu tio". A questão principal do documentário, explica, é "como contar a história de alguém sobre quem se sabe tão pouco?". O projeto não se limita à história individual de Toshi, mas se expande para as experiências de outros homens nipo-brasileiros da mesma geração, que hoje teriam entre 60 e 70 anos. Yoshi aponta que esses homens, pertencentes à primeira geração de dekasseguis, não contavam com redes de apoio ou assistência organizada no Japão, o que os deixou sem auxílio diante das intensas condições de vida e pressão psicológica. "Nesse sentido, o fantasma de Toshi não é apenas individual, mas coletivo – uma representação das dores e apagamentos de uma geração de trabalhadores", afirma o cineasta. Para lidar com a ausência de material e a fragmentação da memória, o filme adota uma abordagem experimental, propondo "atos de fabulação e fantasmagoria". Outros Trabalhos A programação do colóquio em Lyon também incluiu a exibição de “Bem-vindos de Novo” (2021), o primeiro longa-metragem de Marcos Yoshi, um relato íntimo sobre seu núcleo familiar de pais e irmãs. Seus pais também foram para o Japão como dekasseguis em 1999, permanecendo por 13 anos, o que levou à separação da família, com os filhos ficando no Brasil. “Bem-vindos de Novo” aborda o reencontro familiar após o retorno dos pais ao Brasil e a necessidade de "lidar com as feridas, com os sentimentos que ficaram de certa forma abertos”, explica Yoshi. O diretor comenta que o filme "serviu para tentar criar outro tipo de relação entre pais e filhos, criar um espaço onde esses laços pudessem ser reconstruídos e ressignificados, sem que isso necessariamente signifique uma família feliz". A obra buscou ser ainda "um meio para que a gente conseguisse expressar os nossos sentimentos, para que a gente conseguisse conversar sobre assuntos que atravessam toda essa experiência". Cinema da reconstrução Apesar do recente destaque do cinema brasileiro em eventos internacionais, com premiações no Oscar e em Cannes, Marcos Yoshi aponta para desafios significativos na indústria nacional. Ele observa que "os fundos têm sido canalizados para grandes produções". "Está muito difícil financiar projetos que sejam, como no meu caso, projetos menores", afirma. Ele também destaca que linhas de fomento que existiam anteriormente no Fundo Setorial do Audiovisual, voltadas para cineastas em seus primeiros filmes ou para produções autorais/mercado internacional,...

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"Construção, Desconstrução, Reconstrução": fotografia modernista brasileira é protagonista em Arles

7/15/2025
Uma ambiciosa exposição nos Encontros de Arles, na França, um dos principais festivais de fotografia do mundo, traz um olhar inédito sobre a fotografia modernista brasileira, com o título de “Construção, Desconstrução, Reconstrução (1939-1964)" e curadoria de Helouise Costa e Marcela Marer. Patrícia Moribe, enviada especial a Arles A mostra é destaque na mídia francesa e internacional. Muitos visitantes admitem que não conheciam a riqueza desse período, um olhar urbano correndo em paralelo com a metrópole paulista, visionária, de muito concreto. Uma aula de história e análise diante de 200 imagens vindas de quatro países e reunidas para esse inventário exposto na Mécanique Génerale, na Fundação Luma. O título da exposição, "Construção, Desconstrução, Reconstrução", foi inspirado na poesia concreta brasileira, contemporânea à produção dos fotógrafos em destaque. Ele se desdobra em três conceitos curatoriais que organizam a mostra em três salas distintas. “O primeiro circuito é construído em torno de uma certa modernidade, traçando um paralelo com a arquitetura que edifica e uma fotografia que busca vislumbrar um futuro promissor”, explica Heloise Costa, docente e conservadora do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), que estuda o período há muitos anos. A parte da desconstrução revela os bastidores da ideia de progresso, expondo as pessoas que, embora construíssem a cidade, estavam alheias aos benefícios dessa modernização. Já a reconstrução são as tentativas de experimentação, explorando novas formas e possibilidades visuais. Esforço curatorial de grande porte “É realmente uma exposição de caráter museológico e que envolveu uma pesquisa de 15 meses nossa e de muitos anos da Helouise”, relata Marcela Marer, curadora e pesquisadora, atualmente realizando um doutorado na Universidade de Zurique, na Suíça. “Não é simples você adentrar na obra de cada fotógrafo e depois procurar onde estão essas obras que a gente selecionou previamente, encontrar onde elas estão, quais são as coleções que elas fazem parte e, efetivamente, trazê-las para cá”, acrescenta. Costa e Marer recorreram frequentemente às famílias dos fotógrafos, encontrando negativos que foram escaneados e impressos novamente, além de muitas fotos de época que estavam em posse dessas famílias e de diversas instituições. Pioneirismo do Foto Cine Clube Bandeirante Os conceitos da exposição desvendam as especificidades da experiência modernista do Foto Cine Clube Bandeirante (FCCB), seus paradoxos e seu papel crucial na rede internacional de fotoclubes, ao mesmo tempo em que promovem uma reflexão crítica sobre o imaginário do Brasil moderno e as contradições de seu projeto de sociedade. A exposição utiliza a produção do FCCB como um prisma para explorar a fotografia modernista brasileira. Fundado em 1939 por um grupo de fotógrafos amadores no centro de São Paulo, o clube adotou inicialmente o pictorialismo. No entanto, acompanhando o crescimento e a verticalização da cidade, sua fotografia evoluiu, tornando-se cada vez mais moderna e inspirada nas vanguardas internacionais. A partir de 1945, nomes como Geraldo de Barros, German Lorca e Thomaz Farkas romperam com o pictorialismo, iniciando uma experimentação de caráter moderno que, a partir dos anos 50, seria reconhecida como a Escola Paulista de Fotografia. Essa escola, embora bem estabelecida na América Latina, é ainda pouco conhecida internacionalmente, e a exposição busca trazer esse esclarecimento inédito, redefinindo os contornos da história da fotografia moderna. Destaques e desafios da mulher na fotografia A exposição apresenta obras de trinta e três fotógrafos, incluindo importantes nomes do FCCB como Geraldo de Barros, German Lorca, Thomaz Farkas, José Oiticica Filho e Marcel Giró. Além disso, explora diálogos visuais com artistas precursores da arte neoconcreta brasileira, como Lygia Clark, Lygia Pape e Hélio Oiticica. A participação feminina, embora não seja majoritária,...

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Sopranista brasileiro vai cantar em concerto do 14 de julho, um dos mais importantes da França

7/12/2025
O sopranista Bruno de Sá é dono de uma voz extraordinária e uma das figuras de maior destaque da cena lírica europeia contemporânea. Ele foi convidado para cantar no Concerto de Paris, um dos principais eventos de música clássica do mundo, que acontece desde 2012 no dia da festa nacional da França, o 14 de julho, aos pés da Torre Eiffel. Apesar de já ter cantado nos palcos mais célebres do mundo, o cantor brasileiro radicado em Berlim, na Alemanha, não esconde a emoção de participar do Concerto de Paris, que antecede a tradicional queima de fogos do dia 14 de julho, interpretando Bachianas Brasileiras n.5, de Villa Lobos. "É uma mistura de nervosismo, de ansiedade e, ao mesmo tempo, um senso de responsabilidade gigante", diz o sopranista que interpreta principalmente um repertório em italiano. "Cantar em português é muito raro para mim. Eu não canto tanto quanto eu gostaria. Vir com essa peça que é tão emblemática, nesse lugar icônico e em português, eu acho que vou ter que me segurar para não chorar", afirma. O contraste com seus primeiros passos na França é grande, relembra, contando os "perrengues" que passou na capital francesa, há dez anos. "A primeira vez que estive em Paris foi em 2015, enquanto estudante. Vim para cá falando um francês truncado, contando moeda para comprar um sanduíche, para conseguir fazer audição, e aí cheguei e a pianista não tinha ido tocar na audição. Foi um caos", relembra rindo."E aí, de repente, você se vê sendo um dos artistas convidados, junto com outros tantos artistas mundialmente reconhecidos", compara. O Concerto de Paris, um dos mais importantes eventos de música clássica do mundo, reúne dezenas de milhares de pessoas no Campo de Marte, aos pés da Torre Eiffel, e é transmitido ao vivo pela tevê e pela rádio em mais de 20 países. A 13ª edição conta com a participação das sopranos russa Aida Garifulina e francesa Julie Fuchs, da violinista sul-coreana Bomsori Kim, do pianista, também da Coreia do Sul, Saehyun Kim, entre outros artistas, acompanhados pela Orquestra Nacional da França e do Coro da Rádio França. "Eu realmente espero que, ao subir naquele palco, eu não esteja só, mas que seja toda uma nação", diz. "Porque acho que é um pouco esse o sentimento, de representar minha nação, de ser brasileiro, cantar em português e representar o Brasil. Porque ser brasileiro é motivo de orgulho", afirma. Voz fora do comum Bruno tem uma voz fora do comum. Ele é sopranista, um homem que canta soprano, voz tradicionalmente feminina. "Eu não sou contratenor, nem um barítono, ou seja, a minha voz, por obra divina, problemas hormonais ou caráter genético, não sei definir qual é a porcentagem de tudo isso, de alguma maneira, manteve o registro infantil, com um corpo de um homem adulto", explica. Grande parte do repertório do cantor se concentra no barroco, mas ele já interpretou obras de outros períodos. "Atualmente ainda existe quase que um condicionamento das pessoas acharem que se você é um sopranista, ou um contratenor, então você tem que cantar somente música barroca. E isso é um pouco da bandeira que eu venho tentando levantar", diz defendendo a ideia de que o artista não deve se fechar em ideias limitantes. "Eu acredito que a gente não deve limitar a produção artística de nenhum artista. No final das contas, eu sou um soprano. Qual seria o repertório de um soprano? Então é nesse lugar, dentro da minha trajetória e também de jornada, que fui abrindo caminho", diz Bruno, o primeiro homem soprano a cantar Wagner e também Bachianas Brasileiras. Mas ele admite que, no mundo conservador da ópera, ter uma voz fora da norma não é fácil. "Foi difícil e continua sendo difícil", diz. "Meu sonho, honestamente, é chegar um dia onde a gente seja selecionado para um casting, não porque sou a excentricidade, não porque eu sou um homem que tem uma voz aguda. Eu acho que o meu grande sonho seria ser selecionado para uma produção, seja barroca, contemporânea, independente de qual seja o personagem, pelo...

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Emílio Kalil: “Prazo apertado foi maior desafio para produzir Temporada França Brasil 2025"

7/11/2025
Sob o sol festivo do sul da França, o Brasil é destaque na programação dos Encontros de Arles, um dos maiores eventos internacionais em torno da fotografia. O país está presente em quatro grandes exposições oficiais, além de muitas manifestações no circuito OFF. O contexto é o da Temporada França Brasil 2025. Emilio Kalil, comissário geral da programação brasileira, conversou com a RFI em Arles. Patrícia Moribe, enviada especial a Arles No total são cerca de 300 exposições e eventos em toda a França. A programação foi concebida por Kalil em torno de três eixos fundamentais: o meio ambiente, a diversidade e a democracia. Ele explica que os temas foram definidos em 2023 pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Emmanuel Macron, servindo como guias para a construção da temporada. Além desses, um quarto eixo crucial para a curadoria brasileira é a relação entre a França, o Brasil e a África, uma conexão que Kalil considera "muito forte" e essencial na programação. “É uma honra muito grande, mas uma complicação também maior ainda, porque você precisa representar um país enorme, complexo, como o nosso, como o Brasil, e fazer dele uma mostra que o francês, já que é na França, tenha uma ideia diferente, nova e desconhecida desse país que a gente sabe que é continental, que é enorme, que tem uma diversidade, que começa em Belém, terminando no Chuí”, explica Kalil. Além da magnitude da missão, a equipe de Emilio Kalil enfrentou um cronograma "extremamente apertado", tendo "quase um ano" ou "menos de um ano" para montar toda a programação, o que Kalil descreveu como "quase um milagre". Os principais desafios incluíram a necessidade de pesquisar e selecionar o conteúdo em um período muito curto, acoplado à dificuldade de encontrar instituições na França dispostas a receber as exposições e eventos em cima da hora, já que a maioria já tinha suas agendas fechadas. A questão orçamentária foi outro "imenso" desafio, com o financiamento sendo definido de "última hora" e sofrendo cortes tanto no Brasil, quanto na França. Contatos na França Para contornar esses obstáculos, Kalil mobilizou sua extensa rede de contatos e anos de trabalho com a França, especialmente nas artes cênicas, o que ajudou a "abrir portas" e gerar uma "cumplicidade enorme" entre franceses e brasileiros. Essa rede de contatos foi fundamental para conseguir que instituições de primeira linha na França acolhessem a programação, incluindo o Museu Picasso, o Museu do Quai Branly, o Museu d'Orsay, o Centro Pompidou, o Carreau du Temple em Nîmes e outros enderenços de prestígio. A temporada também se estende a outras cidades como Nantes, Lille e Lyon. A curadoria de Kalil priorizou o conteúdo cultural e educacional, promovendo debates sobre democracia e desinformação, debatendo a questão indígena, e abordando a identidade negra. Em Arles, por exemplo, estão presentes a histórica fotografia modernista forjada a partir de São Paulo, passando por retratistas populares de uma comunidade perto de Belo Horizonte, artistas emergentes e um mergulho místico no candomblé por meio de um jovem fotógrafo neto de mãe de santo. Projetos cruzados Além disso, a temporada se destaca pelos mais de 40 "projetos cruzados", desenvolvidos em colaboração entre o comissário brasileiro - Emilio Kalil - e a francesa - Anne Louyot. Esses projetos são iniciados no Brasil e depois seguem para a França, ou vice-versa, representando um esforço conjunto e um trabalho "a quatro mãos", explica Kalil. O comissário é também o diretor da Fundação Iberê em Porto Alegre, para onde retornará de forma mais assídua após a temporada. Ele planeja levar para a instituição dois importantes segmentos desta temporada: uma mostra do artista franco-palestino Tarik Kiswanson, vencedor de um prêmio no Centre Pompidou, que será inaugurada em 29 de agosto em Porto Alegre, e a exposição sobre Antônio José da Silva, um "grande pintor clássico primitivo brasileiro", que atualmente está em Grenoble e seguirá diretamente para...

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'Azira’i' emociona Avignon com ancestralidade, canto e resistência indígena do Brasil

7/10/2025
Na mostra paralela do Festival de Avignon de 2025, um espetáculo brasileiro vem arrebatando os franceses com sua força e poética ancestrais: Azira’i – Um Musical de Memórias, estrelado por Zahy Tentehar, do povo Tentehara Guajajara, e dirigido por Duda Rios. Em cena, a memória de Azira’i, mãe da atriz, ganha vida através da dramaturgia, do canto indígena e de uma linguagem cênica que ultrapassa fronteiras. Márcia Bechara, enviada especial a Avignon Zahy Tentehar se tornou a primeira atriz indígena a receber o Prêmio Shell, uma das maiores condecorações do teatro brasileiro. A obra, que agora ecoa no sul da França, nasceu de uma escuta profunda e de uma amizade transformadora. “Essa ideia nasceu quando nos conhecemos em uma peça. Conversando com Zahy, ela compartilhou a história da mãe dela. Aquilo me tocou profundamente”, contou o diretor Duda Rios. “Cinco anos depois, conseguimos o financiamento e criamos o espetáculo.” Leia tambémTeatro brasileiro é homenageado no Festival de Avignon, o maior evento de artes cênicas do mundo No palco, Zahy está sozinha, "mas nunca solitária". Segundo ela, a presença da mãe, dos antepassados e de muitos povos reverbera em cada gesto, cada canto. “O palco está repleto de todo um povo, de muitas línguas. Eu não sinto em nenhum momento que estou sozinha”, afirma com convicção. Um dos aspectos mais potentes da montagem é o uso da língua Ze’eng eté, falada por seu povo. Em um país que, como ressalta o diretor Duda Rios, "foi historicamente colonizador, como a França", "o gesto de ensinar e compartilhar uma língua indígena carrega forte carga simbólica e política". “Trazer uma língua tão desconhecida internacionalmente, ensinar sua fonética e gramática à plateia, é uma inversão de papeis feita com suavidade”, observa Rios. “Convido as pessoas a experimentarem a estrutura do Ze’eng eté com afeto, não com imposição", completa a atriz Zahy Tentehar. Canto ancestral O canto herdado da mãe de Zahy é o eixo central da construção emocional e dramatúrgica do espetáculo. “Antes mesmo de ensaiar ou entrar no palco, eu tenho o hábito de cantar. Cantar me ajuda a ter ideias, a me concentrar. Para mim, é um lugar sagrado.” A recepção do público francês tem sido calorosa, embora reveladora de particularidades. “Eles se emocionam muito. Embora riam menos do que o público brasileiro, sentimos uma conexão genuína”, afirma Duda. “O espetáculo foi escrito para o Brasil, mas chega com a mesma potência aqui.” "Em cena, Zahy representa também um movimento de quebra de padrões estéticos e educacionais. Sem ter passado por uma escola tradicional de formação de atores, ela ocupa com autoridade e brilho o palco internacional", diz o diretor. “É muito satisfatório poder dizer que nós também somos criadores. Por muito tempo, nos impediram de estar aqui.” Leia também'Falar com os mortos é uma das bases do teatro', diz Milo Rau ao estrear peça-manifesto em Avignon Com legendas em francês e inglês, a peça preserva os trechos em Ze’eng eté sem tradução — uma escolha consciente que convida o público a sentir a língua pelo corpo, não apenas compreendê-la pela lógica. Azira’i – Um Musical de Memórias é mais que um espetáculo: é um reencontro com saberes ancestrais, uma afirmação estética e uma delicada insurgência que reverbera além das bordas do palco. A peça fica em cartaz até o dia 13 de julho no teatro Manufacture, na mostra paralela do Festival de Avignon de 2025.

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Cia brasileira traz materialidade radical do teatro em diálogo com a pornografia para Avignon

7/9/2025
A RFI conversou com a encenadora brasileira Janaina Leite, que traz para esta 79ª edição do Festival de Avignon História do Olho. Livremente inspirado no texto original do francês Georges Bataille, a obra é um dos espetáculos mais provocadores e iconoclastas da temporada brasileira homenageada na mostra paralela de 2025. Numa cena ocupada por 16 performers, o espetáculo constrói um diálogo ousado entre teatro e pornografia, desejo e morte, humor e transcendência. Márcia Bechara, enviada especial a Avignon Com uma trajetória marcada por investigações sobre o corpo, a performatividade e os limites entre realidade e ficção, Janaína Leite leva ao palco uma encenação que desafia convenções estéticas e morais. “A pornografia cruza uma dimensão estética e ética que me apaixona”, afirma a diretora. “Ela não é apenas repetição de corpos — é também criação de corpos. É um território de invenção, de disputa de narrativas e de imaginário.” Na versão original brasileira, o espetáculo incluía um entreato musical em que o público circulava, bebia e assistia a outras cenas. No entanto, essa parte foi retirada para a apresentação em Avignon. Ainda assim, a dimensão musical permanece como um elemento essencial da obra. “Ela traz uma dimensão paródica, que é muito cara ao Bataille — uma alegria quase ingênua, mesmo no contato com a dor e com a morte. As músicas brincam com o interdito de forma quase infantil. Tenho dois filhos que adoram falar ‘cocô’, ‘xixi’... e isso também está na peça, como uma forma de trazer à boca o que é proibido.” Leia também'Falar com os mortos é uma das bases do teatro', diz Milo Rau ao estrear peça-manifesto em Avignon "Horrível e sublime" A encenação inclui práticas extremas como fisting e suspensão corporal, e navega entre o sublime e o grotesco. “Bataille trabalha essas tensões extremas entre o corpo que apodrece, que goza, e o desconhecido, o cósmico, o belo. Ele é capaz de falar do horror e do sublime ao mesmo tempo. E você não sabe mais se está sentindo repulsa ou fascínio”, diz a diretora. “Isso tem muito a ver com o desejo, onde atração e repulsa são ambíguas.” Para Janaína, o teatro é um território híbrido, que carrega em sua origem práticas rituais. “Como trazer para o teatro de hoje uma materialidade radical? Como se, no passado, sacrificássemos um animal ou um corpo humano para oferecer ao sol — como numa arena. Essa imagem me fascina. E ela se conecta com o trabalho dos performers, que fazem uma cena de suspensão corporal e lidam, todos os dias, com uma pele que será perfurada, costurada depois.” A trilha sonora foi criada por André Medeiros Martins, Ultra Martini, Vini Vinithekid e Renato Navarro, que, segundo a diretora, foram fundamentais para a construção do espetáculo. “Eles criaram esse show dentro da peça. Tivemos que reduzir a duração de 2h50 para 2 horas por conta da coabitação de cena, mas o show cumpre essa passagem entre o cósmico e o vulgar, entre o intelectual e o bobo, talvez até o inocente.” Leia tambémTeatro brasileiro é homenageado no Festival de Avignon, o maior evento de artes cênicas do mundo Recepção do público europeu A recepção do público europeu tem sido diversa — e, para a diretora, isso é parte do processo. “Viemos de uma cena em São Paulo muito habituada à minha pesquisa. Aqui, talvez o olhar seja mais curioso, mais reticente. Mas não temos nenhuma intenção de chocar. É um convite afetuoso para pensar o corpo — e esses corpos.” A companhia já havia se apresentado na Alemanha, em Heidelberg, onde, segundo Janaína, viveu uma das experiências mais marcantes com a peça. “Foram 400 pessoas com a gente por três horas. Foi uma das apresentações mais maravilhosas que já fizemos", relembra. Em Avignon, a primeira apresentação foi “maravilhosa”, a segunda “mais difícil”. Mas a diretora vê nisso uma oportunidade: “Talvez a gente não tenha há algum tempo essa chance de sair de um certo consenso e ouvir, sentir reações inesperadas. Isso é precioso.” Com uma equipe de 23...

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Anti-heroína de Dostoiévski, 'Nastácia' ocupa Avignon: um clássico russo atravessado pelo Brasil

7/8/2025
Durante mais de um século, ela foi reduzida a coadjuvante nas leituras tradicionais de O Idiota, clássico de Fiódor Dostoiévski. Mulher marcada pela tragédia, vilanizada ou santificada à força, Nastácia permaneceu silenciada — até agora. No palco da mostra paralela do Festival de Avignon de 2025, ela retorna com voz própria, arrebatadora, no espetáculo brasileiro Nastácia, a partir de uma ideia original da atriz Flávia Pyramo, através da encenação meticulosa — e premiada — de Miwa Yanagizawa. Márcia Bechara, enviada especial a Avignon Poucos personagens femininos da literatura russa são tão intensos, incômodos e desconcertantes quanto Nastácia Filíppovna Baráchkova, a mulher em torno da qual gira a tragédia de O Idiota, romance publicado por Fiódor Dostoiévski em 1869. Lida por muito tempo como uma figura secundária — quase um “obstáculo” no percurso do príncipe Míchkin, protagonista da obra — ela emerge, em releituras contemporâneas, como o verdadeiro coração pulsante do livro: uma mulher que diz não. Não ao perdão. Não ao amor. Não à paz. Sobretudo, não aos papéis impostos a ela pela sociedade e pelos homens. Sua rebelião poderia se irmanar à de figuras arquetípicas como Antígona, Medéia ou Lilith — mulheres que só puderam ser caladas pela morte. Nastácia não está louca: está em fúria. E Dostoiévski, ainda que sem compreendê-la inteiramente, a conserva intacta em sua raiva. Esse é, talvez, o maior paradoxo de seu gênio. Nastácia Filíppovna (interpretada visceralmente por Flávia Pyramo, idealizadora do projeto) não é uma heroína. É uma ferida aberta. Bela demais, intensa demais, lúcida demais, ela carrega o estigma de uma juventude arruinada: seduzida e abusada por Tótski (vivido no palco pelo ator Chico Pelúcio, veterano e um dos fundadores do Grupo Galpão), um aristocrata que a “acolhe” para, na verdade, possuí-la, ela entra na vida adulta com a reputação destruída e um destino traçado. Espera-se que ela se arrependa, que peça perdão, que aceite seu lugar. Ela recusa. Completa o trio da montagem brasileira a submissão oportunista de Gánia, pretendente de Nastácia, que aceita se casar com ela por conveniência e influência de Tótski, vivido com precisão e humor pelo ator Lenine Martins. Não muito longe do teatro onde a companhia brasileira encena o espetáculo, um caso que chocou a França foi julgado: a história terrível dos abusos perpetrados contra Gisèle Pélicot, francesa drogada pelo marido durante décadas e estuprada repetidamente por estranhos. Em uma homenagem extraordinária neste ano, o Festival de Avignon — dirigido por Tiago Rodrigues — fará uma reencenação do processo de Pélicot com um grupo de atores, intitulada Le Procès Pélicot (O Processo Pélicot), no dia 18 de julho. "Nastácia passa por todos os abusos imagináveis e inimagináveis que nós, mulheres, conhecemos — do século 19 até hoje. Inclusive, a gente cita o nome de Gisèle na peça, quando fala de tantas outras mulheres [abusadas], desde Desdêmona até a adolescente da vida real que inspirou Dostoiévski a compor a personagem Nastácia", conta Flávia Pyramo. "É impressionante ver [no texto do autor russo] essa figura, esse ser, naquela época... Porque hoje ainda, fazendo a peça, ela aparece tão avante [de seu tempo], nessa luta e, principalmente, nessa consciência da dignidade", pontua a atriz. Com texto de Pedro Brício e direção artística de Miwa Yanagizawa, o espetáculo transcende a literatura clássica para dialogar diretamente com os conflitos atuais: o feminicídio, a banalização da violência, o apagamento histórico das mulheres. Leia tambémThomas Ostermeier discute 'verdade' como ruptura em tragédia de Ibsen no Festival de Avignon Misoginia estrutural A peça não traz apenas uma releitura inovadora, mas também uma denúncia. A obra de Dostoiévski — assim como boa parte do cânone russo do século 19 — é atravessada por uma misoginia estrutural. As personagens femininas são constantemente condenadas a papéis de martírio, servidão ou loucura. Sonia, em...

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Exposição digital contempla registros da luta democrática brasileira na França entre 2016 e 2023

7/3/2025
A partir desta quinta-feira (3) vai ao ar a mostra online “Memória dos Movimentos de Resistência na França 2016–2023”, uma exposição que reúne um acervo inédito de registros das manifestações protagonizadas pela diáspora brasileira pela defesa da democracia no exterior. Segundo a jornalista e escritora Márcia Camargos, idealizadora da Associação Memória da Resistência Brasileira na França, a mostra digital apresenta imagens captadas em Paris durante momentos-chave da história política brasileira. Lançada no ano Brasil-França, porém sem a chancela oficial da temporada, a exposição virtual tem a intenção de valorizar as memórias democráticas e laços entre movimentos militantes dos dois países, disponibilizada em formato bilíngue português-francês. “Para nós é extremamente gratificante porque temos consciência de que, embora o nosso projeto não tenha recebido o selo oficial do ano Brasil-França, se não fossemos nós na luta durante os sétimo últimos anos, não haveria o ano França-Brasil, porque a democracia teria sido derrotada. Então, de alguma forma, graças a nós esse ano da Temporada Brasil-França foi possível”, diz Márcia Camargos nos estúdios da RFI. De um projeto coletivo a uma exposição digital A jornalista natural de Belo Horizonte, que vive na França há quase dez anos, analisa que o compartilhamento de experiências da Resistência das duas nações possui muitos pontos positivos. “Nós aprendemos muito com os nossos companheiros franceses e eu creio que o contrário também é verdadeiro. Eles foram essenciais na nossa luta e eles já tinham um know how, porque muitos de nós não tínhamos um histórico de militância, muitos não tinham essa vivência. Então, essa relação com os sindicatos, os partidos de esquerda, foi de extrema importância para nos mostrar o caminho das pedras e nos dar algumas dicas essenciais”, descreve ela, que se considera uma militante progressista desde a adolescência. “Para dar vida a esse projeto, nós estivemos nas ruas desde 2016, aos primeiros rumores de golpe contra a Dilma. Foi quando surgiu MD 18 (Movimento Democrático 18 de março), que tomou as ruas de Paris e a partir daí nós não paramos mais”. Ela explica que acompanhou, no exterior, o surgimento de “vários grupos apartidários de forma espontânea e funcionamento horizontal, que realmente reivindicavam e denunciavam os ataques ao estado de direito no Brasil”. Ela cita o Coletivo Paulo Freire, Mulheres da Resistência (Femmes de la Résistance), o núcleo do PT de Paris, os amigos do MST, a Rede Europeia para a Democracia no Brasil (RED-Br), associação Autres Brésils, entre outros movimentos, sindicatos e partidos políticos que apoiaram e contribuíram com fotos e informações. Segundo Márcia, graças ao agrupamento de materiais doados por cada voluntário em Paris foi possível realizar a pesquisa que originou a criação da mostra online. “A partir daí, veio a questão de organizar e datar essas fotos, pois não adianta você jogar um monte de material sem dizer, sem descrever o seu porquê, quando aconteceu... Foi um trabalho de formiguinha e detetive ao mesmo tempo”, descreve a jornalista Márcia Camargos. Política do Brasil através dos movimentos democráticos em Paris Márcia Camargos cita momentos da exposição que a marcaram, como os protestos performáticos ‘Genocídio’, na frente da Torre Eiffel, em 2020, contra a má gestão da pandemia da Covid-19 no Brasil, além de um manifesto realizado na fachada da Embaixada do Brasil, em Paris, com o objetivo de chamar a atenção da comunidade internacional para o veto do ex-presidente brasileiro Bolsonaro, em outubro de 2021, sobre a criação de um programa de fornecimento de absorventes para mulheres em situação precária. “Memória dos Movimentos de Resistência na França” foi dividida em seis partes em ordem cronológica: primeiro a questão do golpe com o movimento "Não vai ter golpe"; depois o "Fora Temer"; seguido do"'Ele não"; a quarta parte trata do Lawfare, quando o presidente Lula foi preso; depois o...

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Combate às drogas tem de focar nas pessoas e nas condições de vulnerabilidade, diz especialista

6/26/2025
A ONU estabeleceu que 26 de junho é o Dia Internacional contra o Abuso e o Tráfico Ilícito de Drogas. A data foi criada em 1987 para conscientizar a população mundial sobre os problemas desencadeados pela venda e consumo de entorpecentes. Maria Lúcia Oliveira de Souza Formigoni, especialista reconhecida sobre o uso e dependência de drogas no Brasil, afirma que “a principal droga que nos causa problema é o álcool”. Ela preconiza que o combate às drogas tem de focar “na pessoa e nas condições de vulnerabilidade psicossociais”. O fenômeno do consumo e venda de drogas cresce anualmente com o surgimento de novas substâncias, rotas de tráfico e infiltração do crime organizado na política de vários países. Maria Lúcia Oliveira de Souza Formigoni, coordenadora da Unidade de Dependência de Drogas do Departamento de Psicobiologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), destacou a importância do Dia Internacional contra o Abuso e o Tráfico de Drogas a como um "momento de reflexão". Formigoni, que também é presidente do Instituto de Estudos Avançados e Convergentes (IEAC) da Unifesp, explicou que o foco das políticas de combate às drogas deve estar na pessoa e nas condições psicossociais e biológicas que levam ao uso de drogas. Ela mencionou, por exemplo, que "a falta de lazer, principalmente em comunidades mais vulneráveis, acaba sendo associada ao uso de drogas, principalmente o álcool, que é o maior problema, não só no Brasil, mas no mundo”. Como o consumo do produto é legalizado, ele não é considerado uma droga por muitas pessoas, mas o álcool “é uma das drogas psicotrópicas que mais causa dependência”, reitera. Falta de dados epidemiológicos recentes Formigoni lamentou a falta de dados atualizados sobre o consumo de drogas no Brasil. Segundo ela, o último levantamento nacional é de 2017. A pesquisadora criticou a paralisação de “políticas progressivas” iniciadas nos governos petistas durante o governo Bolsonaro e elogiou os esforços do governo atual para retomar essas ações, apesar das limitações de recursos. A especialista destacou que os dados disponíveis indicam que o álcool é a principal droga, seguido pela maconha, cocaína, crack e anfetaminas. Ela também expressou preocupação com o uso de esteroides anabolizantes e a mistura de álcool com bebidas energéticas, especialmente entre jovens. Quanto às políticas atuais de combate às drogas, Formigoni considera que "são adequadas”, apesar de algumas limitações práticas. Ela elogiou a criação de Centros de Atenção Psicossocial (Caps AD) dentro do SUS, que propõem tratamento especializado aos dependentes. Existem, ainda, várias ferramentas digitais, como o www.bebermenos.org.br dentro do qual a pessoa pode se cadastrar para fazer uma intervenção virtual para reduzir problemas associados ao uso de álcool. Legalização da maconha Maria Lucia Formigoni reconhece a complexidade das questões relacionadas ao tráfico e à segurança. Em relação ao debate sobre a legalização e descriminalização de algumas drogas, sugeriu que "a legalização da maconha pode reduzir alguns problemas", como registrado em países que autorizam o uso medicinal do canabidiol, mas que a discussão ainda é complexa. Na opinião da especialista, uma resposta mais eficaz para o problema das drogas passa pela questão da saúde mental. "O foco mais importante tem de ser na pessoa e nas condições de vulnerabilidade psicossociais que elas têm". Paralelamente, tem a criminalidade, que envolve questões como o tráfico de drogas e de influência. A professora titular da Unifesp diz que as duas questões se interligam, mas conclui que “a repressão de uma maneira violenta não é o que vai resolver o problema das pessoas que usam álcool e drogas”.

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“O tempo é nosso maior inimigo na luta contra a crise climática”, alerta diretora da COP30

6/25/2025
Em um contexto geopolítico difícil, em que as negociações climáticas registram avanços e retrocessos, e que a discussão sobre combustíveis fósseis ainda polariza, a diretora da COP30, Ana Toni, afirma que a transição energética é inevitável, mas que a transição justa é escolha. “E tem que ser feita nessa década crítica", disse ela à RFI em Bonn, na Alemanha, onde participa da 62ª reunião dos Órgãos Subsidiários da ONU (SB62). Vivian Oswald, correspondente da RFI, em Bonn (Alemanha) "Não tenho menor dúvida que a transição vai acontecer. Sempre digo que estamos num avião que tem 99% de chance de cair. E estamos colocando os nossos filhos e os nossos netos nele”, ilustra a diretora da COP30. “A gente não é suicida. Sabe que vai ter essa transição”, resume. “O tema da transição é inevitável. Mas a transição justa é escolha. E é disso que a gente está falando aqui”, destaca, lembrando que, quanto mais rápido essa transição acontecer, menos pessoas, principalmente os mais vulneráveis, vão sofrer. “São países inteiros que podem desaparecer em 10, 15, 20 anos. Essa escolha a gente tem que fazer nessa década crítica, e ainda não está fazendo”, insiste. O grande problema, segundo Ana Toni, é que o modelo de desenvolvimento global consolidado há mais de 200 anos baseia-se em combustíveis fósseis, numa agricultura expansionista, e numa economia linear. "E tentar mudar isso, é muito difícil”, resume. “O nosso pior inimigo é o tempo. Tentar mudar isso em 10 anos ou 20 anos é muito difícil, porque [para] todos nós, consumidores, é muito difícil mudar os nossos hábitos, não é?”, pondera. Ela considera que as populações estão conscientes de que a mudança do clima existe, é causada pelo ser humano, e que uma transição é necessária. Porém, ainda há dificuldade em entender as complexas negociações climáticas. Furar a bolha do jargão climático Egressa da sociedade civil, a especialista reconhece que é preciso mudar a comunicação, furar a bolha dos jargões, sempre técnicos demais, para que as pessoas se sintam representadas nas discussões globais sobre clima e se envolvam sem precisar ser ativistas climáticos. Além disso, ela também alerta para o risco das fake news climáticas e o que chama de negacionismo das soluções. "O espírito do mutirão, que no Brasil a gente entende muito bem, que a gente tem tentado comunicar para fora, é muito isso. É uma COP das pessoas, para as pessoas, onde o tema de transição justa está no centro", afirma, enquanto come um sanduíche num rápido intervalo da agenda frenética de encontros com representantes de mais de 190 países e da sociedade civil que manteve nos últimos dias. Brasil prepara fundo bilionário para florestas Entre as conquistas que gostaria de ver nesta COP30 no Brasil, Ana Toni destaca avanços sobre medidas de adaptação climática, emperradas desde a última COP29 em Baku, no Azerbaijão, mas que começam a andar em Bonn — a última grande reunião antes da COP30 amazônica de novembro —, o financiamento granular, "com soluções específicas para projetos específicos”, e novos instrumentos econômicos para manutenção da natureza, entre eles o TFFF (Tropical Forest Forever Facility, na sigla em inglês), um fundo bilionário para a conservação das florestas de pé, que será lançado em novembro em Belém. Este último é a grande aposta do governo como resultado concreto desta COP30. A ideia é que comece com uma capitalização de US$ 25 bilhões de fundos soberanos e alavanque outros US$ 100 bilhões. A diretora da COP30 reconhece a frustração de muitos com os debates que se repetem ou se prologam todo ano nas COPs. "Logicamente, as pessoas estão vendo o tema da mudança do clima, que a gente fala de COP em COP, mas está ficando cada dia mais quente, tem mais inundação. Então, assim, para que está servindo, né? E a gente não consegue traduzir para o dia a dia das pessoas. Mas deveria ser fácil. Pensa em 10 anos. A gente nem falava, por exemplo, de veículo elétrico, de solar e eólica, de combate a desmatamento,...

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“Eu não esperava tantos músicos tocando choro aqui em Paris”, diz Hercules Gomes em turnê na França

6/23/2025
Ele começou a tocar piano aos 13 anos como autodidata. Depois, ingressou no estudo de música no conservatório e participou dos maiores festivais do Brasil e do exterior, conquistando vários prêmios. Lançou quatro discos, ganhou o reconhecimento do público e da crítica. Fez concertos individuais e como solista ao lado de grandes orquestras internacionais. O capixaba Hercules Gomes esteve de passagem em Paris, onde fez a sua primeira apresentação na França e conversou com a RFI Maria Paula Carvalho, de Paris O show no Clube do Choro de Paris, na Maison du Brésil, na cidade universitária, na segunda-feira (16), fez parte da Temporada França-Brasil 2025. No reportório, músicas de seu último álbum, Sarau Tupynambá (2022), além de choros, gênero musical ao qual o compositor vem dedicando parte de sua carreira. “Eu nunca tinha vindo à França, é muito especial tocar no Clube do Choro, um gênero de música brasileira que eu adoro e ao qual me dedico muito. Então, estou muito feliz”, disse. Hercules Gomes é considerado um dos mais representativos pianistas brasileiros da atualidade não somente por suas habilidades técnicas, mas também pela escolha do seu repertório, em que demonstra fortes influências de ritmos brasileiros, de jazz e da música erudita. “A gente acaba se tornando músico em função de todas as coisas que a gente vive”, explica. “Eu comecei tocando de ouvido por influência do meu pai, tocava teclado em bandas e desde essa época eu já gostava de ouvir música brasileira", lembra. "Com 15 anos, eu entrei no conservatório e comecei a aprender sobre teoria musical, o repertório tradicional e depois, na universidade, aprendi sobre o jazz e a música clássica. Mas eu posso dizer que tanto como compositor e como arranjador, eu tenho cada vez mais me dedicado à música brasileira”, continua. “No meu disco Pianíssimo, eu gravei seis composições minhas e seis músicas de compositores brasileiros famosos, como choros de Ernesto Nazaré e Radamés Gnattali, gravei um baião do Edu Lobo, um samba do Hermeto Pascoal. Eu gosto muito de pegar essas músicas que são maravilhosas e criar em cima delas”, explica. Homenagem à Chiquinha Gonzaga Em 2018, Hercules Gomes lançou “No tempo da Chiquinha”, um disco em comemoração aos 170 anos da pianista e compositora Chiquinha Gonzaga, considerada uma das fundadoras da música popular brasileira. “Vários músicos do Brasil foram convidados para fazer arranjos em homenagem à Chiquinha Gonzaga para comemorar essa data. Eu fiz alguns arranjos e, quando eu vi, já tinha arranjos prontos para gravar um disco”, diz. “Eu tenho dois discos que foram trabalhos de resgate: esse da Chiquinha Gonzaga e um segundo que eu gravei em 2020, 'Tia Amélia para Sempre', em homenagem a uma compositora que é contemporânea da Chiquinha Gonzaga, só que muito menos conhecida hoje em dia”, observa. “A nossa identidade musical começou a ser criada na segunda metade do século XIX com esses compositores, como Joaquim Callado, Anacleto de Medeiros, Henrique Alves de Mesquita, Ernesto Nazaré, que carregam uma essência do Brasil muito profunda”, contextualiza. Hercules Gomes também fala sobre a influência da música europeia no desenvolvimento de uma identidade musical brasileira. “A música brasileira começa dessa influência de ritmos que vinham da Europa, como a polca, a valsa, a mazurca, além dos ritmos que vinham da África com os escravos e de coisas que vinham de Portugal, do colonizador”, afirma. “Então, essa miscelânea de ritmos dá origem à música brasileira que a gente conhece hoje”, diz. O músico, que é frequentador de rodas de choro, diz ter ficado impressionado com o interesse por esse gênero na França. “Eu não esperava tantos músicos tocando choro bem aqui em Paris”, diz. “Eu não sabia que o movimento era tão grande assim”, se surpreende. Além de beber na fonte de outros compositores, o trabalho de Hercules Gomes tem inspirado músicos do mundo inteiro a tocarem música brasileira. “Cada vez mais eu sinto esta...

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