RFI CONVIDA-logo

RFI CONVIDA

RFI

Entrevistas diárias com pessoas de todas as áreas. Artistas, cientistas, professores, economistas, analistas ou personalidades políticas que vivem na França ou estão de passagem por aqui, são convidadas para falar sobre seus projetos e realizações. A conversa é filmada e o vídeo pode ser visto no nosso site.

Location:

Paris, France

Networks:

RFI

Description:

Entrevistas diárias com pessoas de todas as áreas. Artistas, cientistas, professores, economistas, analistas ou personalidades políticas que vivem na França ou estão de passagem por aqui, são convidadas para falar sobre seus projetos e realizações. A conversa é filmada e o vídeo pode ser visto no nosso site.

Language:

Portuguese


Episodes
Ask host to enable sharing for playback control

Marcos Yoshi trabalha memória e percalços da imigração dekassegui em novo documentário

7/17/2025
O cineasta e pesquisador Marcos Yoshi, doutor em Cinema pela USP, está desenvolvendo seu próximo longa-metragem documental, intitulado “Toshi Voltou do Japão”. O projeto foi apresentado durante um colóquio em junho em Lyon, no leste da França, que discutiu o cinema feito por nipo-brasileiros, as histórias de imigração e retorno entre o Japão e o Brasil. Patrícia Moribe, em Lyon “Toshi Voltou do Japão” é centrado na complexa trajetória de Toshi, tio paterno do diretor. Toshi imigrou para o Japão em 1990, como dekassegui [brasileiro descendente de japoneses que vai ao Japão para trabalhar, principalmente em fábricas]. Quatro anos depois, ele precisou retornar ao Brasil, relatando ter sido vigiado e perseguido. Segundo Marcos Yoshi, "muito da experiência que ele teve no Japão de isolamento social, de alienação, desencadeou os transtornos mentais que ele acabou tendo". Posteriormente, esses transtornos foram diagnosticados como esquizofrenia. Toshi viveu quase metade de sua vida sob o estigma de sua condição psíquica, com períodos de internação em hospitais psiquiátricos, falecendo em 2022, aos 60 anos. Marcos Yoshi explica que a memória que tem de seu tio é fragmentada: "as poucas memórias que as pessoas têm dele são restritas à família, às irmãs dele e ao meu pai". Essa escassez de lembranças o levou a uma reflexão central para o filme: "isso me levou a pensar que, no fundo, por conta dessa condição dele, ele acabou virando um fantasma. E o filme parte um pouco desse vazio e dessa ideia de que eu vou filmar o fantasma do meu tio". A questão principal do documentário, explica, é "como contar a história de alguém sobre quem se sabe tão pouco?". O projeto não se limita à história individual de Toshi, mas se expande para as experiências de outros homens nipo-brasileiros da mesma geração, que hoje teriam entre 60 e 70 anos. Yoshi aponta que esses homens, pertencentes à primeira geração de dekasseguis, não contavam com redes de apoio ou assistência organizada no Japão, o que os deixou sem auxílio diante das intensas condições de vida e pressão psicológica. "Nesse sentido, o fantasma de Toshi não é apenas individual, mas coletivo – uma representação das dores e apagamentos de uma geração de trabalhadores", afirma o cineasta. Para lidar com a ausência de material e a fragmentação da memória, o filme adota uma abordagem experimental, propondo "atos de fabulação e fantasmagoria". Outros Trabalhos A programação do colóquio em Lyon também incluiu a exibição de “Bem-vindos de Novo” (2021), o primeiro longa-metragem de Marcos Yoshi, um relato íntimo sobre seu núcleo familiar de pais e irmãs. Seus pais também foram para o Japão como dekasseguis em 1999, permanecendo por 13 anos, o que levou à separação da família, com os filhos ficando no Brasil. “Bem-vindos de Novo” aborda o reencontro familiar após o retorno dos pais ao Brasil e a necessidade de "lidar com as feridas, com os sentimentos que ficaram de certa forma abertos”, explica Yoshi. O diretor comenta que o filme "serviu para tentar criar outro tipo de relação entre pais e filhos, criar um espaço onde esses laços pudessem ser reconstruídos e ressignificados, sem que isso necessariamente signifique uma família feliz". A obra buscou ser ainda "um meio para que a gente conseguisse expressar os nossos sentimentos, para que a gente conseguisse conversar sobre assuntos que atravessam toda essa experiência". Cinema da reconstrução Apesar do recente destaque do cinema brasileiro em eventos internacionais, com premiações no Oscar e em Cannes, Marcos Yoshi aponta para desafios significativos na indústria nacional. Ele observa que "os fundos têm sido canalizados para grandes produções". "Está muito difícil financiar projetos que sejam, como no meu caso, projetos menores", afirma. Ele também destaca que linhas de fomento que existiam anteriormente no Fundo Setorial do Audiovisual, voltadas para cineastas em seus primeiros filmes ou para produções autorais/mercado internacional,...

Duration:00:05:25

Ask host to enable sharing for playback control

"Construção, Desconstrução, Reconstrução": fotografia modernista brasileira é protagonista em Arles

7/15/2025
Uma ambiciosa exposição nos Encontros de Arles, na França, um dos principais festivais de fotografia do mundo, traz um olhar inédito sobre a fotografia modernista brasileira, com o título de “Construção, Desconstrução, Reconstrução (1939-1964)" e curadoria de Helouise Costa e Marcela Marer. Patrícia Moribe, enviada especial a Arles A mostra é destaque na mídia francesa e internacional. Muitos visitantes admitem que não conheciam a riqueza desse período, um olhar urbano correndo em paralelo com a metrópole paulista, visionária, de muito concreto. Uma aula de história e análise diante de 200 imagens vindas de quatro países e reunidas para esse inventário exposto na Mécanique Génerale, na Fundação Luma. O título da exposição, "Construção, Desconstrução, Reconstrução", foi inspirado na poesia concreta brasileira, contemporânea à produção dos fotógrafos em destaque. Ele se desdobra em três conceitos curatoriais que organizam a mostra em três salas distintas. “O primeiro circuito é construído em torno de uma certa modernidade, traçando um paralelo com a arquitetura que edifica e uma fotografia que busca vislumbrar um futuro promissor”, explica Heloise Costa, docente e conservadora do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), que estuda o período há muitos anos. A parte da desconstrução revela os bastidores da ideia de progresso, expondo as pessoas que, embora construíssem a cidade, estavam alheias aos benefícios dessa modernização. Já a reconstrução são as tentativas de experimentação, explorando novas formas e possibilidades visuais. Esforço curatorial de grande porte “É realmente uma exposição de caráter museológico e que envolveu uma pesquisa de 15 meses nossa e de muitos anos da Helouise”, relata Marcela Marer, curadora e pesquisadora, atualmente realizando um doutorado na Universidade de Zurique, na Suíça. “Não é simples você adentrar na obra de cada fotógrafo e depois procurar onde estão essas obras que a gente selecionou previamente, encontrar onde elas estão, quais são as coleções que elas fazem parte e, efetivamente, trazê-las para cá”, acrescenta. Costa e Marer recorreram frequentemente às famílias dos fotógrafos, encontrando negativos que foram escaneados e impressos novamente, além de muitas fotos de época que estavam em posse dessas famílias e de diversas instituições. Pioneirismo do Foto Cine Clube Bandeirante Os conceitos da exposição desvendam as especificidades da experiência modernista do Foto Cine Clube Bandeirante (FCCB), seus paradoxos e seu papel crucial na rede internacional de fotoclubes, ao mesmo tempo em que promovem uma reflexão crítica sobre o imaginário do Brasil moderno e as contradições de seu projeto de sociedade. A exposição utiliza a produção do FCCB como um prisma para explorar a fotografia modernista brasileira. Fundado em 1939 por um grupo de fotógrafos amadores no centro de São Paulo, o clube adotou inicialmente o pictorialismo. No entanto, acompanhando o crescimento e a verticalização da cidade, sua fotografia evoluiu, tornando-se cada vez mais moderna e inspirada nas vanguardas internacionais. A partir de 1945, nomes como Geraldo de Barros, German Lorca e Thomaz Farkas romperam com o pictorialismo, iniciando uma experimentação de caráter moderno que, a partir dos anos 50, seria reconhecida como a Escola Paulista de Fotografia. Essa escola, embora bem estabelecida na América Latina, é ainda pouco conhecida internacionalmente, e a exposição busca trazer esse esclarecimento inédito, redefinindo os contornos da história da fotografia moderna. Destaques e desafios da mulher na fotografia A exposição apresenta obras de trinta e três fotógrafos, incluindo importantes nomes do FCCB como Geraldo de Barros, German Lorca, Thomaz Farkas, José Oiticica Filho e Marcel Giró. Além disso, explora diálogos visuais com artistas precursores da arte neoconcreta brasileira, como Lygia Clark, Lygia Pape e Hélio Oiticica. A participação feminina, embora não seja majoritária,...

Duration:00:05:05

Ask host to enable sharing for playback control

Sopranista brasileiro vai cantar em concerto do 14 de julho, um dos mais importantes da França

7/12/2025
O sopranista Bruno de Sá é dono de uma voz extraordinária e uma das figuras de maior destaque da cena lírica europeia contemporânea. Ele foi convidado para cantar no Concerto de Paris, um dos principais eventos de música clássica do mundo, que acontece desde 2012 no dia da festa nacional da França, o 14 de julho, aos pés da Torre Eiffel. Apesar de já ter cantado nos palcos mais célebres do mundo, o cantor brasileiro radicado em Berlim, na Alemanha, não esconde a emoção de participar do Concerto de Paris, que antecede a tradicional queima de fogos do dia 14 de julho, interpretando Bachianas Brasileiras n.5, de Villa Lobos. "É uma mistura de nervosismo, de ansiedade e, ao mesmo tempo, um senso de responsabilidade gigante", diz o sopranista que interpreta principalmente um repertório em italiano. "Cantar em português é muito raro para mim. Eu não canto tanto quanto eu gostaria. Vir com essa peça que é tão emblemática, nesse lugar icônico e em português, eu acho que vou ter que me segurar para não chorar", afirma. O contraste com seus primeiros passos na França é grande, relembra, contando os "perrengues" que passou na capital francesa, há dez anos. "A primeira vez que estive em Paris foi em 2015, enquanto estudante. Vim para cá falando um francês truncado, contando moeda para comprar um sanduíche, para conseguir fazer audição, e aí cheguei e a pianista não tinha ido tocar na audição. Foi um caos", relembra rindo."E aí, de repente, você se vê sendo um dos artistas convidados, junto com outros tantos artistas mundialmente reconhecidos", compara. O Concerto de Paris, um dos mais importantes eventos de música clássica do mundo, reúne dezenas de milhares de pessoas no Campo de Marte, aos pés da Torre Eiffel, e é transmitido ao vivo pela tevê e pela rádio em mais de 20 países. A 13ª edição conta com a participação das sopranos russa Aida Garifulina e francesa Julie Fuchs, da violinista sul-coreana Bomsori Kim, do pianista, também da Coreia do Sul, Saehyun Kim, entre outros artistas, acompanhados pela Orquestra Nacional da França e do Coro da Rádio França. "Eu realmente espero que, ao subir naquele palco, eu não esteja só, mas que seja toda uma nação", diz. "Porque acho que é um pouco esse o sentimento, de representar minha nação, de ser brasileiro, cantar em português e representar o Brasil. Porque ser brasileiro é motivo de orgulho", afirma. Voz fora do comum Bruno tem uma voz fora do comum. Ele é sopranista, um homem que canta soprano, voz tradicionalmente feminina. "Eu não sou contratenor, nem um barítono, ou seja, a minha voz, por obra divina, problemas hormonais ou caráter genético, não sei definir qual é a porcentagem de tudo isso, de alguma maneira, manteve o registro infantil, com um corpo de um homem adulto", explica. Grande parte do repertório do cantor se concentra no barroco, mas ele já interpretou obras de outros períodos. "Atualmente ainda existe quase que um condicionamento das pessoas acharem que se você é um sopranista, ou um contratenor, então você tem que cantar somente música barroca. E isso é um pouco da bandeira que eu venho tentando levantar", diz defendendo a ideia de que o artista não deve se fechar em ideias limitantes. "Eu acredito que a gente não deve limitar a produção artística de nenhum artista. No final das contas, eu sou um soprano. Qual seria o repertório de um soprano? Então é nesse lugar, dentro da minha trajetória e também de jornada, que fui abrindo caminho", diz Bruno, o primeiro homem soprano a cantar Wagner e também Bachianas Brasileiras. Mas ele admite que, no mundo conservador da ópera, ter uma voz fora da norma não é fácil. "Foi difícil e continua sendo difícil", diz. "Meu sonho, honestamente, é chegar um dia onde a gente seja selecionado para um casting, não porque sou a excentricidade, não porque eu sou um homem que tem uma voz aguda. Eu acho que o meu grande sonho seria ser selecionado para uma produção, seja barroca, contemporânea, independente de qual seja o personagem, pelo...

Duration:00:07:40

Ask host to enable sharing for playback control

Emílio Kalil: “Prazo apertado foi maior desafio para produzir Temporada França Brasil 2025"

7/11/2025
Sob o sol festivo do sul da França, o Brasil é destaque na programação dos Encontros de Arles, um dos maiores eventos internacionais em torno da fotografia. O país está presente em quatro grandes exposições oficiais, além de muitas manifestações no circuito OFF. O contexto é o da Temporada França Brasil 2025. Emilio Kalil, comissário geral da programação brasileira, conversou com a RFI em Arles. Patrícia Moribe, enviada especial a Arles No total são cerca de 300 exposições e eventos em toda a França. A programação foi concebida por Kalil em torno de três eixos fundamentais: o meio ambiente, a diversidade e a democracia. Ele explica que os temas foram definidos em 2023 pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Emmanuel Macron, servindo como guias para a construção da temporada. Além desses, um quarto eixo crucial para a curadoria brasileira é a relação entre a França, o Brasil e a África, uma conexão que Kalil considera "muito forte" e essencial na programação. “É uma honra muito grande, mas uma complicação também maior ainda, porque você precisa representar um país enorme, complexo, como o nosso, como o Brasil, e fazer dele uma mostra que o francês, já que é na França, tenha uma ideia diferente, nova e desconhecida desse país que a gente sabe que é continental, que é enorme, que tem uma diversidade, que começa em Belém, terminando no Chuí”, explica Kalil. Além da magnitude da missão, a equipe de Emilio Kalil enfrentou um cronograma "extremamente apertado", tendo "quase um ano" ou "menos de um ano" para montar toda a programação, o que Kalil descreveu como "quase um milagre". Os principais desafios incluíram a necessidade de pesquisar e selecionar o conteúdo em um período muito curto, acoplado à dificuldade de encontrar instituições na França dispostas a receber as exposições e eventos em cima da hora, já que a maioria já tinha suas agendas fechadas. A questão orçamentária foi outro "imenso" desafio, com o financiamento sendo definido de "última hora" e sofrendo cortes tanto no Brasil, quanto na França. Contatos na França Para contornar esses obstáculos, Kalil mobilizou sua extensa rede de contatos e anos de trabalho com a França, especialmente nas artes cênicas, o que ajudou a "abrir portas" e gerar uma "cumplicidade enorme" entre franceses e brasileiros. Essa rede de contatos foi fundamental para conseguir que instituições de primeira linha na França acolhessem a programação, incluindo o Museu Picasso, o Museu do Quai Branly, o Museu d'Orsay, o Centro Pompidou, o Carreau du Temple em Nîmes e outros enderenços de prestígio. A temporada também se estende a outras cidades como Nantes, Lille e Lyon. A curadoria de Kalil priorizou o conteúdo cultural e educacional, promovendo debates sobre democracia e desinformação, debatendo a questão indígena, e abordando a identidade negra. Em Arles, por exemplo, estão presentes a histórica fotografia modernista forjada a partir de São Paulo, passando por retratistas populares de uma comunidade perto de Belo Horizonte, artistas emergentes e um mergulho místico no candomblé por meio de um jovem fotógrafo neto de mãe de santo. Projetos cruzados Além disso, a temporada se destaca pelos mais de 40 "projetos cruzados", desenvolvidos em colaboração entre o comissário brasileiro - Emilio Kalil - e a francesa - Anne Louyot. Esses projetos são iniciados no Brasil e depois seguem para a França, ou vice-versa, representando um esforço conjunto e um trabalho "a quatro mãos", explica Kalil. O comissário é também o diretor da Fundação Iberê em Porto Alegre, para onde retornará de forma mais assídua após a temporada. Ele planeja levar para a instituição dois importantes segmentos desta temporada: uma mostra do artista franco-palestino Tarik Kiswanson, vencedor de um prêmio no Centre Pompidou, que será inaugurada em 29 de agosto em Porto Alegre, e a exposição sobre Antônio José da Silva, um "grande pintor clássico primitivo brasileiro", que atualmente está em Grenoble e seguirá diretamente para...

Duration:00:06:05

Ask host to enable sharing for playback control

'Azira’i' emociona Avignon com ancestralidade, canto e resistência indígena do Brasil

7/10/2025
Na mostra paralela do Festival de Avignon de 2025, um espetáculo brasileiro vem arrebatando os franceses com sua força e poética ancestrais: Azira’i – Um Musical de Memórias, estrelado por Zahy Tentehar, do povo Tentehara Guajajara, e dirigido por Duda Rios. Em cena, a memória de Azira’i, mãe da atriz, ganha vida através da dramaturgia, do canto indígena e de uma linguagem cênica que ultrapassa fronteiras. Márcia Bechara, enviada especial a Avignon Zahy Tentehar se tornou a primeira atriz indígena a receber o Prêmio Shell, uma das maiores condecorações do teatro brasileiro. A obra, que agora ecoa no sul da França, nasceu de uma escuta profunda e de uma amizade transformadora. “Essa ideia nasceu quando nos conhecemos em uma peça. Conversando com Zahy, ela compartilhou a história da mãe dela. Aquilo me tocou profundamente”, contou o diretor Duda Rios. “Cinco anos depois, conseguimos o financiamento e criamos o espetáculo.” Leia tambémTeatro brasileiro é homenageado no Festival de Avignon, o maior evento de artes cênicas do mundo No palco, Zahy está sozinha, "mas nunca solitária". Segundo ela, a presença da mãe, dos antepassados e de muitos povos reverbera em cada gesto, cada canto. “O palco está repleto de todo um povo, de muitas línguas. Eu não sinto em nenhum momento que estou sozinha”, afirma com convicção. Um dos aspectos mais potentes da montagem é o uso da língua Ze’eng eté, falada por seu povo. Em um país que, como ressalta o diretor Duda Rios, "foi historicamente colonizador, como a França", "o gesto de ensinar e compartilhar uma língua indígena carrega forte carga simbólica e política". “Trazer uma língua tão desconhecida internacionalmente, ensinar sua fonética e gramática à plateia, é uma inversão de papeis feita com suavidade”, observa Rios. “Convido as pessoas a experimentarem a estrutura do Ze’eng eté com afeto, não com imposição", completa a atriz Zahy Tentehar. Canto ancestral O canto herdado da mãe de Zahy é o eixo central da construção emocional e dramatúrgica do espetáculo. “Antes mesmo de ensaiar ou entrar no palco, eu tenho o hábito de cantar. Cantar me ajuda a ter ideias, a me concentrar. Para mim, é um lugar sagrado.” A recepção do público francês tem sido calorosa, embora reveladora de particularidades. “Eles se emocionam muito. Embora riam menos do que o público brasileiro, sentimos uma conexão genuína”, afirma Duda. “O espetáculo foi escrito para o Brasil, mas chega com a mesma potência aqui.” "Em cena, Zahy representa também um movimento de quebra de padrões estéticos e educacionais. Sem ter passado por uma escola tradicional de formação de atores, ela ocupa com autoridade e brilho o palco internacional", diz o diretor. “É muito satisfatório poder dizer que nós também somos criadores. Por muito tempo, nos impediram de estar aqui.” Leia também'Falar com os mortos é uma das bases do teatro', diz Milo Rau ao estrear peça-manifesto em Avignon Com legendas em francês e inglês, a peça preserva os trechos em Ze’eng eté sem tradução — uma escolha consciente que convida o público a sentir a língua pelo corpo, não apenas compreendê-la pela lógica. Azira’i – Um Musical de Memórias é mais que um espetáculo: é um reencontro com saberes ancestrais, uma afirmação estética e uma delicada insurgência que reverbera além das bordas do palco. A peça fica em cartaz até o dia 13 de julho no teatro Manufacture, na mostra paralela do Festival de Avignon de 2025.

Duration:00:05:55

Ask host to enable sharing for playback control

Cia brasileira traz materialidade radical do teatro em diálogo com a pornografia para Avignon

7/9/2025
A RFI conversou com a encenadora brasileira Janaina Leite, que traz para esta 79ª edição do Festival de Avignon História do Olho. Livremente inspirado no texto original do francês Georges Bataille, a obra é um dos espetáculos mais provocadores e iconoclastas da temporada brasileira homenageada na mostra paralela de 2025. Numa cena ocupada por 16 performers, o espetáculo constrói um diálogo ousado entre teatro e pornografia, desejo e morte, humor e transcendência. Márcia Bechara, enviada especial a Avignon Com uma trajetória marcada por investigações sobre o corpo, a performatividade e os limites entre realidade e ficção, Janaína Leite leva ao palco uma encenação que desafia convenções estéticas e morais. “A pornografia cruza uma dimensão estética e ética que me apaixona”, afirma a diretora. “Ela não é apenas repetição de corpos — é também criação de corpos. É um território de invenção, de disputa de narrativas e de imaginário.” Na versão original brasileira, o espetáculo incluía um entreato musical em que o público circulava, bebia e assistia a outras cenas. No entanto, essa parte foi retirada para a apresentação em Avignon. Ainda assim, a dimensão musical permanece como um elemento essencial da obra. “Ela traz uma dimensão paródica, que é muito cara ao Bataille — uma alegria quase ingênua, mesmo no contato com a dor e com a morte. As músicas brincam com o interdito de forma quase infantil. Tenho dois filhos que adoram falar ‘cocô’, ‘xixi’... e isso também está na peça, como uma forma de trazer à boca o que é proibido.” Leia também'Falar com os mortos é uma das bases do teatro', diz Milo Rau ao estrear peça-manifesto em Avignon "Horrível e sublime" A encenação inclui práticas extremas como fisting e suspensão corporal, e navega entre o sublime e o grotesco. “Bataille trabalha essas tensões extremas entre o corpo que apodrece, que goza, e o desconhecido, o cósmico, o belo. Ele é capaz de falar do horror e do sublime ao mesmo tempo. E você não sabe mais se está sentindo repulsa ou fascínio”, diz a diretora. “Isso tem muito a ver com o desejo, onde atração e repulsa são ambíguas.” Para Janaína, o teatro é um território híbrido, que carrega em sua origem práticas rituais. “Como trazer para o teatro de hoje uma materialidade radical? Como se, no passado, sacrificássemos um animal ou um corpo humano para oferecer ao sol — como numa arena. Essa imagem me fascina. E ela se conecta com o trabalho dos performers, que fazem uma cena de suspensão corporal e lidam, todos os dias, com uma pele que será perfurada, costurada depois.” A trilha sonora foi criada por André Medeiros Martins, Ultra Martini, Vini Vinithekid e Renato Navarro, que, segundo a diretora, foram fundamentais para a construção do espetáculo. “Eles criaram esse show dentro da peça. Tivemos que reduzir a duração de 2h50 para 2 horas por conta da coabitação de cena, mas o show cumpre essa passagem entre o cósmico e o vulgar, entre o intelectual e o bobo, talvez até o inocente.” Leia tambémTeatro brasileiro é homenageado no Festival de Avignon, o maior evento de artes cênicas do mundo Recepção do público europeu A recepção do público europeu tem sido diversa — e, para a diretora, isso é parte do processo. “Viemos de uma cena em São Paulo muito habituada à minha pesquisa. Aqui, talvez o olhar seja mais curioso, mais reticente. Mas não temos nenhuma intenção de chocar. É um convite afetuoso para pensar o corpo — e esses corpos.” A companhia já havia se apresentado na Alemanha, em Heidelberg, onde, segundo Janaína, viveu uma das experiências mais marcantes com a peça. “Foram 400 pessoas com a gente por três horas. Foi uma das apresentações mais maravilhosas que já fizemos", relembra. Em Avignon, a primeira apresentação foi “maravilhosa”, a segunda “mais difícil”. Mas a diretora vê nisso uma oportunidade: “Talvez a gente não tenha há algum tempo essa chance de sair de um certo consenso e ouvir, sentir reações inesperadas. Isso é precioso.” Com uma equipe de 23...

Duration:00:05:57

Ask host to enable sharing for playback control

Anti-heroína de Dostoiévski, 'Nastácia' ocupa Avignon: um clássico russo atravessado pelo Brasil

7/8/2025
Durante mais de um século, ela foi reduzida a coadjuvante nas leituras tradicionais de O Idiota, clássico de Fiódor Dostoiévski. Mulher marcada pela tragédia, vilanizada ou santificada à força, Nastácia permaneceu silenciada — até agora. No palco da mostra paralela do Festival de Avignon de 2025, ela retorna com voz própria, arrebatadora, no espetáculo brasileiro Nastácia, a partir de uma ideia original da atriz Flávia Pyramo, através da encenação meticulosa — e premiada — de Miwa Yanagizawa. Márcia Bechara, enviada especial a Avignon Poucos personagens femininos da literatura russa são tão intensos, incômodos e desconcertantes quanto Nastácia Filíppovna Baráchkova, a mulher em torno da qual gira a tragédia de O Idiota, romance publicado por Fiódor Dostoiévski em 1869. Lida por muito tempo como uma figura secundária — quase um “obstáculo” no percurso do príncipe Míchkin, protagonista da obra — ela emerge, em releituras contemporâneas, como o verdadeiro coração pulsante do livro: uma mulher que diz não. Não ao perdão. Não ao amor. Não à paz. Sobretudo, não aos papéis impostos a ela pela sociedade e pelos homens. Sua rebelião poderia se irmanar à de figuras arquetípicas como Antígona, Medéia ou Lilith — mulheres que só puderam ser caladas pela morte. Nastácia não está louca: está em fúria. E Dostoiévski, ainda que sem compreendê-la inteiramente, a conserva intacta em sua raiva. Esse é, talvez, o maior paradoxo de seu gênio. Nastácia Filíppovna (interpretada visceralmente por Flávia Pyramo, idealizadora do projeto) não é uma heroína. É uma ferida aberta. Bela demais, intensa demais, lúcida demais, ela carrega o estigma de uma juventude arruinada: seduzida e abusada por Tótski (vivido no palco pelo ator Chico Pelúcio, veterano e um dos fundadores do Grupo Galpão), um aristocrata que a “acolhe” para, na verdade, possuí-la, ela entra na vida adulta com a reputação destruída e um destino traçado. Espera-se que ela se arrependa, que peça perdão, que aceite seu lugar. Ela recusa. Completa o trio da montagem brasileira a submissão oportunista de Gánia, pretendente de Nastácia, que aceita se casar com ela por conveniência e influência de Tótski, vivido com precisão e humor pelo ator Lenine Martins. Não muito longe do teatro onde a companhia brasileira encena o espetáculo, um caso que chocou a França foi julgado: a história terrível dos abusos perpetrados contra Gisèle Pélicot, francesa drogada pelo marido durante décadas e estuprada repetidamente por estranhos. Em uma homenagem extraordinária neste ano, o Festival de Avignon — dirigido por Tiago Rodrigues — fará uma reencenação do processo de Pélicot com um grupo de atores, intitulada Le Procès Pélicot (O Processo Pélicot), no dia 18 de julho. "Nastácia passa por todos os abusos imagináveis e inimagináveis que nós, mulheres, conhecemos — do século 19 até hoje. Inclusive, a gente cita o nome de Gisèle na peça, quando fala de tantas outras mulheres [abusadas], desde Desdêmona até a adolescente da vida real que inspirou Dostoiévski a compor a personagem Nastácia", conta Flávia Pyramo. "É impressionante ver [no texto do autor russo] essa figura, esse ser, naquela época... Porque hoje ainda, fazendo a peça, ela aparece tão avante [de seu tempo], nessa luta e, principalmente, nessa consciência da dignidade", pontua a atriz. Com texto de Pedro Brício e direção artística de Miwa Yanagizawa, o espetáculo transcende a literatura clássica para dialogar diretamente com os conflitos atuais: o feminicídio, a banalização da violência, o apagamento histórico das mulheres. Leia tambémThomas Ostermeier discute 'verdade' como ruptura em tragédia de Ibsen no Festival de Avignon Misoginia estrutural A peça não traz apenas uma releitura inovadora, mas também uma denúncia. A obra de Dostoiévski — assim como boa parte do cânone russo do século 19 — é atravessada por uma misoginia estrutural. As personagens femininas são constantemente condenadas a papéis de martírio, servidão ou loucura. Sonia, em...

Duration:00:05:50

Ask host to enable sharing for playback control

Exposição digital contempla registros da luta democrática brasileira na França entre 2016 e 2023

7/3/2025
A partir desta quinta-feira (3) vai ao ar a mostra online “Memória dos Movimentos de Resistência na França 2016–2023”, uma exposição que reúne um acervo inédito de registros das manifestações protagonizadas pela diáspora brasileira pela defesa da democracia no exterior. Segundo a jornalista e escritora Márcia Camargos, idealizadora da Associação Memória da Resistência Brasileira na França, a mostra digital apresenta imagens captadas em Paris durante momentos-chave da história política brasileira. Lançada no ano Brasil-França, porém sem a chancela oficial da temporada, a exposição virtual tem a intenção de valorizar as memórias democráticas e laços entre movimentos militantes dos dois países, disponibilizada em formato bilíngue português-francês. “Para nós é extremamente gratificante porque temos consciência de que, embora o nosso projeto não tenha recebido o selo oficial do ano Brasil-França, se não fossemos nós na luta durante os sétimo últimos anos, não haveria o ano França-Brasil, porque a democracia teria sido derrotada. Então, de alguma forma, graças a nós esse ano da Temporada Brasil-França foi possível”, diz Márcia Camargos nos estúdios da RFI. De um projeto coletivo a uma exposição digital A jornalista natural de Belo Horizonte, que vive na França há quase dez anos, analisa que o compartilhamento de experiências da Resistência das duas nações possui muitos pontos positivos. “Nós aprendemos muito com os nossos companheiros franceses e eu creio que o contrário também é verdadeiro. Eles foram essenciais na nossa luta e eles já tinham um know how, porque muitos de nós não tínhamos um histórico de militância, muitos não tinham essa vivência. Então, essa relação com os sindicatos, os partidos de esquerda, foi de extrema importância para nos mostrar o caminho das pedras e nos dar algumas dicas essenciais”, descreve ela, que se considera uma militante progressista desde a adolescência. “Para dar vida a esse projeto, nós estivemos nas ruas desde 2016, aos primeiros rumores de golpe contra a Dilma. Foi quando surgiu MD 18 (Movimento Democrático 18 de março), que tomou as ruas de Paris e a partir daí nós não paramos mais”. Ela explica que acompanhou, no exterior, o surgimento de “vários grupos apartidários de forma espontânea e funcionamento horizontal, que realmente reivindicavam e denunciavam os ataques ao estado de direito no Brasil”. Ela cita o Coletivo Paulo Freire, Mulheres da Resistência (Femmes de la Résistance), o núcleo do PT de Paris, os amigos do MST, a Rede Europeia para a Democracia no Brasil (RED-Br), associação Autres Brésils, entre outros movimentos, sindicatos e partidos políticos que apoiaram e contribuíram com fotos e informações. Segundo Márcia, graças ao agrupamento de materiais doados por cada voluntário em Paris foi possível realizar a pesquisa que originou a criação da mostra online. “A partir daí, veio a questão de organizar e datar essas fotos, pois não adianta você jogar um monte de material sem dizer, sem descrever o seu porquê, quando aconteceu... Foi um trabalho de formiguinha e detetive ao mesmo tempo”, descreve a jornalista Márcia Camargos. Política do Brasil através dos movimentos democráticos em Paris Márcia Camargos cita momentos da exposição que a marcaram, como os protestos performáticos ‘Genocídio’, na frente da Torre Eiffel, em 2020, contra a má gestão da pandemia da Covid-19 no Brasil, além de um manifesto realizado na fachada da Embaixada do Brasil, em Paris, com o objetivo de chamar a atenção da comunidade internacional para o veto do ex-presidente brasileiro Bolsonaro, em outubro de 2021, sobre a criação de um programa de fornecimento de absorventes para mulheres em situação precária. “Memória dos Movimentos de Resistência na França” foi dividida em seis partes em ordem cronológica: primeiro a questão do golpe com o movimento "Não vai ter golpe"; depois o "Fora Temer"; seguido do"'Ele não"; a quarta parte trata do Lawfare, quando o presidente Lula foi preso; depois o...

Duration:00:06:04

Ask host to enable sharing for playback control

Combate às drogas tem de focar nas pessoas e nas condições de vulnerabilidade, diz especialista

6/26/2025
A ONU estabeleceu que 26 de junho é o Dia Internacional contra o Abuso e o Tráfico Ilícito de Drogas. A data foi criada em 1987 para conscientizar a população mundial sobre os problemas desencadeados pela venda e consumo de entorpecentes. Maria Lúcia Oliveira de Souza Formigoni, especialista reconhecida sobre o uso e dependência de drogas no Brasil, afirma que “a principal droga que nos causa problema é o álcool”. Ela preconiza que o combate às drogas tem de focar “na pessoa e nas condições de vulnerabilidade psicossociais”. O fenômeno do consumo e venda de drogas cresce anualmente com o surgimento de novas substâncias, rotas de tráfico e infiltração do crime organizado na política de vários países. Maria Lúcia Oliveira de Souza Formigoni, coordenadora da Unidade de Dependência de Drogas do Departamento de Psicobiologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), destacou a importância do Dia Internacional contra o Abuso e o Tráfico de Drogas a como um "momento de reflexão". Formigoni, que também é presidente do Instituto de Estudos Avançados e Convergentes (IEAC) da Unifesp, explicou que o foco das políticas de combate às drogas deve estar na pessoa e nas condições psicossociais e biológicas que levam ao uso de drogas. Ela mencionou, por exemplo, que "a falta de lazer, principalmente em comunidades mais vulneráveis, acaba sendo associada ao uso de drogas, principalmente o álcool, que é o maior problema, não só no Brasil, mas no mundo”. Como o consumo do produto é legalizado, ele não é considerado uma droga por muitas pessoas, mas o álcool “é uma das drogas psicotrópicas que mais causa dependência”, reitera. Falta de dados epidemiológicos recentes Formigoni lamentou a falta de dados atualizados sobre o consumo de drogas no Brasil. Segundo ela, o último levantamento nacional é de 2017. A pesquisadora criticou a paralisação de “políticas progressivas” iniciadas nos governos petistas durante o governo Bolsonaro e elogiou os esforços do governo atual para retomar essas ações, apesar das limitações de recursos. A especialista destacou que os dados disponíveis indicam que o álcool é a principal droga, seguido pela maconha, cocaína, crack e anfetaminas. Ela também expressou preocupação com o uso de esteroides anabolizantes e a mistura de álcool com bebidas energéticas, especialmente entre jovens. Quanto às políticas atuais de combate às drogas, Formigoni considera que "são adequadas”, apesar de algumas limitações práticas. Ela elogiou a criação de Centros de Atenção Psicossocial (Caps AD) dentro do SUS, que propõem tratamento especializado aos dependentes. Existem, ainda, várias ferramentas digitais, como o www.bebermenos.org.br dentro do qual a pessoa pode se cadastrar para fazer uma intervenção virtual para reduzir problemas associados ao uso de álcool. Legalização da maconha Maria Lucia Formigoni reconhece a complexidade das questões relacionadas ao tráfico e à segurança. Em relação ao debate sobre a legalização e descriminalização de algumas drogas, sugeriu que "a legalização da maconha pode reduzir alguns problemas", como registrado em países que autorizam o uso medicinal do canabidiol, mas que a discussão ainda é complexa. Na opinião da especialista, uma resposta mais eficaz para o problema das drogas passa pela questão da saúde mental. "O foco mais importante tem de ser na pessoa e nas condições de vulnerabilidade psicossociais que elas têm". Paralelamente, tem a criminalidade, que envolve questões como o tráfico de drogas e de influência. A professora titular da Unifesp diz que as duas questões se interligam, mas conclui que “a repressão de uma maneira violenta não é o que vai resolver o problema das pessoas que usam álcool e drogas”.

Duration:00:15:00

Ask host to enable sharing for playback control

“O tempo é nosso maior inimigo na luta contra a crise climática”, alerta diretora da COP30

6/25/2025
Em um contexto geopolítico difícil, em que as negociações climáticas registram avanços e retrocessos, e que a discussão sobre combustíveis fósseis ainda polariza, a diretora da COP30, Ana Toni, afirma que a transição energética é inevitável, mas que a transição justa é escolha. “E tem que ser feita nessa década crítica", disse ela à RFI em Bonn, na Alemanha, onde participa da 62ª reunião dos Órgãos Subsidiários da ONU (SB62). Vivian Oswald, correspondente da RFI, em Bonn (Alemanha) "Não tenho menor dúvida que a transição vai acontecer. Sempre digo que estamos num avião que tem 99% de chance de cair. E estamos colocando os nossos filhos e os nossos netos nele”, ilustra a diretora da COP30. “A gente não é suicida. Sabe que vai ter essa transição”, resume. “O tema da transição é inevitável. Mas a transição justa é escolha. E é disso que a gente está falando aqui”, destaca, lembrando que, quanto mais rápido essa transição acontecer, menos pessoas, principalmente os mais vulneráveis, vão sofrer. “São países inteiros que podem desaparecer em 10, 15, 20 anos. Essa escolha a gente tem que fazer nessa década crítica, e ainda não está fazendo”, insiste. O grande problema, segundo Ana Toni, é que o modelo de desenvolvimento global consolidado há mais de 200 anos baseia-se em combustíveis fósseis, numa agricultura expansionista, e numa economia linear. "E tentar mudar isso, é muito difícil”, resume. “O nosso pior inimigo é o tempo. Tentar mudar isso em 10 anos ou 20 anos é muito difícil, porque [para] todos nós, consumidores, é muito difícil mudar os nossos hábitos, não é?”, pondera. Ela considera que as populações estão conscientes de que a mudança do clima existe, é causada pelo ser humano, e que uma transição é necessária. Porém, ainda há dificuldade em entender as complexas negociações climáticas. Furar a bolha do jargão climático Egressa da sociedade civil, a especialista reconhece que é preciso mudar a comunicação, furar a bolha dos jargões, sempre técnicos demais, para que as pessoas se sintam representadas nas discussões globais sobre clima e se envolvam sem precisar ser ativistas climáticos. Além disso, ela também alerta para o risco das fake news climáticas e o que chama de negacionismo das soluções. "O espírito do mutirão, que no Brasil a gente entende muito bem, que a gente tem tentado comunicar para fora, é muito isso. É uma COP das pessoas, para as pessoas, onde o tema de transição justa está no centro", afirma, enquanto come um sanduíche num rápido intervalo da agenda frenética de encontros com representantes de mais de 190 países e da sociedade civil que manteve nos últimos dias. Brasil prepara fundo bilionário para florestas Entre as conquistas que gostaria de ver nesta COP30 no Brasil, Ana Toni destaca avanços sobre medidas de adaptação climática, emperradas desde a última COP29 em Baku, no Azerbaijão, mas que começam a andar em Bonn — a última grande reunião antes da COP30 amazônica de novembro —, o financiamento granular, "com soluções específicas para projetos específicos”, e novos instrumentos econômicos para manutenção da natureza, entre eles o TFFF (Tropical Forest Forever Facility, na sigla em inglês), um fundo bilionário para a conservação das florestas de pé, que será lançado em novembro em Belém. Este último é a grande aposta do governo como resultado concreto desta COP30. A ideia é que comece com uma capitalização de US$ 25 bilhões de fundos soberanos e alavanque outros US$ 100 bilhões. A diretora da COP30 reconhece a frustração de muitos com os debates que se repetem ou se prologam todo ano nas COPs. "Logicamente, as pessoas estão vendo o tema da mudança do clima, que a gente fala de COP em COP, mas está ficando cada dia mais quente, tem mais inundação. Então, assim, para que está servindo, né? E a gente não consegue traduzir para o dia a dia das pessoas. Mas deveria ser fácil. Pensa em 10 anos. A gente nem falava, por exemplo, de veículo elétrico, de solar e eólica, de combate a desmatamento,...

Duration:00:14:17

Ask host to enable sharing for playback control

“Eu não esperava tantos músicos tocando choro aqui em Paris”, diz Hercules Gomes em turnê na França

6/23/2025
Ele começou a tocar piano aos 13 anos como autodidata. Depois, ingressou no estudo de música no conservatório e participou dos maiores festivais do Brasil e do exterior, conquistando vários prêmios. Lançou quatro discos, ganhou o reconhecimento do público e da crítica. Fez concertos individuais e como solista ao lado de grandes orquestras internacionais. O capixaba Hercules Gomes esteve de passagem em Paris, onde fez a sua primeira apresentação na França e conversou com a RFI Maria Paula Carvalho, de Paris O show no Clube do Choro de Paris, na Maison du Brésil, na cidade universitária, na segunda-feira (16), fez parte da Temporada França-Brasil 2025. No reportório, músicas de seu último álbum, Sarau Tupynambá (2022), além de choros, gênero musical ao qual o compositor vem dedicando parte de sua carreira. “Eu nunca tinha vindo à França, é muito especial tocar no Clube do Choro, um gênero de música brasileira que eu adoro e ao qual me dedico muito. Então, estou muito feliz”, disse. Hercules Gomes é considerado um dos mais representativos pianistas brasileiros da atualidade não somente por suas habilidades técnicas, mas também pela escolha do seu repertório, em que demonstra fortes influências de ritmos brasileiros, de jazz e da música erudita. “A gente acaba se tornando músico em função de todas as coisas que a gente vive”, explica. “Eu comecei tocando de ouvido por influência do meu pai, tocava teclado em bandas e desde essa época eu já gostava de ouvir música brasileira", lembra. "Com 15 anos, eu entrei no conservatório e comecei a aprender sobre teoria musical, o repertório tradicional e depois, na universidade, aprendi sobre o jazz e a música clássica. Mas eu posso dizer que tanto como compositor e como arranjador, eu tenho cada vez mais me dedicado à música brasileira”, continua. “No meu disco Pianíssimo, eu gravei seis composições minhas e seis músicas de compositores brasileiros famosos, como choros de Ernesto Nazaré e Radamés Gnattali, gravei um baião do Edu Lobo, um samba do Hermeto Pascoal. Eu gosto muito de pegar essas músicas que são maravilhosas e criar em cima delas”, explica. Homenagem à Chiquinha Gonzaga Em 2018, Hercules Gomes lançou “No tempo da Chiquinha”, um disco em comemoração aos 170 anos da pianista e compositora Chiquinha Gonzaga, considerada uma das fundadoras da música popular brasileira. “Vários músicos do Brasil foram convidados para fazer arranjos em homenagem à Chiquinha Gonzaga para comemorar essa data. Eu fiz alguns arranjos e, quando eu vi, já tinha arranjos prontos para gravar um disco”, diz. “Eu tenho dois discos que foram trabalhos de resgate: esse da Chiquinha Gonzaga e um segundo que eu gravei em 2020, 'Tia Amélia para Sempre', em homenagem a uma compositora que é contemporânea da Chiquinha Gonzaga, só que muito menos conhecida hoje em dia”, observa. “A nossa identidade musical começou a ser criada na segunda metade do século XIX com esses compositores, como Joaquim Callado, Anacleto de Medeiros, Henrique Alves de Mesquita, Ernesto Nazaré, que carregam uma essência do Brasil muito profunda”, contextualiza. Hercules Gomes também fala sobre a influência da música europeia no desenvolvimento de uma identidade musical brasileira. “A música brasileira começa dessa influência de ritmos que vinham da Europa, como a polca, a valsa, a mazurca, além dos ritmos que vinham da África com os escravos e de coisas que vinham de Portugal, do colonizador”, afirma. “Então, essa miscelânea de ritmos dá origem à música brasileira que a gente conhece hoje”, diz. O músico, que é frequentador de rodas de choro, diz ter ficado impressionado com o interesse por esse gênero na França. “Eu não esperava tantos músicos tocando choro bem aqui em Paris”, diz. “Eu não sabia que o movimento era tão grande assim”, se surpreende. Além de beber na fonte de outros compositores, o trabalho de Hercules Gomes tem inspirado músicos do mundo inteiro a tocarem música brasileira. “Cada vez mais eu sinto esta...

Duration:00:09:13

Ask host to enable sharing for playback control

“Há muito tempo a literatura brasileira não tinha tantos leitores”, festeja Itamar Vieira Junior

6/18/2025
O premiado escritor brasileiro Itamar Vieira Junior está na França para participar de uma série de eventos. O autor do romance “Torto Arado”, um dos maiores fenômenos da literatura brasileira dos últimos tempos, veio à França para participar de uma série de eventos literários. Em entrevista à RFI, ao falar da diversidade atual da literatura brasileira, festejou que há muito tempo “o Brasil não via um público leitor tão interessado na literatura brasileira”. Itamar Vieira Junior foi um dos convidados do importante festival literário francês Étonnants Voyageurs. O evento que acontece em Saint-Malo, porto da região da Bretanha, homenageou este ano o Brasil e a diversidade da produção literária contemporânea brasileira. Em Paris, Itamar Vieira Junior continuou os encontros com o público francês para falar de sua obra “Torto Arado” (Todavia, 2019) foi amplamente aclamado no Brasil e em vários outros países. Vencedor dos prêmios Jabuti e Oceanos, o livro já foi traduzido para 31 línguas e vendeu mais de um milhão de exemplares. O autor baiano assegura que “não imaginava que fosse encontrar tantos leitores, nem mesmo no Brasil, pelo anacronismo da história”. O romance se passa em uma comunidade rural do interior da Bahia e conta a história das irmãs Bibiana e Belonísia, abordando temas como a luta pela terra, ancestralidade e herança dos quase 400 anos de escravidão no Brasil. Nos encontros com público pelo mundo, e agora aqui na França, ele percebe que os leitores se fixam na história pela “vida que as personagens oferecem”. “Essa é uma história que, independentemente de onde estejamos, fala de algo que é vital para o ser humano, que é o direito à terra, o direito ao território. Nos grandes conflitos do mundo hoje, o território está em disputa”, define. Outro tema do livro que atravessa várias culturas, como a brasileira, a francesa ou a americana, é a memória sobre a escravidão e a hstória colonial. "É algo que ainda está presente. A nossa maneira de habitar o mundo é uma maneira inaugurada com o colonialismo, de exploração da natureza e do ser humano ao extremo”, relaciona. Diversidade da literatura contemporânea brasileira Itamar Vieira Junior participou ao lado de outros escritores brasileiros, como Djamila Ribeiro, Bernardo Carvalho ou Jeferson Tenório, do Festival Étonnants Voyageurs, realizado de 7 a 9 de junho. Um “Outro Brasil”, ou a diversidade da literatura brasileira, foi promovido pelo evento literário francês. O autor baiano, que critica com frequência uma certa literatura elitista e defende a literatura popular, festeja a multiplicidade de autores brasileiros contemporâneos sendo publicados, encontrando um público e tendo concretamente mais visibilidade. “Autores que começaram a publicar agora e que trazem essa experiência de um Brasil mais diverso, de um Brasil mais plural”, salienta. Segundo ele, "há muito tempo, desde Jorge Amado, o Brasil não via um público leitor tão interessado na literatura brasileira. E isso é bom porque é uma literatura, que aos poucos, vai ganhando contornos da cara do Brasil”. Novos projetos Na França, o “Torto Arado” foi publicado em 2023 pela editora Zulma, com tradução do talentoso escritor Jean-Marie Blas de Roblès, que já viveu no Brasil e conhece muito bem o país. Em 2024, Itamar Vieira Junior venceu o prêmio francês Montluc de Resistência e Liberdade. Um prêmio que o escritor considera “simbólico” para a sua obra. “Salvar o Fogo”, o segundo romance da trilogia da terra do autor, também vencedor do prêmio Jabuti, já foi traduzido para 12 idiomas, mas por enquanto ainda não foi lançado na França. Itamar Vieira Junior já terminou a escrita e se prepara para o lançamento do terceiro volume. “Coração sem medo” será publicado no final do ano no Brasil e no início de 2026, em Portugal. A história, que fecha a trilogia, se passa em Salvador e “lança luz sobre aqueles que foram absolutamente desterrados, que precisaram migrar para a cidade e refazer suas vidas”,...

Duration:00:06:10

Ask host to enable sharing for playback control

"Não consigo imaginar um fracasso", diz secretário extraordinário para a COP30

6/18/2025
A menos de cinco meses da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, que acontece novembro em Belém, o secretário extraordinário para a COP30, Valter Correia da Silva, corre contra o relatório para que o evento o meio da Amazônia seja inesquecível de maneira positiva. Otimista, ele reconhece os desafios, mas afirma que a capital paraense será outra depois da convenção. Sobre hospedagem, um dos grandes nós no horizonte, diz que a questão será equacionada e que os preços de leitos estarão dentro do razoável. Vivian Oswald, correspondente da RFI em Brasília Em entrevista ao RFI Convida, Valter Correia da Silva afirmou que os donos de imóveis e hotéis estão "caindo na real", que num primeiro momento existiu o que chamou de "alucinação coletiva”. Capitaneado por ele, o governo está mapeando os leitos disponíveis e a ideia é que ninguém deixe de ir por causa dos custos. Isso é o que pretende dizer em Bonn, na Alemanha, onde as 190 delegações que estarão em Belém se reúnem na SB 62, a última grande reunião do clima da ONU antes da COP30. Correia afirma que há várias frentes em que o governo tem trabalhado desde o ano passado. Ele esteve recentemente em Belém, onde passou uma semana, para mapear a cena da hospedagem. Entre as opções, haverá as vilas militares, que, na verdade, são espaços que militares utilizam para pernoites, e que estão sendo reformadas há quase um ano e devem abrir 1.600 leitos. O governo federal acaba de assinar com um ator imobiliária de Belém um termo de compromisso para garantir transparência e ética na oferta de imóveis durante a COP30. "Radiografia" do setor O secretário quer uma "radiografia" do setor para ter um mapa da real demanda que ainda precisa ser atendida. "Temos escolas que estão sendo reformadas, que vão disponibilizar 5.000 leitos. Temos os navios que estão na fase final de contratação. Já contratamos a Embratur, que está em fase final de contratar a operadora, que por sua vez contrata os navios. Acredito que mais uma semana, duas no máximo, já tenhamos os navios praticamente contratados”, afirma Correia da Silva. Esses navios vão ficar um pouco mais afastados. Não ficarão na Estação das Docas, como previsto inicialmente, porque o calado não preparado. A dragagem não deu certo. "E a gente acabou indo para um porto próximo, que é Outeiro. Mas ali precisa de uma reforma, que já começamos. Já está num estágio bastante alucinado de obras ali”, diz. "Praticamente estamos construindo dois píeres novos. Estamos reformando e construindo um novo para poder atracar esses dois navios, com calados mais do que suficientes para esses dois navios, e, eventualmente, até para um terceiro se a gente conseguir contratá-lo”, explica. Os dois navios devem oferecer seis mil leitos no total. Para aproximar quem vai se hospedar neles da área da convenção, está sendo construída uma ponte, que deve ser entregue em agosto, pelo governo do estado e uma pista de BRT. “O BRT está em fase final. Vamos fazer uma linha direta do navio até o local do evento. Vai dar ali em torno de 25, 30 minutos no máximo, com os ônibus que a gente vai colocar à disposição para levar todo esse pessoal que tiver no navio”, conta, lembrando que até motéis estão disponíveis para acomodar as pessoas nesse período. "Achamos que vai ser suficiente”, garante. Ofertas de imóveis e plataforma de reservas A oferta em imóveis privados continua crescendo, segundo ele. Passou de 600 imóveis que normalmente se colocava disponível nas plataformas para mais de 5.000. Correia acredita que os preços exorbitantes vistos até aqui começam a diminuir, embora muitas pessoas continuem se queixando da falta de oferta e dos valores muito acima do que se poderia imaginar. "Já temos uma pesquisa que aponta que já está diminuindo os valores desses imóveis. Significa que as pessoas, num primeiro momento, testaram, para ver se conseguiam um valor maior, e, vendo que não conseguem alugar por esses preços, estão diminuindo. Mesmo assim ainda...

Duration:00:06:19

Ask host to enable sharing for playback control

Cantora Fernanda Abreu diz que funk carioca sofre preconceito racial até hoje

6/12/2025
Artista brasileira com 35 anos de carreira solo vai fazer show na sexta-feira (13) em Paris e garante que vai levar ao palco parisiense a carioquice para o público dançar e se divertir. A cantora disse que o show será uma viagem musical e que tocará os seus maiores sucessos. “Eu não vou à França há muito tempo, então vou aproveitar para tocar músicas de todos os meus discos. Eu vou cantar músicas do Sla Radical Dance Disco Club, Sla 2, Da Lata, Raio X, Entidade Urbana, Da Paz, Amor Geral… Enfim, acho que a galera vai querer ouvir, cantar e dançar comigo. Então, vai ser basicamente um show com muitos sucessos”, revelou Fernanda Abreu. “Esse passeio musical vai traduzir muito o que é a minha trajetória dentro da música dançante brasileira. Vai ter um pouco de samba, de funk, de disco… De tudo um pouco”, completou. Fernanda Abreu lembrou que seus shows fora do Brasil sempre têm muitos brasileiros e que a energia do palco contagia a todos. “O show é energético, com muita dança, suingue, embalo e batida. Então a receptividade é sempre muito boa”, destacou. A cantora carioca, que sempre teve grande identificação com o Rio de Janeiro, revelou que a sua cidade natal é grande inspiração. “O Rio é onde vivo. Eu entendo o mundo através deste olhar carioca. O Rio é uma cidade de uma contradição muito grande, uma desigualdade que está muito na cara das pessoas. Você tem, por exemplo, um bairro como São Conrado, que é riquíssimo no asfalto e, na parte de cima, tem a favela da Rocinha, uma das maiores da América Latina. E esse contraste acontece em todo o Rio de Janeiro. Não é como em algumas outras cidades, que têm periferia e pobreza, mas fora do centro: como se houvesse cinturões. Você tem de caminhar muito para poder enxergar a pobreza e a desigualdade. No Rio de janeiro, por conta do relevo com morros, e com o surgimento de favelas, essa contradição é muito visível”, explicou. “Eu comecei minha carreira solo em 1990 com uma linguagem musical muito diferente do que estava sendo feita na época. Eu abracei uma cultura periférica e favelada. Eu era uma menina branca de classe média e sempre defendi o funk carioca porque, no fundo, eu sempre achei que o preconceito era racial; tinha sempre um racismo estrutural ligado a uma rejeição ao funk carioca, muito mais do que musical. Era uma música feita por pretos, pobres e favelados. Então, estava sendo sempre criminalizada, e até hoje é assim” Fernanda Abreu lembrou que, até o início dos anos 90, os morros cariocas eram redutos de samba e, a partir dali, a juventude começou a abraçar esta música eletrônica feita por DJs, que era o funk carioca. "Eu acredito que a minha contribuição dentro da música pop dançante brasileira é ter trazido essa linguagem do funk e a mistura com o samba e com a música eletrônica. Hoje a gente vê aflorar artistas como Anitta, Ludmila, Isa, Luísa Sonsa e tantas outras grandes artistas brasileiras. E que, de certa maneira, seguiram este caminho da música pop dançante", disse. “Musicalmente, o Rio de Janeiro é uma cidade que inventou o chorinho, o samba, a bossa nova e o funk carioca. Então, não tem como eu, que trabalho com música, não olhar, não ouvir e não enxergar essas expressões musicais e culturais. Foi aí que comecei a fazer a minha própria mistura”, revelou a cantora. Nesta conversa com a RFI, Fernanda Abreu afirmou que a cena musical brasileira tem se transformado através das décadas. Para ela, a música, tanto no formato, quanto na linguagem, tem passado por evoluções influenciadas pela sociedade e pela realidade da época. Fernanda lembrou que no processo brasileiro de democratização, em 1985, a trilha sonora que se fazia era, também, com críticas à ditadura. “Neste começo de liberdade, nos anos 80, vieram à tona bandas como Blitz, Paralamas, Legião, Kid Abelha, Barão Vermelho; era toda uma juventude que falava de liberdade e com uma pegada rock. E nos anos 90, eu, Carlinhos Brown, Lenine, O Rappa, Planet Hemp, Daniela Mercury, só para citar alguns...

Duration:00:11:56

Ask host to enable sharing for playback control

Jeferson Tenório transita entre diásporas negras e escrituras antirracistas no Festival do Livro de Saint-Malo

6/10/2025
Durante sua participação na 34ª edição do Festival Étonnants Voyageurs, em Saint-Malo, o escritor brasileiro Jeferson Tenório destacou a importância de discutir o racismo estrutural e a identidade negra no Brasil contemporâneo. Autor de O Avesso da Pele, obra que tem ganhado repercussão internacional, Tenório falou sobre censura, representatividade e lutas antirracistas, além de refletir sobre as diferenças entre o racismo brasileiro e o europeu. Durante sua participação na 34ª edição do Étonnants Voyageurs, o Festival Internacional do Livro e do Filme de Saint-Malo, no norte da França, o escritor brasileiro Jeferson Tenório refletiu sobre o papel dos encontros interculturais e a força da literatura como ponte entre experiências negras ao redor do mundo. “Cada vez que há encontros entre culturas, entre diferentes literaturas e expressões artísticas, percebo que existem consonâncias. Vejo a possibilidade de diálogo, de construção de pontes. É também uma oportunidade de compreender a complexidade do racismo e de perceber que as experiências negras e diaspóricas, no fundo, são muito parecidas. Acredito que a literatura tem justamente esse papel de revelar essas identidades. Embora existam dissonâncias, obviamente, a experiência da diáspora é muito semelhante em muitos aspectos”, afirmou o autor de O avesso da pele. A mesa-redonda “Vozes de Luta” reuniu o escritor brasileiro Jeferson Tenório, o norte-americano Mateo Askaripour, e Olivier Marboeuf, de Guadalupe, somando algumas das principais vozes decoloniais a antirracistas contemporâneas. Na ocasião, Jeferson Tenório citou o autor martinicano Frantz Fanon, ao abordar o privilégio da escolha e a dimensão coletiva da existência negra, e falou ainda sobre o estágio do Brasil na discussão antirracista. Ele refletiu sobre os avanços e os desafios do país nesse tema. Leia tambémEscritores brasileiros resgatam ancestralidades e lutas em homenagem especial no Festival de Saint-Malo “Tenho viajado bastante por vários países nos últimos anos e percebo que o Brasil tem uma discussão bastante avançada e sofisticada em relação às questões raciais. Houve um aumento significativo no reconhecimento da literatura negra, assim como dos saberes negros dentro das universidades. Me parece que, hoje, há um avanço bastante significativo. Por outro lado, também existe uma reação conservadora e reacionária que ameaça transformar esses avanços em retrocessos. Essas contradições são próprias do Brasil e vêm se acentuando nos últimos anos”, analisou. Censura Tenório falou ainda à RFI sobre a censura sofrida por uma de suas obras mais conhecidas. "O Avesso da Pele, no ano passado, foi recolhido de algumas escolas justamente por tratar de questões como a violência policial, o racismo estrutural e também aquele racismo mais sutil, presente no cotidiano. Isso mostra como ainda vivemos em uma sociedade conservadora — e, em muitos aspectos, autoritária — que não permite que essas discussões cheguem às escolas, por exemplo", disse. O escritor premiado contou ainda que esteve em Portugal para divulgar seu novo livro. "Esse é o meu trabalho mais recente, lançado em 2024, e se chama De Onde Eles Vêm. O livro conta a história de Joaquim, um jovem negro que ingressa na universidade por meio do sistema de cotas — algo que costumo chamar de uma 'revolução silenciosa' nas universidades. Essa entrada massiva de pessoas negras no ensino superior tem transformado a sociedade e a mentalidade coletiva. Ainda há muito racismo, é claro, mas essa mudança tem causado um impacto profundo", argumentou. Questionado sobre a percepção do “diferente”, especialmente quando se fala da pessoa negra na França, Tenório disse que conhece pouco o país. "Tenho mais familiaridade com a cultura portuguesa, porque estudei bastante e frequento o país com certa regularidade. Mas, em relação à França, me parece que segue a mesma linha da maioria dos países europeus, que ainda não discutem profundamente a questão racial. Talvez o debate...

Duration:00:06:27

Ask host to enable sharing for playback control

'A política das emoções é também uma política da memória': Djamila Ribeiro abre Festival do Livro de Saint-Malo

6/9/2025
"O que é a liberdade?" Foi com essa pergunta que a filósofa, escritora, professora e editora brasileira Djamila Ribeiro abriu o painel inaugural da 34ª edição do Étonnants Voyageurs, o Festival Internacional do Livro e do Filme da cidade portuária de Saint-Malo, no norte da França. Ao lado do irlandês Paul Lynch, da norte-americana Lauren Groff e da franco-marroquina Leïla Slimani, ela interrompeu o debate inaugural para celebrar a trajetória de Marielle Franco (1979–2018), efígie do festival. Djamila Ribeiro é autora de obras basilares para as novas gerações no pensamento antirracista e decolonial, como "Pequeno Manual Antirracismo" (um dos mais vendidos no Brasil em 2020-2021), "Lugar de Fala" e "Feminismo Negro". Questionada sobre o que mudou no Brasil em relação ao racismo nos últimos anos, ela apontou avanços inegáveis. "Uma coisa definitiva aqui no Brasil hoje esse é que tema está no debate público. As pessoas estão falando mais sobre isso", afirmou à RFI. A presença constante de Marielle Franco nos materiais gráficos do festival — em cartazes, telões, na programação oficial e até nos crachás — emocionou profundamente Djamila. Na mesa de abertura do festival, diante de mais de mil pessoas, ela falou sobre a importância da imagem da vereadora. Durante a mesa-redonda sobre "liberdade", Djamila lembrou que Marielle “foi interrompida enquanto lutava pela liberdade, pelo direito de ser uma mulher pública e por causas importantes para nós, mulheres negras no Brasil — uma mulher que veio da comunidade e foi silenciada nessa luta”. "Cartas para minha avó" Além dos debates sobre racismo, ancestralidades e lutas convergentes, Djamila apresentou no Salão do Livro de Saint-Malo sua obra "Cartas para minha avó". O livro marca uma mudança do registro mais filosófico e ensaístico para um tom mais íntimo e pessoal. Escrever sobre si mesma foi, nas palavras da autora, “um processo de me permitir fazer isso”. Djamila confessou que, no início, sentiu receio, pois sabia que mulheres escritoras muitas vezes enfrentam desrespeito e que falar do íntimo pode ser visto como uma forma de seguir padrões para conquistar respeito. Ainda assim, o livro “se impôs” a ela. "O editor havia solicitado outro trabalho, mas não me senti à vontade, e as primeiras páginas de 'Cartas para minha avó' simplesmente surgiram", contou: "a política das emoções é também uma política da memória". A escrita foi difícil, marcada por momentos de choro, mas também por uma "sensação de libertação", segundo a autora. O livro acabou se tornando a história de muitas mulheres, com leitoras e até crianças de escolas que o adotaram escrevendo para Djamila sobre o impacto das cartas, relata a escritora. Racismos Convidada frequente em eventos internacionais, Djamila Ribeiro também falou da experiência de circular fora do Brasil. “O racismo é estrutural em todos os lugares, mas na França, por exemplo, vejo uma dificuldade maior em falar sobre isso, uma recusa em olhar para o passado colonial. Há uma diferença fundamental: no Brasil, temos o movimento negro mais antigo da América Latina, que há décadas denuncia o mito da democracia racial.” As pessoas, os franceses falam que não são racistas, não há estatísticas baseadas em raça na França. Então, como é que a gente vai saber como a população negra na França vive? Segundo ela, o Brasil "reivindicou esse mito da democracia racial" por muito tempo, uma "ideia romântica de que no Brasil não havia racismo". Foi necessário, segundo a autora, que os movimentos negros "denunciassem, refutassem essa ideia para que o Estado brasileiro assumisse que é um país racista e, ao assumir, criasse políticas públicas de enfrentamento ao racismo", contextualizou. Djamila sente que, na França, ainda persiste essa visão da democracia racial, com a ausência de estatísticas baseadas em raça dificultando a compreensão da vida da população negra. "Sinto que o Brasil avançou muito ao enfrentar, ao assumir que era um país racista. E aqui na França...

Duration:00:08:30

Ask host to enable sharing for playback control

Antes de conferência dos Oceanos e de megaleilão, Marina Silva critica países consumidores de petróleo

6/8/2025
A sustentabilidade está em todos os discursos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a visita à França, iniciada na quarta-feira (5). A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, é um dos carros-chefe da comitiva presidencial, mas, em casa, tem enfrentado uma onda inédita de retrocessos ambientais, a cinco meses da COP30, em Belém. Lúcia Müzell, da RFI em Paris Há duas semanas, o Senado aprovou o Projeto de Lei 2159/21, apelidado de PL da Devastação, por desmantelar a lei de licenciamento ambiental no país. Com a desculpa de "desburocratizar” os procedimentos, o texto flexibiliza as exigências para a autorização de projetos com potencial risco socioambiental – no que foi considerado pela ministra como um "golpe mortal” na legislação em vigor. Em entrevista exclusiva à RFI, na véspera de outra importante conferência da ONU, a de Nice sobre os oceanos, Marina Silva demonstrou confiança de que o presidente Lula "está agindo" para melhorar o texto encaminhado para análise dos deputados. Mas o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro – também presente na viagem à França – defende o projeto, chamado pela bancada ruralista de “destrava Brasil”. “Os poderes são independentes e temos profundo respeito por essa independência. Mas estamos fazendo ver aos parlamentares que, se essa lei do licenciamento for aprovada, diminuindo os regramentos para a proteção ambiental, nós vamos, além de criar insegurança jurídica, inviabilizar as bases legais sobre as quais nós queremos reduzir emissão de CO2”, disse Marina. Outro ponto de atrito dentro do próprio governo é o projeto de abertura de novas frentes de exploração de petróleo. Um megaleilão da Agência Nacional do Petróleo de 172 blocos em todo o país, dos quais 47 na margem equatorial, no norte do Brasil, na Foz do rio Amazonas, está marcado para o dia 17 de junho. "O fato de ter um leilão não significa que a licença esteja dada. Os leilões são feitos, depois cada bloco vai passar por um processo de licenciamento”, explicou. "O Brasil talvez seja o único país que tem um compromisso de zerar o desmatamento até 2030 e fazer a transição para o fim do uso de combustível fóssil, que tem que ser uma transição justa e planejada, com países desenvolvidos liderando esse processo. Tanto países produtores, quanto países consumidores, e países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, vindo em seguida”, salientou. A seguir, os principais trechos da entrevista, concedida em Paris. A senhora vem à França para acompanhar a visita de Estado do presidente Lula ao país, e vocês vão à terceira Conferência dos Oceanos da ONU. Os oceanos estão na linha de frente do aquecimento global e, neste sentido, dependem muito das decisões e ações tomadas nas COPs, em especial para encaminhar o fim dos combustíveis fósseis. Teremos na COP30 ações concretas neste sentido, para proteger os oceanos e o resto do planeta? Os oceanos e a questão da mudança do clima têm, de fato, sinergias positivas e negativas. Se tivermos um clima equilibrado, a gente consegue manter a biodiversidade marinha. Sem um clima equilibrado, nós já temos problemas, sobretudo em relação aos recifes de coral, que passam por processo de embranquecimento. Quando isso se soma à poluição dos oceanos por diferentes fontes, inclusive a poluição em função dos plásticos, a gente tem um agravamento ainda maior da perda de biodiversidade. O que nós temos trabalhado é para que a gente tenha, em todos os países, o compromisso de proteger pelo menos 30% das áreas na superfície terrestre e também a parte de oceano. O Brasil já tem 26% da sua área oceânica na modalidade de Unidade de Conservação e nós queremos alcançar a meta de 30%. Ao mesmo tempo, estamos fazendo também nosso planejamento espacial marinho, um programa muito importante que nós criamos, para a proteção dos manguezais. Os manguezais conseguem sequestrar mais carbono do que floresta. Então, o debate na conferência vai estar em torno daquilo que os Estados nacionais...

Duration:00:27:36

Ask host to enable sharing for playback control

Em Paris, Gilmar Mendes defende regulação das redes sociais e critica modelo atual: “Envelheceu”

6/3/2025
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, afirmou que o artigo 19 do Marco Civil da Internet precisa ser revisto diante dos desafios contemporâneos impostos pelas plataformas digitais. O magistrado defendeu, em entrevista à Rádio França Internacional (RFI), uma maior responsabilização das redes sociais e destacou a necessidade de o Brasil se inspirar em legislações europeias para enfrentar a desinformação e proteger a democracia. Nesta quarta-feira (4), o STF retoma o julgamento sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que estabelece que conteúdos só podem ser removidos mediante ordem judicial. Para Gilmar Mendes, essa regra já não responde aos desafios atuais. “Esse modelo, de 2012, 2014, quando se falava na neutralidade das plataformas, envelheceu. Ele cumpriu uma função importante, mas hoje estamos sofrendo as distorções diante da evolução das redes e dos problemas que enfrentamos, como fake news e ameaças à própria democracia”, afirmou. O ministro fez uma palestra na segunda-feira (2) no Seminário franco-Brasileiro de Rádio e Televisão organizado pela ABERT (Associação Brasileira de Rádio e Televisão) na Embaixada do Brasil em Paris, onde destacou a necessidade da regulação das redes sociais, o que não significa, segundo o decano, comprometer a liberdade de expressão. “Regular as redes sociais não é tolher, ou de qualquer forma mitigar o direito fundamental à liberdade de expressão”, declarou no evento. Gilmar Mendes estacou que o tribunal caminha para uma interpretação que permita a retirada de conteúdos mediante simples notificação às plataformas, sem necessidade de decisão judicial. “É uma mudança significativa no caminho de uma maior responsabilização das plataformas”, explicou. Brasil é exemplo Durante a entrevista à RFI, Gilmar Mendes também criticou o modelo de negócios das redes sociais, que, segundo ele, se alimenta da polarização e da desinformação. “As plataformas têm sucesso com a conflituosidade. Notícias factuais não geram engajamento. O que gera engajamento são matérias polêmicas, muitas vezes falsas. Isso está ligado à monetização”, disse. Ele defendeu que o Brasil siga o exemplo de países como França, Alemanha e Reino Unido, que já adotaram legislações mais rígidas. “As fake news não são um problema brasileiro, nós vimos inclusive nos debates as revelações de manipulações, inclusive com inteligência artificial”, afirmou. Para o decano do STF, o Brasil deve servir de exemplo, fazendo referência aos ataques de 08 de janeiro e um sistema de propagação de desinformação adotado no governo anterior. “Tivemos abuso, um governo que abusou das fake news, tinha lá o tal ‘gabinete do ódio’. As instituições se mostraram resilientes, mas nós temos consciência de que precisamos fazer uma boa regulação e, claro, temos muito a aprender com os avanços que já se detectam na Europa”, concluiu.

Duration:00:05:55

Ask host to enable sharing for playback control

Livro 'Tudo é Rio', da escritora brasileira Carla Madeira, é lançado na França

5/28/2025
Fenômeno literário no Brasil e em Portugal, a escritora Carla Madeira lança agora seu best-seller “Tudo é Rio” em francês. “L’Amour Fleuve” chegou às livrarias de Paris no dia 26 de maio, atraindo os leitores brasileiros, que já acompanham a obra da autora, e atiçando a curiosidade do público local. Em uma viagem pela Europa para participar de diversos eventos, Carla Madeira desembarcou na capital francesa para o lançamento de “L’Amour Fleuve”, mas também para conversas com leitores brasileiros e franceses. A autora, que participou do encontro literário Printemps Brésilien, na universidade Sorbonne Nouvelle, conseguiu uma brecha na agenda para contar um pouco sobre seus projetos nos estúdios da RFI. “Tudo é Rio” elevou o nome de Madeira ao patamar de escritora mais vendida do Brasil na categoria ficção em 2023. A obra também foi eleita Livro do Ano em Portugal, no ano passado. Em seguida foi lançado em italiano e agora em francês. “Tem sido uma experiência muito rica, porque é a possibilidade de estar vivendo toda essa reflexão que envolve o fazer literário. Todas as conversas e muita imersão em assuntos importantes para a minha literatura, para minha escrita”, disse. Sobre ver sua obra publicada em outros idiomas, Carla Madeira contou um pouco sobre o processo de confiança que precisou estabelecer com os tradutores, especialmente porque seus livros abordam elementos-chave da cultura brasileira, que precisam muitas vezes de um olhar mais criterioso para serem compreendidos pelos leitores estrangeiros. “Quando ‘Tudo é Rio’ chegou em Portugal, eu comecei a pensar sobre isso, em como as minhas histórias têm uma sonoridade brasileira, passa muito pelos sons de Minas Gerais, e tem esses conteúdos que fiquei na dúvida se o leitor teria aderência. Mas fiquei muito impressionada com o alcance, com o caráter universal dessas questões, da sexualidade, da religiosidade, da violência, da maternidade. São assuntos que estão fazendo sentido aqui. Eu tive conversas com os tradutores, mas é um processo que você tem que confiar na escolha da editora. Com alguns eu tive conversas mais demoradas e eles recorriam a mim para esclarecer dúvidas e abordagens. Assim a gente vai aprendendo a confiar e entregar”, explicou. “Tudo é Rio” Carla Madeira disse que não esperava o enorme sucesso de “Tudo é Rio”, e que não sabia nem que a história se tornaria um livro. “Eu não sabia se seria um conto ou se seria algo que você escreve e põe na gaveta. Mas aí eu escrevi a cena central, que é muito violenta e paralisei por 14 anos. Quando retomei o livro, eliminei tudo o que vinha antes e recomecei exatamente desse lugar que tinha me paralisado. Escrevi em oito meses e, ao final, eu vi que tinha um livro. Lancei de maneira independente, em parceria com uma editora pequena, de Minas Gerais, a Quixote+Do, com tiragem pequena, muito tímida, de 700 exemplares. Mas depois vieram mil, depois três mil. E ainda nessa editora lançamos 10 mil exemplares, o que é significativo para qualquer livro, inclusive no Brasil. Aí eu fui para a Record, que é uma editora muito robusta”, contou, reforçando que o processo foi uma construção e não do dia para noite. Quarto livro a caminho Madeira conta que os seus três livros foram escritos em paralelo à sua vida profissional. Ela é publicitária e sócia de uma agência em Belo Horizonte, e explica que mesmo hoje dedicando um tempo maior à literatura, a escrita ainda ocupa um lugar de prazer na sua rotina. “A literatura tem esse lugar de fruição, de prazer de estar escrevendo. Eu estou terminando meu quarto livro. Então eu tenho essa agenda, essa viagem, mas na hora em que eu tenho um tempinho, que posso ficar sozinha, abro o computador e me dedico. Tem que me arrancar dali porque eu tenho um gosto muito grande de escrever”, contou. Sobre o tema e a previsão de lançamento da próxima obra, Madeira diz que está na fase de releitura e que gostaria que ele saísse esse ano. Mas tudo depende das agendas, especialmente as...

Duration:00:06:00

Ask host to enable sharing for playback control

Músico francês lança álbum com adaptações de canções de Jorge Aragão

5/28/2025
Apaixonado pela música brasileira e pelo Brasil, o músico francês Arthur Albaz se prepara para lançar em junho seu primeiro álbum, “Arthur Albaz chante Jorge Aragão”, uma homenagem a um dos maiores nomes do samba. O projeto surgiu por meio de um convite de Fernanda Aragão, neta do músico brasileiro, que com a mãe, Tânia Aragão, gerencia o selo Aragão Music. No Instagram ela descobriu vídeos que Arthur Albaz, 29 anos, publica com versões de músicas brasileiras. Coincidentemente, o músico francês é casado com uma carioca fã de Jorge Aragão, com quem trabalhou para adaptar as faixas. Ao todo, dez músicas foram selecionadas para serem adaptadas com um critério específico: “escolhi as canções de Jorge Aragão sobre o amor”. Albaz explica que com a imensidão da obra do ídolo carioca, ele decidiu se conectar com a energia e a emoção que sente ao ouvi-lo. “O trabalho foi feito junto com o amor da minha vida, falando do nosso amor e do que a gente sente também”, explica. O processo foi tão romântico quanto eficiente. Em poucos meses, o casal reescreveu e gravou as dez faixas, todas elas cuidadosamente trabalhadas para respeitar a obra original. No entanto, as letras não puderam ser diretamente traduzidas para o francês. Por isso, em alguns versos, apenas o sentido foi adaptado; em outros, a similaridade da sonoridade entre as duas línguas foi o que guiou o trabalho. A faixa “Já é”, virou “J’irais” (irei, em português), mas “Doce Amizade” foi traduzida para “Sucré d’amour” (açucarado de amor). “As letras [das músicas de Jorge Aragão] são maravilhosas, não dá para traduzir diretamente, não dá para adaptar a palavra original que cabe com a emoção das músicas”, afirma. “A gente não podia traduzir ao pé da letra porque em francês não ia corresponder a nada do que ele canta”, reitera Albaz. Encarando esse desafio, o músico francês também se deu conta das nuances de cada idioma. “O jeito do brasileiro de comunicar é muito mais direto. O jeito francês vai para um lugar e depois para outro para falar sobre algo determinado”, observa. Para Albaz, não há dúvidas: quando o objetivo é expressar a emoção, o idioma português é mais eficiente. Encontro com Jorge Aragão O músico francês relembra, emocionado, o encontro com Jorge Aragão, em março deste ano, após um show do sambista na sala Circo Voador, no Rio de Janeiro. Albaz se surpreendeu com a humildade e a generosidade do ídolo, que além dos elogios ao projeto de seu álbum, também o convidou para se encontrarem no futuro. “Um momento de sorte”, resume. “Eu não vejo a hora de sentar e conversar com ele novamente sobre esse trabalho e tocar ao vivo. Eu sei que ele gostou, mas eu quero saber mais”, reitera. O lançamento do álbum antecede outro momento importante da vida de Albaz: a mudança para o Rio de Janeiro, no final deste ano. “Eu sou muito apaixonado pelo Brasil, muito mesmo. Realmente, eu queria ter nascido brasileiro. Eu falo isso para a minha mãe e o meu pai e eles também acham isso”, conta, aos risos. Não por acaso, Albaz se inspira em um movimento de artistas franceses apaixonados pelo Brasil e que se transformam em uma espécie de transmissores da cultura brasileira na França. Um dos grandes representantes deste grupo é Pierre Barrouh, que participou do movimento da bossa nova, chegando a adaptar grandes clássicos da MPB para o francês. “O Brasil, para quem conseguiu enxergar, é uma emoção que nunca sai. E a paixão que eu tenho pelo Brasil realmente construiu essa vontade de transmitir”, diz.

Duration:00:08:33