Convidado - A viagem rumo ao oeste de Babetida Sadjo
RFI
De segunda a sexta-feira (ou, quando a actualidade o justifica, mesmo ao fim de semana), sob forma de entrevista, analisamos um dos temas em destaque na actualidade.
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Adiamento das eleições "vai traduzir-se no aumento de violações dos direitos humanos"
11/4/2024
O Presidente guineense decidiu adiar a data das eleições legislativas antecipadas, alegando "não haver condições". Umaro Sissoco Embaló visitou este domingo os oficiais do ministério do Interior, em Bissau, onde prestou declarações aos jornalistas a prometer que vai "permanecer no poder até 2030 e tal". O jurista e professor na Faculdade de Direito e activista de direitos humanos, Fodé Mané, acredita que o adiamento das eleições "vai traduzir-se no aumento de violações de direitos humanos".
RFI: Em Setembro, o Presidente guineense começou por dizer que não se iria candidatar às presidenciais, mas poucos dias depois disse estar disponível para se manter no cargo, caso fosse realmente a vontade dos eleitores. Agora, afirma que se vai "manter no poder até 2030 e tal". Como é que interpreta esta afirmação do Presidente?
Fodé Mané: Nós temos um país em que há um único chefe, não há parlamento, não há um Supremo Tribunal, não há um governo legítimo, que saiu de eleições e nem há um programa com um orçamento aprovado. Temos um país a funcionar ad hoc. Apesar de estar na ilegalidade, uma das saídas era a realização de eleições gerais justas e transparentes. Convocaram-se eleições sem respeitar todas as condições, mas foi convocado. Nesta condição é claro que não haverá eleições justas, livres e transparentes. Chegámos neste momento em que se vai adiar de uma forma muito amadora. Porque se for marcado um acto eleitoral através de um decreto presidencial no qual, além do cumprimento de determinadas formalidades e determinada solenidade para que seja marcada quando vai ser adiada, deve seguir o mesmo procedimento. Não foi o que aconteceu, os partidos ou os cidadãos estavam convencidos que até o dia dois, se não fossem anunciadas nova datas mantinha-se a data de 24 de Novembro. Para isso, os partidos marcaram o início da campanha e o que veio a acontecer e é importante realçar os modos como o Umaro Sissoco Embaló envia mensagem para o país e para a classe politica.
Sempre que vai ao quartel, aparece fardado junto aos militares, depois ataca o adversário e depois anuncia alguma coisa. Na quinta-feira, esteve com o chefe de Estado maior, com alguns membros do governo, no sábado, a Guarda Nacional e no domingo a polícia de Ordem pública. Tudo aparece fardado, mostrando, até alegando que é um chefe militar, que em si é uma violação da Constituição. Vendo a forma, o lugar, a circunstância em que foi feito. Mostra que reuniu aquelas condições para continuar a navegar fora da legalidade. Isso quer dizer que é possível, num ambiente em que nos encontramos, sem Supremo Tribunal, há uma pessoa que faça do presidente que utiliza aqueles expedientes apenas para legitimar. Temos uma parte da comunidade internacional, principalmente a CEDEAO, o seu representante que está a ser muito contraditório na sua isenção. Lembro-me em 2019, José Mário devia terminar o mandato em Março. Não marcou eleições na data anterior e a CEDEAO disse que como está para além do seu mandato, já não é nosso interlocutor e o governo que saiu foi indigitado pelo partido que ganhou as eleições e passou a ter o Aristides Gomes como seu interlocutor. E o que é que nós vimos? É o mesmo sentado à frente de um representante de CEDEAO a dizer que a Constituição é uma emanação ocidental, não corresponde à nossa realidade. A nossa realidade é que deve haver um único chefe a mandar aquilo que pretende e todo o mundo deve obedecer.
Aquando da visita aos oficiais do ministério do Interior em Bissau, o Presidente guineense afirmou que existem "mais oficiais nas forças de defesa e segurança do que soldados". Apontou que existe um problema estrutural nas Forças Armadas. Quais é que podem vir a ser as consequências desta desproporção para a segurança nacional e para a estabilidade política da Guiné-Bissau?
Quem ouviu a recente entrevista do Chefe de Estado Maior é uma situação que foi assumida como uma situação normal, que não vai dar em nada, a não ser um peso para o orçamento geral do...
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Mia Couto: "A relação colonial entre Europa e África mantém-se actual"
11/1/2024
"A Cegueira do Rio" é o mais recente romance de Mia Couto lançado em Portugal. Uma obra onde o escritor moçambicano partilha "o registo de uma outra maneira de ver o mundo, um outro sentimento do mundo".
Considerando ser "vital no momento de hoje" a "disponibilidade para ouvir outras sabedorias", com "A Cegueira do Rio" Mia Couto oferece a visão de uma cosmogonia, um saber que vai além de um modelo único de ser.
Em "A Cegueira do Rio", um rio que "é a tinta que nos permite comunicar pelo mundo inteiro", um evento algo mágico, um tanto apocalíptico, acontece: A tinta acaba, desaparece dos documentos, as pessoas perdem a capacidade de escrever e quem resta com esse saber são apenas alguns, poucos, indígenas africanos.
Num desafio para que a História seja "escrita em conjunto", o autor inverte a hierarquia, altera a posição de centro e periferia.
"A Cegueira do Rio" foi o pretexto para a entrevista de Mia Couto à RFI, mas a liberdade na literatura africana, as conotações políticas na literatura ou a relação colonial entre Europa e África também foram alguns dos temas da nossa conversa com o autor.
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Kiluanji Kia Henda: "A liberdade é uma base indispensável"
11/1/2024
Kiluanji Kia Henda deu na sexta-feira, 25 de Outubro, uma masterclass sobre memória e espaço público na Universidade Sorbonne, em Paris. O artista angolano tem vindo a desenvolver um trabalho em torno de memórias e narrativas históricas, usando a ficção como meio para questionar e reinterpretar o passado. Kiluanji Kia Henda alerta para o facto de "faltar acesso ao conhecimento histórico [em Angola]".
RFI: Cria obras de arte, performance, filmes. Aqui usou da palavra para partilhar a sua história e partilhar o que o inspirou a fazer os seus projectos. Disse que falta contar tudo. Podemos dizer que o seu trabalho liberta memórias?
Kiluanji Kia Henda: Acho que mais do que pensar sobre libertar memórias, é preciso activa-las, mas activa-las não no sentido de tentar ser fiel à memória ou ao passado, mas tentar encontrar uma interpretação que seja fiel a narrativas já existentes. Existe mais uma tentativa de olhar para a ficção, de como podemos fantasiar e de como podemos questionar certos episódios de passado, certos episódios que são centrais na nossa história, usando o campo da ficção para que isso possa acontecer. Para mim sempre foi importante esse questionamento da história através da ficção.
Fala da ficção, mas baseia-se na realidade e do que observa à sua volta?
Sim, é necessário para mim essa observação. Sou uma pessoa extremamente observadora, mas no momento em que trago para aquilo que é a minha criação, já obedece outra forma de estar. Existe uma maior liberdade. Eu gosto da liberdade que os campos da ficção me permitem, embora possa criar essa relação com a realidade, tentar criar ali uma linha ténue entre ficção e realidade do que é o documentário e do que é a liberdade poética. Mas para mim, é importante pensar sobre os campos da liberdade que a ficção que a poesia permitem, no sentido de que não me cria um compromisso com que a realidade. Isso permite me também poder viajar sobre distintas temporalidades que eu acho muito importante do contexto de onde venho, do país de onde venho, do continente de onde sou. Essa capacidade de poder viajar em distintas temporalidades é para mim uma das vantagens de ser um artista. Para mim é esse poder que a arte me atribui, poder viajar em diferentes temporalidades.
Na masterclass disse que "não existe Angola sem projecto colonial, que os ciclos de violência trouxeram o vazio no país, trouxeram a falta de acesso à história, uma incapacidade de projectar um futuro". Fez referência, nomeadamente, à pobreza, condição que impede que as pessoas se consigam projectar para o dia de amanhã, uma vez que os problemas existem no tempo presente e no dia-a-dia. É isso que o leva a pensar na história?
Sim, é exactamente isso. Quando falei sobre essa viagem entre distintas temporalidades, como criar uma ponte entre passado e futuro, mas rejeitando o presente. Poder fazer esse exercício dentro da criação artística é necessário num lugar onde toda a questão da violência histórica e de toda a dificuldade que ainda se vive e se agarra nos muito ao presente. Eu penso que olhamos para todas as grandes sociedades. São aquelas que têm acesso à história e têm a capacidade de projectar o seu futuro.
Os angolanos não têm acesso à história?
É muito débil esse acesso porque primeiro vem de uma situação de sistemática destruição das suas referências históricas, que foi causada pela colonização e, segundo, ainda hoje, não existe um verdadeiro investimento nessas estruturas que lhe permitam preservar e também que permitam ter o acesso a esse conhecimento histórico. Claro que quando falo que não existe Angola sem colonização também é referindo a importância de pensarmos sobre toda essa diversidade cultural étnica que muitas vezes desaparece quando tudo se torna um discurso hegemónico, que tem como a sua base a colonização.
Além de que, como referiu, "o pior da censura é o polícia que vive dentro de nós". Há uma herança também desse polícia?
Existe uma herança, claro, à escala global. Existe polícia de...
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Especialista de relações internacionais, Osvaldo Mboco lança livro sobre diplomacia angolana
11/1/2024
Osvaldo Mboco, especialista em Relações Internacionais ligado à Universidade Técnica de Angola e voz conhecida da RFI pelas suas análises, lança no próximo dia 6 de Novembro, o seu novo livro, "Política externa de Angola, Principais marcos, desafios e perspectivas".
Nesta obra que vem no seguimento de outros livros como “Os desafios de África no século XXI – um continente que procura se reencontrar”, publicado em 2021 ou ainda "As eleições em Angola, de 1992 até aos nossos dias" lançado em 2022, Osvaldo Mboco evoca designadamente a evolução das relações do seu país com os seus parceiros nos Estados Unidos, Rússia, China ou ainda França, passando em revista os momentos-chave da diplomacia angolana desde a independência, em 1975, até aos dias de hoje.
RFI: Relativamente aos marcos históricos da diplomacia angolana de 1975 até aos dias de hoje, como é que poderíamos resumir em poucas palavras a evolução da diplomacia angolana nesses anos? Partimos de um país recém-independente de cariz socialista, para um país que agora multiplica as parcerias com países que até são antagónicos no plano internacional.
Osvaldo Mboco: Nós, neste livro, entendemos dividir a política externa de Angola em seis épocas importantes. De 1975 até 1979, marca, ao nosso entender, a primeira fase da política externa de Angola. Depois de 1979 a 1989: porque aqui em 79, estava a entrar um novo Presidente que é o Presidente Eduardo dos Santos e de facto não alterou em grande medida aquilo que eram os pilares estruturais da política externa de Angola, porque nós tínhamos uma política externa voltada neste período ao marxismo-leninismo. A nossa relação era muito mais próxima para os países comunistas ou socialistas nesta época. Esse período termina em 89 e é a queda do Muro de Berlim. O país começa a fazer reformas importantes do ponto de vista da abertura da economia de mercado, mas ainda um país que tinha assente pilares naquilo que era a ideologia marxista-leninista. E depois há o terceiro período, que é de 1989 até 1992. Nesse período, onde também o país foi obrigado, até certo ponto, a abrir-se para o multipartidarismo e começar também a se relacionar com outros Estados. Depois de 92 até 2002, que é um período marcado fortemente pelo conflito civil, onde a estratégia da política externa de Angola era muito mais voltada para o objectivo de encurtar as linhas de apoios e abastecimento que a Unita tinha. É uma política de boa vizinhança também com os países vizinhos, no sentido de a Unita ser entendida não como um grupo de guerrilha, mas como um grupo rebelde. Esse foi um trabalho também da nossa diplomacia. Depois, teve o quinto período, que é de 2002 até 2017. Nesse período, um período pós-guerra, um período em que o país se abriu, vai buscar novas perspectivas. Depois, o outro período é de 2017 até aos nossos dias, que já é um período marcado pela presidência do Presidente João Lourenço. Agora, claramente que nós também trouxemos aqui neste livro o nosso actual reposicionamento no sistema internacional, enquanto país que hoje vai buscando várias alianças, até com aqueles países que no passado eram antagónicos. Tudo indica que está a existir uma mudança da política externa de Angola do eixo Pequim-Moscovo para o eixo Bruxelas-Washington. E isto tem estado de facto a criar muitos debates, também ao nível da Academia. E olhando para esta reconfiguração da política externa angolana, onde condena actos nas Nações Unidas, por exemplo, a anexação das quatro províncias da Ucrânia pela Rússia, a intenção que o Estado angolano tem também de adquirir equipamento militar americano. Quando olhamos para grande parte do equipamento militar angolano hoje que é do Pacto de Varsóvia, arrisco-me a dizer que em Angola não existem cinco generais, pelo menos um, que têm estudos ou formação na Rússia. E como é que fica a descontinuidade disto? Quanto tempo levaria, quais são os gastos que nós teríamos? E os treino, etc. Agora, os Estados, no sistema internacional, eles competem...
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Nas eleições nos Estados Unidos da América "tudo pode acontecer"
10/31/2024
A eleição do próximo presidente dos Estados Unidos está cada vez mais próxima e o resultado é incerto, com Donald Trump e Kamala Harris a aparecerem empatados em quase todas as grandes sondagens norte-americanas. Uma tendência que se repete desde 2016, com os estados indecisos, ou swing states, a parecerem alinhar desta vez na sua maioria com o antigo Presidente Donald Trump.
Em entrevista à RFI, Germano Almeida, jornalista e autor de vários livros sobre as eleições e os presidentes norte-americanos, considera que esta proximidade entre os dois candidatos é normal, já que a sociedade norte-americana está cada vez mais polarizada - uma tendência que acontece desde 2016, altura em que Trump se candidatou pela primeira vez.
"Os Estados Unidos são uma sociedade hiper polarizada, pois está muito dividida. As últimas duas ou três eleições já tinham sido bastante equilibradas. Esta está a ser ainda mais porque se eventualmente Biden tivesse sido o candidato e não tivesse o problema da idade avançada, eu diria que apareceria como favorito. Mas Kamala Harris não foi as primárias. Era uma vice-presidente impopular, herda uma administração impopular e difícil. No caso de Donald Trump, é alguém que tem há muitos anos, de forma consistente, uma grande desaprovação. Então são dois candidatos com problemas para ganhar. Eu diria que Trump tem o caminho mais facilitado para ganhar, porque há muitos americanos descontentes, sobretudo com a herança económica. Já Kamala precisa de uma super mobilização, o que até pode acontecer", explicou o especialista nas eleições norte-americanas.
É essa mobilização que pode ajudar Harris na recta final desta eleição, especialmente nos sete estados indecisos, ou swing states, onde Donald Trump domina face há quatro anos, em que Biden ganhou seis em sete destes estados.
"As sondagens mostram que o número de indecisos já é muito baixo nos estados indecisos. As sondagens apontam para que haja de 5% a 7% indecisos, não mais. Kamala ainda não desistiu de convencer alguns republicanos que rejeitam Trump. São alguns. Não são muitos, mas até podem ser importantes nalguns estados. Mais importante do que isso, é mesmo a mobilização. Para Kamala Harris é completamente diferente se os negros votarem 50% ou 70%. Se votarem a 50% ela não ganha. Se votarem a 70% ela ganha com essa diferença", indicou o jornalista.
O pós-eleições, especialmente após a tomada do Capitólio há quatro anos aquando a tomada de posse de Jor Biden, fazem temer o pior em termos de estabilidade política para os Estados Unidos independentemente de quem saia vencedor das eleições de 05 de Novembro. Um país "
"Estamos numa fase em que o lado que vier a perder não vai aceitar o outro lado. É um cenário mesmo muito complicado, porque o campo de Trump não só não vai aceitar como vai achar mesmo que ganhou. Portanto, tudo pode acontecer. A situação é de grande risco e vai ser de grande stress e tensão para o sistema", concluiu Germano Almeida.
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Coreia do Norte e Rússia reforçam aliança político-militar, em vésperas de eleições nos EUA
10/29/2024
A Coreia do Norte enviou cerca de 10 mil soldados para treinar na Rússia. A informação foi confirmada esta segunda-feira 28 de Outubro pelo Departamento de Defesa norte-americano. Algumas tropas norte-coreanas poderão já estar a deslocar-se para a frente de batalha na Ucrânia, de acordo com os serviços de inteligência da Coreia do Sul. A cooperação com Moscovo poderá representar, para Pyongyang, "uma abertura ao mundo", considera Álvaro Vasconcelos.
A aliança político-militar entre a Coreia do Sul e a Rússia, reforçada desde o início da invasão russa da Ucrânia em 2022, adquire uma nova dimensão com o envio de tropas norte-coreanas para combater no campo de batalha.
Numa altura em que Vladimir Putin procura desenvolver e liderar uma possível aliança anti-ocidental, "Pyongyang tem todo o interesse em sair do seu isolamento", analisa o especialista em relações internacionais Álvaro Vasconcelos. A Coreia do Norte é um dos países mais isolados do mundo, recorda o analista. Mantém relações com a China, "embora a China seja um aliado sempre crítico de algumas das acções da Coreia do Norte".
Neste contexto, a Coreia do Norte tenta inserir-se na nova dinâmica internacional que a Rússia procura desenvolver de uma aliança anti-ocidental, contando nomeadamente com a China, o que daria a Pyongyang uma "abertura para o mundo". De acordo com Álvaro Vasconcelos, o centro de gravidade desse objectivo de aliança anti-ocidental é, precisamente, a guerra na Ucrânia.
Por outro lado, ao reforçar a cooperação com Moscovo, a Coreia do Norte "não só se reforça militarmente", como passa a contar, em troca, com o apoio militar da Rússia, o que "tem evidentemente um impacto muito grande", diz Álvaro Vasconcelos. Uma das principais razões é a situação na península coreana, na fronteira com a Coreia do Sul.
"Seúl está extremamente preocupada com a possibilidade de a Coreia do Norte encontrar neste contexto e sobretudo, se Trump ganhar as eleições, uma oportunidade para criar tensões mais graves na fronteira com a Coreia do Sul", explica o analista.
As eleições norte-americanas serão decisivas, já que é conhecida a proximidade entre Donald Trump e Kim Jong-Un, e entre Donald Trump e Vladimir Putin.
Se o candidato republicano à Casa Branca for eleito, "uma eventual aliança anti-ocidental, protagonizada por Putin e contando com Kim Jong-Un deixaria de ser vista como um problema" por Donald Tump para os Estados-Unidos, avança o investigador.
Em causa, estariam "as áreas onde a aliança liderada por Putin procura avançar, ou seja na Ucrânia, na Geórgia, na Moldávia, no Sahel, e talvez no Médio Oriente", analisa Álvaro Vasconcelos, que conclui: "Evidentemente que a estratégia de Putin seria favorecida, de uma forma claríssima, pela vitória de Trump".
De acordo com cálculos da agência France-Presse, baseados nos dados fornecidos diariamente pelo Instituto para o Estudos da Guerra (ISW), Moscovo controla actualmente cerca de 18,2% do território da Ucrânia.
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“Moçambicanos da diáspora pedem justiça, transparência e paz para Moçambique”
10/29/2024
“Os moçambicanos da diáspora pedem justiça, transparência e paz para Moçambique” - esta é a mensagem do recém-criado movimento Os Indignados que junta moçambicanos residentes em vários países europeus. O grupo tem denunciado, através de comunicados, a violência pós-eleitoral em Moçambique e promete uma manifestação em Bruxelas, junto à Comissão Europeia, em breve.
RFI: Como nasceu este movimento da diáspora e quais os objectivos?
Laura Chirrime, moçambicana residente em França há 20 anos: A diáspora criou um movimento que se chama Os Indignados, que é um grupo de moçambicanos que não estão afiliados a nenhum partido político. É um movimento que se criou no dia 15 de Outubro face à violência que aconteceu logo a seguir às eleições. Todos os moçambicanos na diáspora ainda não fazem parte do grupo porque alguns apoiam partidos políticos e têm outras convicções. Então, nós somos um grupo de moçambicanos que estamos a querer justiça e transparência nas eleições de Moçambique.
Quantos são até agora?
Até agora somos 70 moçambicanos da Itália, Alemanha, Croácia, Bélgica, Holanda, Portugal, Inglaterra e Espanha.
O que é que pedem os moçambicanos da diáspora?
Os moçambicanos da diáspora pedem justiça, transparência e paz para Moçambique.
E poderem manifestar?
E poder manifestar à vontade.
Até agora, o que têm feito e quais são as próximas acções previstas?
Até agora, nós estamos a agir em silêncio, como se diz. Temos estado a enviar cartas para as diversas instituições governamentais e internacionais a reportar o que está se a passar em Moçambique. Falámos com a Comissão Europeia, Amnistia Internacional, Liga dos Direitos Humanos, a ONU, e temos estado a informar a imprensa estrangeira sobre o que está a acontecer em Moçambique, enviando comunicados de imprensa para os jornalistas.
O que é que dizem nesses comunicados de imprensa?
Pedimos justiça e transparência nas eleições em Moçambique. Somos moçambicanos residentes em vários países da Europa e estamos indignados com o que está a acontecer em Moçambique depois das eleições. O que é que nós estamos a reivindicar? Nós estamos a reivindicar o direito à transparência. Estamos a reivindicar o direito à palavra dos moçambicanos, o direito à manifestação pacífica que os moçambicanos solicitam. Estamos a pedir, estamos a implorar que não se façam assassinatos por causa destas eleições porque depois das eleições foi assassinado um advogado, Elvino Dias, que era um advogado que trabalhava com um candidato presidencial da oposição, e foi assassinado um representante do partido da oposição, o mandatário do Podemos. Foi um crime muito violento, um crime que chocou o país inteiro. Ninguém estava à espera desse crime e não percebemos porque é que houve esse crime.
Além dos comunicados, fizeram outras acções?
Fizemos uma acção ao pé da Embaixada de Moçambique em Paris. Fomos pôr uma coroa de flores e fizemos uma oração em nome do advogado e do representante do Podemos que foram assassinados em Maputo.
Estão a preparar mais acções?
A nossa primeira fase foi uma manifestação silenciosa que foi enviar cartas para instituições. Sempre damos a saber a Moçambique o que estamos a fazer porque as cartas têm sempre em cópia o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Se é possível, as Embaixadas também recebem as cartas. Agora estamos a organizar uma acção concreta que é irmos à Comissão Europeia. Temos uma manifestação prevista para daqui a alguns dias na Comissão Europeia, onde estarão moçambicanos vindos de várias partes da Europa. Pedimos para sermos recebidos na Comissão Europeia para manifestarmos a nossa indignação perante os crimes que estão a acontecer em Moçambique.
E querem ser recebidos concretamente por quem? Vai haver uma manifestação às portas da Comissão?
Gostaríamos de ser recebidos pela presidente ou um mandatário da presidente da Comissão Europeia ou alguém que tenha disponibilidade para nos receber. Nós gostaríamos de entregar em mão as nossas manifestações para podermos...
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"Há todas as condições para eclodir um conflito armado em Moçambique" - analista
10/28/2024
Em Moçambique, a situação política continua incerta depois do anúncio na passada quinta-feira dos resultados das eleições gerais de 9 de Outubro, em que Daniel Chapo, candidato presidencial da Frelimo no poder foi dado como vencedor com um pouco mais de 70% dos votos, contra cerca de 20% para Venâncio Mondlane, apoiado pelo partido extraparlamentar Podemos.
Estes resultados foram rejeitados pela oposição que prometeu contestar junto dos órgãos competentes. Ontem, domingo, o Podemos apresentou um recurso junto do Conselho Constitucional, instância judicial que tem a última palavra sobre os resultados eleitorais. Afirmando basear-se em 70% das actas e editais originais, o partido que apoia Venâncio Mondlane diz que ele venceu as presidenciais com um pouco mais de 53% dos votos e que as suas estruturas obtiveram 138 mandatos nas legislativas, contra 91 para a Frelimo.
Neste sentido, esta formação reclama uma nova contagem dos votos, à semelhança de outras entidades, nomeadamente o CIP, Centro de Integridade Pública, que no seu mais recente boletim -publicado ontem- diz ter identificado pelo menos 170 mil votos falsos a favor da Frelimo e do seu candidato Daniel Chapo.
Paralelamente, apesar de uma relativa acalmia, depois das violências ocorridas durante os dois dias de protestos, quinta e sexta-feira, ONGs tendo contabilizado 11 mortos e cerca de 500 detenções, o fim-de-semana não deixou de ser marcado pelo baleamento de 6 a 7 simpatizantes do Podemos no sábado, no distrito de Mecanhelas, na província do Niassa, no extremo noroeste do país, à margem da comemoração da vitória da Frelimo pelos seus apoiantes.
A ocorrência foi noticiada nomeadamente pelo Centro de Integridade Pública, cujo editor Lázaro Mabunda, falou com a RFI sobre as possíveis evoluções políticas dos próximos dias, nomeadamente com a abertura para o diálogo expressada pela Frelimo, o activista começando todavia por referir-se ao que sucedeu em Niassa.
RFI: Este fim-de-semana foi marcado, designadamente pelo baleamento de seis a sete militantes do Podemos, um baleamento de que o CIP teve conhecimento e detalhou no seu boletim.
Lázaro Mabunda: O que aconteceu é que em todos os distritos, o partido (Frelimo) organizou-se e saiu à rua para celebrar a sua vitória. E em Mecanhelas aconteceu a mesma coisa. Estaria lá, nessas celebrações de cabeça-de-lista para a Assembleia provincial que vai automaticamente ser governadora da província de Niassa. Aconteceu que o Podemos também tinha uma marcha marcada. A marcha do Partido Podemos coincidiu com a concentração da Frelimo para a celebração da sua vitória, e a Frelimo estava concentrada no seu comité distrital. A trajectória da marcha do Podemos passava justamente em frente do Comité Distrital do partido Frelimo. O que acontece é que esses militantes do Podemos traziam pneus, traziam paus, traziam pedras e quando chegaram ali, onde estava o partido Frelimo, queimaram pneus, fizeram fogo ali com os paus que tinham e consta que ali começou-se a atirar algumas pedras. A polícia fez um cordão para proteger os elementos da Frelimo que estavam concentrados. Depois de um tempo, a polícia, para dispersar os membros do partido, começou a disparar para o ar, mas foi uma sequência de tiros disparados mais ou menos um ou dois minutos seguidos. Os membros do Podemos começaram a fugir. A polícia começou a persegui-los. Nesses disparos, a polícia usou balas verdadeiras e atingiu os simpatizantes do Podemos, dois dos quais, segundo a informação que tive, foram evacuados para a cidade de Cuamba, que é a segunda cidade mais importante de Niassa. Parece que pela gravidade, foram transferidos para Nampula.
RFI: Consta que durante estes incidentes, também houve jornalistas que estavam a cobrir estes acontecimentos, que viram os seus telefones celulares a serem confiscados.
Lázaro Mabunda: Sim, foram confiscados os seus telemóveis e foram ameaçados durante a confiscação dos telemóveis, porque um dos jornalistas estava a recusar-se a...
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Márcio Carvalho: "Temos que confrontar e mudar a história"
10/27/2024
O artista português Márcio Carvalho participou pela primeira vez na mais importante feira de arte contemporânea africana europeia, AKAA - Also Know as Africa, em Paris. Márcio Carvalho apresentou dois projectos "Falling Thrones" e "Memories for 14 busts", sobre memória e espaço público em torno das temáticas pós-coloniais.
RFI: Participa pela primeira vez na feira de arte e design africanos AKAA - Also Know as Africa. Que obras apresenta?
Márcio Carvalho: Eu estou a apresentar trabalhos em desenho de duas séries que eu tenho estado desenvolver desde 2021. Uma delas chama se Falling Thrones e a outra chama se Memories for 14 busts. Ambos os trabalhos têm a ver com o espaço público, memória e espaço público. Como é que nós recordamos enquanto corpos biológicos, mas também como nos recordamos enquanto corpos colectivos? Tipo um hipocampo colectivo social e como é que nos recordamos do nosso passado em comum.
Já esteve em exposição em Marselha, no sul de França, na exposição Europa Oxalá, uma exposição que percorreu vários países. Uma exposição que falava desta temática que o acompanha, que é a questão da memória.
Foi uma exposição incrível na qual participei, tive todo o orgulho com uma série de artistas incríveis, com os curadores também incríveis António Pinto Ribeiro, Aimé Mpane, Katia Kameli. Foi muito interessante não só expor, mas também ter a oportunidade de debater com eles este tipo de temáticas pós-coloniais, não só na ideia de trazer de volta as teorias pós-coloniais, mas da prática, a prática pós colonial. A arte como um veículo de prática pós colonial e de descolonização, seja do território, seja da linguagem de várias frontes. Mas como é que se faz isso na prática?
A questão é essa como é, como é que se faz isso na prática? Como é que se faz isso na arte?
Por exemplo, existe a possibilidade, em Lisboa, de fazer uma contextualização de alguns objectos coloniais que estão num espaço público. E a contextualização nunca pode ser uma coisa feita à porta fechada. Se for feita à porta fechada, o que acontece? Não existe participação da sociedade civil. O que a arte pode fazer é fazer essas pontes, as pontes com a sociedade civil. Tu não precisas ser literário em arte, tu não precisas ser um expert em arte para poderes interagir com a arte, para poderes participar em projectos artísticos. É esta coisa que a arte pode fazer que é muito interessante, que é trazer esses públicos para dentro, não só do discurso artístico, mas também do discurso político, social, cultural, contextual e dos contextos de onde está a operar.
Por que motivo ainda é tão difícil e se fala de forma tão tímida, de descolonização?
É uma muito boa pergunta. Eu acho que todo o processo de colonização foi um processo que levou centenas de anos a consolidar. No caso de Portugal, através do Estado Novo, houve uma consolidação do colonialismo ainda maior. Houve um género de um forjar da identidade portuguesa indissociável do colonialismo. O que foi uma coisa que perdura até os tempos de hoje. Se virmos, a gente fala das descobertas. É um tópico... Eu vivi na Alemanha muito tempo, apresentei trabalho em cinco continentes diferentes e vejo que há muitas frontes, muitos países, muitos contextos que já falam destas coisas há muito tempo.
Portugal ainda está muito atrasado. Porquê? Talvez por isso, porque tivemos uma ditadura durante muitos anos e foi uma ditadura que forjou. Foi propositado criar uma cultura colonial para que o português se sinta que sem as ditas descobertas não tenho história. Eu não tenho história se não tiver esta parte, o que é errado, porque existe muita história no continente e existe dentro da parte colonial. Existem histórias de interacções entre povos e essas são as histórias que podem ser interessantes, onde portugueses se encontraram com nigerianos, onde portugueses encontraram muçulmanos e entre ajudaram se para ir ao encontro de espaços que nunca estiveram e ao encontro de culturas que nunca tiveram acesso. Essa poderá ser a...
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Moçambique: "Tudo cabe à apreciação, em última instância, do Conselho Constitucional"
10/25/2024
A Comissão Nacional de Eleições de Moçambique divulgou ontem os resultados oficiais das eleições gerais de 9 de Outubro. De acordo com estes resultados, o candidato da Frelimo no poder, Daniel Chapo, foi eleito Presidente com mais de 70% dos votos, em segundo lugar ficou Venâncio Mondlane apoiado por um partido recente, o Podemos, que alcançou cerca de 20% dos votos, a Renamo, até agora principal força de oposição, recolheu quase 6% dos sufrágios e o MDM, chegou em quarta posição com pouco mais de 3% dos votos.
Depois do anúncio dos resultados, o candidato declarado vencedor, Daniel Chapo disse que "quer ser o Presidente de todos os moçambicanos". Por seu turno, na oposição, Venâncio Mondlane declarou nas redes sociais que "estes resultados não reflectem a vontade popular" e apelou os seus apoiantes a dar continuidade aos protestos que ele convocou. O MDM e a Renamo também consideraram que estes resultados foram forjados e disseram que vão contestá-los junto das entidades competentes.
Na rua, a tensão foi patente ontem à noite, nomeadamente em Maputo, mas sobretudo, na província de Nampula, no norte, onde as autoridades deram conta de um morto, sendo que terão sido detidas mais de 300 pessoas no âmbito dos protestos.
Foi sobre este cenário que a RFI conversou com o cientista político e professor universitário Justino Quina que começa por recordar que os dados enunciados ontem não são definitivos e ainda precisam ser analisados pelo Conselho Constitucional.
RFI: O que sobressai destes resultados, com a Renamo -tradicionalmente principal força de oposição- a ir para o terceiro lugar?
Justino Quina: Os dados que foram anunciados ontem pela Comissão Nacional de Eleições não são definitivos no seu todo, porque, existindo alguma reclamação pela parte dos partidos políticos, no caso concreto do Podemos e do candidato que suporta, esses partidos têm espaço para que, existindo evidências práticas, todos esses elementos devem ser encaminhados para a última instância, o Conselho Constitucional. E o Conselho Constitucional poderá naturalmente apreciar, e existindo de facto, evidências que provem que tinha razão o Partido Podemos, mas sobretudo o candidato Venâncio Mondlane, penso que esses resultados poderão alterar, mas tudo isto cabe à apreciação, em última instância, do Conselho Constitucional. O outro ponto é com relação às manifestações, aos protestos. Temos suporte constitucional à manifestação pacífica. Os protestos são constitucionais no sentido de que todos os cidadãos têm direito de manifestarem quando entendem e as suas reclamações devem ser atendidas. E nós temos um historial no nosso país em que, de facto, as pessoas já apresentaram preocupações usando desse preceito constitucional. No meu entender, o que pode estar a falhar neste momento, é a maneira como esses protestos estão a ser levados a cabo. Porque quando há vandalismo, isto é mau e nós temos que encontrar formas de repudiar isto, mas também apelar aos próprios manifestantes que não usem este mecanismo. Olhando para aquilo que poderá acontecer em termos de configuração da própria política nos próximos tempos, a se confirmarem esses resultados, nós teremos aqui uma reconfiguração do próprio Parlamento, em que vamos ter o Podemos como a segunda força política. Teremos uma ruptura daquilo que nós fomos tendo no nosso Parlamento ao longo do tempo em que, no início, quando começou o parlamento multipartidário, tivemos a Frelimo e a Renamo como as maiores forças políticas, embora tivesse ali um ou outro partido, como a União Democrática. Mas depois tivemos a entrada do Partido do Movimento Democrático de Moçambique, o MDM. Tivemos três forças políticas, mas nestas eleições, nós temos um estreante que se chama Podemos. O que que significa? Significa que nós, de forma tácita, estamos aqui a verificar o fim da dicotomia que sempre vivemos na nossa política, entre a Frelimo e a Renamo. E nessas eleições, temos essa surpresa em que a Renamo cai em termos de assentos no...
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Morte de Odair Moniz: “Sem justiça não há paz”
10/24/2024
Os distúrbios que aconteceram nos últimos dias na periferia de Lisboa levantam, mais uma vez, a questão do racismo e da atitude da polícia nas chamadas "zonas urbanas sensíveis" da capital portuguesa. Yussef, emigrante e activista anti-racista guineense que vive na Grande Lisboa, disse à RFI que, se nada mudar, estes episódios vão acontecer cada vez mais.
O presidente da república de Portugal disse esta quinta-feira que se verifica uma "desescalada da violência" e que a "paz social" está a regressar à Área Metropolitana de Lisboa, depois de três noites de tumultos.
Odair Moniz, 43 anos, cidadão cabo-verdiano, e morador no Bairro do Zambujal, na Amadora, foi baleado mortalmente por um agente da PSP na madrugada de segunda-feira.
A RFI falou com Yussef, emigrante e activista anti-racista guineense que vive na Grande Lisboa, sobre as circunstâncias e as consequências deste caso, que levanta, mais uma vez, a questão do racismo e da atitude da polícia nas chamadas "zonas urbanas sensíveis" da capital portuguesa.
RFI: Não é a primeira vez que acontece uma morte nestas circunstâncias, mas é a primeira vez que há esta reacção. Como é que explica a dimensão dos protestos?
Yussef: Os protestos têm a ver com o contexto político que vivemos, neste momento, em Portugal. Como disse, e bem, não é a primeira vez que esta situação acontece. O policiamento que existe, por exemplo, na Cova da Moura, é diferente do policiamento que existe eventualmente num bairro do centro de Lisboa. Isto tem a ver com os critérios que a PSP alavanca no sentido de designar estas zonas como sensíveis, o que desde já cria um conjunto de problemas, tendo em conta a caracterização e depois o relacionamento que esta instituição que é PSP tem com os moradores dessas zonas. Acredito que a razão principal pela qual nós temos esta indignação, eu diria que a nível nacional, tem a ver com o momento político.
Existem movimentos a partir desses mesmos bairros que dão voz a este protesto, que têm uma dimensão nacional neste momento e, ao mesmo tempo, existe uma solidariedade da parte da sociedade portuguesa através de partidos políticos que têm assento no Parlamento e têm voz na comunicação social. Isto faz com que haja uma outra dimensão do homicídio que aconteceu segunda-feira de madrugada.
RFI: Falou de partidos que estão solidários com estas comunidades, mas também há partidos que utilizam esta situação para fomentar o medo em relação a estes bairros.
Yussef: O “Chega” tem uma agenda clara de polarização no seio da sociedade portuguesa, no sentido de angariar votos e, ao mesmo tempo, colocar em prática o projecto político que tem características claramente fascizantes. O senhor André Ventura disse que o polícia que cometeu o homicídio deveria ser condecorado, mesmo sem existir uma investigação que tenha transitado em julgado, uma decisão final sobre o que aconteceu e o apuramento das responsabilidades. É um discurso típico de regimes em que o Estado de Direito democrático não existe. O “Chega” tem sua agenda e é preciso denunciar. Esta agenda é baseada em preconceito, no racismo e na xenofobia.
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Moçambicanos vivem com medo: "Quem será a próxima vítima?"
10/23/2024
Milhares de pessoas participaram esta quarta-feira, 23 de Outubro, no funeral de Elvino Dias, advogado do candidato presidencial Venâncio Mondlane. O director executivo do Centro para a Democracia e Direitos Humanos de Moçambique, Adriano Nuvunga, esteve presente nas exéquias, e diz ter visto uma população enlutada mas, simultaneamente, com vontade de lutar pela justiça e pelos direitos humanos. O activista lembra, ainda, que a repressão policial intensificou o medo entre os moçambicanos.
RFI: Em que estado de espírito se encontra e em que estado de espírito se encontram os moçambicanos relativamente a estes dois assassínios, às duas mortes que resultaram da repressão das autoridades. Na segunda-feira, a polícia recorreu à força com disparos de tiros, usou de gás lacrimogéneo contra Venâncio Mondlane, jornalistas e manifestantes?
Adriano Nuvunga: Hoje, no velório e nas exéquias fúnebres, vi o misto de sentimento das pessoas presentes. Por um lado, as pessoas continuam a chorar este assassínio bárbaro e barulho macabro de Elvino Dias e de Paulo Guambe. O estado de choque nas pessoas ainda está presente. Lembra-se que há cinco anos atrás se matou da mesma forma Anastácio Matável. As pessoas estão ainda em estado de choque, mas ao mesmo tempo as pessoas estão a dizer: já choramos este lutador que tombou nas mãos das forças do mal. É preciso honrá-lo, continuar a sua obra e legado, juntando-se para lutar por justiça. Na verdade, fazendo da luta do Elvino a sua luta. A luta pela defesa do povo, a luta pela justiça no geral e justiça eleitoral em particular, que é o meio através do qual a vontade do povo se expressa. Foi este o sentimento e o estado de espírito que eu vi hoje nas exéquias fúnebres.
RFI: Venâncio Mondlane encontra-se em parte incerta. Recaem sobre ele e sobre membros do partido Podemos ordens para o abaterem. Num clima tão tenso, todos temem pela segurança. Há receio e um medo generalizado em Moçambique?
Há medo generalizado em Moçambique: de quem será a próxima vítima? Quem será o próximo sangue a ser derramado, particularmente num contexto em que o sentimento é o de que este é um crime do Estado contra cidadãos. É um crime do Estado contra activistas, contra defensores da democracia e dos direitos humanos. São armas de guerra que estão a matar activistas, estão a matar advogados.
O regime da Frelimo perdeu a face com críticas internas e externas relativamente a irregularidades que teriam sido cometidas aquando das eleições gerais de 9 de Outubro.
Não creio que sejam mais irregularidades. Esse tema não se aplica mais para a situação em Moçambique. Essas eleições são uma charada. São eleições sem credibilidade, eleições que não são o meio através do qual o povo pode falar e as instituições de Moçambique não permitem o respeito pela vontade popular. Por isso não se pode falar em irregularidades. Mas, claro, este regime, que já está ao que se vê a passar para o uso da força, há suspeitas de serem esquadrões de morte ligado ao regime, mas sobretudo na segunda-feira viu-se um regime que saiu a atacar cidadãos indefesos, inclusivamente atacar jornalistas quando estavam a entrevistar o Venâncio Mondlane. Este é um regime que já está a denunciar que não tem mais nada a dar ao povo, que é um regime que já está se a manter pelos meios autoritários e repressivos. Portanto, é um regime que, democraticamente falando, pode-se dizer não ter mais rosto para sair em público.
Chegam-nos imagens e informações de que a capital, Maputo, vive nos últimos dias sob um forte dispositivo policial nas ruas. A Comissão Nacional Eleitoral disse, ontem, que vai declarar os resultados oficiais amanhã, quinta-feira, no dia em que o candidato do Podemos apelou a uma paralisação total no país para amanhã e sexta-feira. Venâncio Mondlane apela a um roteiro revolucionário. A seu ver, existe um receio quanto a um escalar de violência em Moçambique?
As condições todas estão lá para isso. A repressão a que já me referi, as armas que são para...
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Cimeira dos BRICS reúne líderes mundiais à volta de Putin
10/22/2024
A cimeira dos BRICS arrancou esta terça-feira, 22 de Outubro, em Kazan, na Rússia. Vladimir Putin procura reforçar alianças estratégicas e mostrar o suposto fracasso das sanções ocidentais decorrentes do conflito na Ucrânia. Pela primeira vez, a cimeira conta com a presença de novos membros: Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egipto, Irão e Etiópia. "Estados que têm divergências profundas entre si", sublinha o investigador do Instituto Português de Relações Internacionais, Carlos Gaspar.
RFI: Esta é uma cimeira marcada pela ausência de Lula da Silva, que tem tido um papel dúbio, sobretudo quanto à guerra na Ucrânia. Vladimir Putin não esteve presente na cimeira na África do Sul o ano passado por causa de um mandato de captura internacional, e conseguiu fazer com que esta cimeira decorresse este ano na Rússia. O que é que se pode esperar desta cimeira?
Carlos Gaspar: O essencial da cimeira é a Rússia poder demonstrar que consegue reunir à volta do Presidente Putin um número importante de dirigentes. Em primeiro lugar, obviamente, o seu principal parceiro, o secretário-geral do Partido Comunista da China, que está presente, mas também o primeiro-ministro indiano Modi, está em Kazan, tal como está o novo Presidente do Irão, o Presidente da África do Sul e Lula está ausente, aparentemente por razões médicas.
O Secretário-Geral das Nações Unidas pela primeira vez, foi convidado e é esperado pelo menos, a agência russa indica que está marcada uma reunião entre ele e o Presidente Putin para tratar dos vários conflitos internacionais e a sua presença, obviamente, seria importante nesta cimeira, que é a primeira cimeira dos BRICS alargados. Os BRICS foram constituídos em 2006, por iniciativa da Rússia e da China, com a Índia e o Brasil. Depois, a África do Sul juntou-se ao grupo cinco anos depois, mas em Janeiro deste ano houve um primeiro grande alargamento a outros Estados relevantes do Médio Oriente, da África e da América Latina. O alargamento inicial previa a participação da Argentina, que, entretanto, depois das eleições, desistiu de pertencer aos BRICS. A Arábia Saudita, que ainda não ratificou a sua participação dos BRICS, mas também a Etiópia, o Egipto, o Irão e os Emirados Árabes Unidos. Ainda não é claro a que nível é que estes novos países se vão representar, excepto no caso do Irão, que envia o seu novo Presidente. A Etiópia e o Egipto, estão à beira de um conflito por causa da nova barragem que a Etiópia está a fazer e que vai condicionar os fluxos do rio Nilo e também por causa das suas divergências no Sudão.
Esta cimeira é uma cimeira que reúne uma série de Estados que têm divergências muito profundas entre si. Desde logo, a China e a Índia também são um caso evidente e o Irão e a Arábia Saudita são outro. Nesse sentido, é uma colecção de estados sui generis que aceitam estar numa cimeira e mesmo numa organização comandada pelas principais potências revisionistas: a China e a Rússia, mas mantém a sua liberdade e a sua autonomia em todas as dimensões relevantes da política internacional e têm conflitos importantes entre si, sendo que os BRICS não contribuem ou até agora não contribuíram, tal como a Organização de Cooperação de Xangai também não contribuiu, para resolver os conflitos graves que opõem os seus membros entre si.
Como é que esta adesão de novos membros influência a dinâmica de poder entre os blocos ocidentais e oriental? E que implicações é que tem esta expansão no equilíbrio do poder global? Que impacto é que, portanto, pode ter nas relações destes países com os Estados Unidos e com a Europa?
Em princípio, não tem nenhum impacto relevante. Os BRICS não formam um bloco. São uma colecção heterogénea de Estados, onde há um centro forte composto pela coligação entre a Rússia, a China e o Irão. Mas os outros Estados; a África do Sul, o Brasil e a Índia são potências intermédias que, de certa maneira, procuram uma equidistância entre as potências revisionistas, a China e a Rússia e os Estados Unidos,...
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"A Frelimo tem que perceber uma coisa: a população hoje não está com a Frelimo"
10/21/2024
Centenas de pessoas saíram esta manhã para as ruas em Maputo, mas também noutros pontos do país, em resposta ao apelo à greve e à manifestação lançado para esta segunda-feira pelo candidato presidencial Venâncio Mondlane, que reclama a vitória nas eleições de 9 de Outubro e pretende igualmente protestar contra o assassínio, no fim-de-semana, do seu advogado, Elvino Dias, e do seu mandatário político, Paulo Guamba.
Ao longo destas últimas horas circularam inúmeras informações sobre situações de extrema tensão em Maputo, mas igualmente noutras partes do país, como por exemplo Pemba, com actos de vandalismo por parte de alguns manifestantes, confrontos, a utilização de gás lacrimogéneo e também tiros para o ar por parte das forças da ordem.
Uma situação que acontece numa altura em que ainda se está em período eleitoral, dado que a CNE deve apresentar até quinta-feira os resultados definitivos das eleições gerais. Segundo dados preliminares, a Frelimo no poder saiu vitoriosa deste escrutínio, mas a oposição rejeita estes resultados alegando fraudes massivas.
É este cenário que analisámos com João Feijó, investigador do Observatório do Meio Rural, que começa por abordar o duplo assassínio na sexta-feira à noite de Elvino Dias e Paulo Guamba. Acontecimentos que, segundo o estudioso, vêm na linha de outras mortes violentas ocorridas em plena luz do dia nestes últimos anos em Moçambique.
RFI: O duplo assassínio do fim-de-semana aconteceu num contexto político já tenso. Qual era o objectivo a seu ver?
João Feijó: Isto é algo aqui que infelizmente, se tornou uma realidade deste último mandato. Esta governação que acontece em Moçambique desde 2014, ficou célebre por diversos assassinatos de indivíduos que faziam a luta política de forma institucional. Logo em 2015, houve o assassinato de Gilles Cistac, que era um constitucionalista, um conhecido professor universitário catedrático da Universidade Eduardo Mondlane, que defendia a existência de espaço na Constituição de Moçambique para a descentralização, que era a reivindicação de Afonso Dhlakama (líder histórico da Renamo). Portanto, ele encontrou na Constituição um espaço que permitia o diálogo. Foi assassinado por causa dessas declarações por esquadrões da morte, por indivíduos que até hoje não estão identificados. E o assassinato foi em plena luz do dia, no centro da cidade, numa zona com câmaras. Portanto, é impossível que não se pudesse investigar. Depois, em 2019, assassinaram Anastácio Matavel, que era um indivíduo que tinha pertencido ao Comité Central da Frelimo, mas que estava agora numa organização da sociedade civil a organizar a observação eleitoral independente na província de Gaza e onde tinha já uma máquina que iria de alguma forma incomodar e perturbar o plano de fraude que existia em Gaza. E agora há este assassinato. Isto aqui foi o 'modus operandi' destes dois últimos mandatos deste Presidente. São factos e que demonstram a dificuldade deste Governo conviver com outras alternativas, outras visões e outras interpretações jurídicas. Ilustra o 'modus operandi' que era de agir de uma forma violenta para com aqueles que faziam oposição jurídica. Portanto, não era oposição nas matas, era oposição jurídica. Tudo isto aqui foi um ataque ao Estado de Direito, um ataque à democracia, um ataque aos direitos constitucionais das pessoas. Então, a leitura que os dados nos dão é que estes assassinatos traduzem uma visão de Estado bastante totalitária, bastante intolerante, onde a vontade de uma minoria deve prevalecer sobre uma vontade de uma maioria. Agora, o próximo Presidente vai ter o desafio de se afastar desta linha e de construir um país mais inclusivo, mais respeitador do Estado de direito e da democracia. É isto que está aqui em causa agora, dentro da Frelimo: o próximo Presidente criar a sua linha de governação que seja diferente desta. Não sei se ele vai ter espaço, se ele vai ter força porque vai enfrentar agora aquelas forças conservadoras retrógradas do anterior...
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Capitão Fausto em Paris para abrir novos caminhos
10/18/2024
O vocalista e guitarrista Capitão Fausto, Tomás Wallenstein, está em Paris a participar no MaMA Music & Convention para ouvir e conhecer novos artistas, mas também para representar a banda e apresentar o projecto a futuros parceiros. Tomás Wallenstein explica, ainda, que a internacionalização surge após anos de consolidação em Portugal e está convencido de que conhecer outros artistas e novos públicos pode enriquecer o processo criativo.
RFI: Como é que está a ser a experiência de participar no festival MaMA Music & Convention, não só no lado dos artistas, mas no lado do público?
Tomás Wallenstein: Em primeiro lugar, Paris está a tratar-me muito bem. Cheguei ontem, tem valido muito a pena estar aqui e não é uma coisa rara para mim e para os Capitão Fausto, em geral, estarmos do lado do público, estarmos do lado de quem vai ver e ouvir música. E a principal razão pela qual eu vim ao Mama este ano foi para isso: para ouvir, para ver o que é que está a acontecer e para conhecer artistas e conhecer um bocadinho mais por dentro o tecido da música aqui da cena musical francesa. Está a ser muito interessante. Ontem, vi concertos muito interessantes, vi salas e está a ser interessante conhecer as salas e ir aprofundando o meu conhecimento. Vamos fazendo amigos e portanto está a ser uma boa experiência até agora.
Está do lado do público e, inevitavelmente, está a representar o grupo Capitão Fausto. E é também esse espaço que vai ocupar nestes próximos dias que é fazer contactos?
É evidente que temos alguns planos para o próximo ano e que envolvem a cidade de Paris e, portanto, faz todo o sentido vir conhecer pessoas e apresentar o nosso projecto e os nossos planos e ficar com parceiros que possam fazer este caminho connosco, que de certeza que vai correr muito bem. Até agora as pessoas várias que conhecemos ficamos muito impressionados e acho que estamos com boas perspectivas.
Os Capitão Fausto preservam e reinventam a música portuguesa mantém o idioma como parte central das canções, abordam questões sociais, pessoais, sempre em diálogo com a realidade portuguesa. Vocês têm mostrado que é possível criar música original, autêntica na língua portuguesa e parece ser fácil de quem vê de fora na forma como o fazem. Como é que os Capitão Fausto são vistos fora de Portugal e conseguem ter essa perceção da vossa música no exterior?
Isso é a pergunta que nós também estamos a começar a fazer nós próprios. Mas eu acredito que a linguagem é cada vez menos uma barreira. Acho que nós estamos cada vez mais habituados a ver cinema, a ver televisão, a ver coisas no telemóvel legendadas na sua língua original, o cinema falado nas línguas mais dos sítios dos países de onde vêm com maior exposição é a música também. Existe um lugar que é o lugar que nós também queremos procurar, em que as coisas existem, como elas nasceram no sítio e que se junta no mesmo palco, no mesmo festival, num mesmo circuito. Vários interlocutores a falar da maneira que sabem melhor. E é essa a principal razão pela qual eu escrevo em português. E nós e nós fazemos as canções que fazemos por ser, evidentemente, a maneira de comunicar mais prática.
A língua portuguesa não é o entrave neste caso e até pode ser uma descoberta de novas sonoridades para um público francês, por exemplo?
Eu acredito que sim. Se eu tivesse só a fazer literatura também existe maneiras da literatura atravessar fronteiras através da tradução e por aí fora. E a música é uma linguagem universal e eu acredito que os Capitão Fausto conseguem mostrar-se num concerto e extravasar o primeiro confronto com uma língua que não se percebe imediatamente. Acho que depois acrescenta camadas à experiência musical e isso tem me acontecido muito com música italiana que vou ouvindo e sueca e é holandesa e francesa - que eu percebo muito bem - mas de outras línguas que não percebo e só à quinta ou sexta escuta é que eu vou retirando cada vez mais camadas e vou descobrir a letra, ao ir ver traduções e perceber o que é...
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SaLiVa o novo album dos Ayom
10/18/2024
O grupo musical Ayom esteve em Paris a promover o novo trabalho intitulado Sa.Li.Va. Em entrevista à RFI, quatro dos seis elementos do grupo, falaram das linhas gerais deste novo trabalho, dividido em três capítulos distintos - “SA-grado”, “LI-berdade” e “VA-lentia”. O disco conta ainda com a participação de Juliana Linhares, Paulo Flores e Salvador Sobral.
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“Empreender com Orgulho” quer mudar mentes através de empreendedorismo LGBTQIA+
10/16/2024
O antropólogo moçambicano Anésio Manhiça está a desenvolver um projecto chamado “Empreender com Orgulho”. Trata-se de uma iniciativa que promove o empoderamento económico de jovens LGBTQIA+ em Moçambique, no intuito de criar abordagens mais inclusivas nos negócios e “ajudar a mudar mentes”. Depois de ter realizado a 1ª Conferência do Empoderamento Económico LGBTQIA+, a iniciativa vai promover, em Novembro, a 1ª competição de ideias de negócios inclusivos.
RFI: O que é este projecto “Empreender com Orgulho”?
Anésio Manhiça, Coordenador do Projecto “Empreender com Orgulho”: “Empreender com orgulho” é um consórcio constituído por três organizações moçambicanas: INCLUSÃO, KUTCHINDJA e a Associação do Sistema de Monitoria Orientada para Gestão que decidiram juntar-se para promover o empoderamento económico de jovens LGBT, mas também influenciar para que haja espaços profissionais que respeitem as diferenças baseadas na identidade de género, assim como na orientação sexual.
Há quanto tempo é que começou o projecto e qual é o conceito?
Este projecto começou em Março através do apoio da Other Foundation, que é uma fundação baseada na África do Sul e que tem apoiado diferentes movimentos ao nível da região Austral. Com este projecto, o que nós queríamos é tentar alterar ou mostrar ao nível de Moçambique que existem outros campos ou outras formas de desenvolvimento e transformação e apoio à mudança social para pessoas LGBT, que não sejam questões ligadas ao HIV, à prostituição, à doença. Então, é mais sobre economia porque nós acreditamos que um apoio baseado na economia pode, de alguma forma, reforçar as outras abordagens de apoio às pessoas LGBT e pensamos que também esta é uma metodologia que pode ajudar a mudar mentes, a mudar a forma como as pessoas olham para pessoas LGBT.
Qual é a forma como as pessoas olham?
O que nós temos visto é que, de alguma forma, uma ênfase em abordagens de saúde, de HIV reforça uma narrativa e um imaginário da pessoa LGBT como alguém que é do risco, como alguém que é da doença, tudo do lado negativo. Este é um imaginário já muito antigo, associado às pessoas LGBT. Então, pensámos que apoiando as pessoas a terem negócios, a terem negócios estáveis, empregos dignos, outras pessoas vão olhar para estas pessoas LGBT como pessoas normais que contribuem para a economia, pessoas que contribuem no sector criativo, no sector de hotelaria. A ideia é pensarmos do económico como essa abordagem que vai ajudar nesta mudança social de forma bem mais abrangente.
O que é que têm feito até agora concretamente? E o que é que vão fazer?
Agora, nós desenvolvemos uma pesquisa para compreender quais são as barreiras económicas que as pessoas LGBT têm na área metropolitana de Maputo e que prácticas económicas têm. Fizemos uma pesquisa, que era qualitativa e quantitativa, em que acabámos concluindo que a maior parte das pessoas LGBT acaba desenvolvendo actividades como intermediários, que em Maputo chama-se “nhonguistas” que é uma forma de estar na práctica económica, mesmo sem ter um produto, mesmo sem ter um recurso para adquirir um produto e comercializar, então ficam sempre entre quem produz e quem comercializa.
Então, muitos são “nhonguistas”, que são intermediários, e outros acabam sendo criativos, ficam neste espaço criativo porque é um espaço socialmente construído como um espaço para a pessoa LGBT, mas também é o espaço onde se sentem com maior liberdade de expressar a sua identidade e orientação sexual porque já assim é percebido. É um espaço que já foi conquistado ao longo do tempo.
Também fizemos a primeira Conferência do Empoderamento Económico em Moçambique, que foi um grande marco até a nível da região Austral, onde juntámos empreendedores moçambicanos, brasileiros e sul-africanos. Vamos fazer anualmente esta grande conferência para criar esta sinergia.
Agora, no mês de Novembro, vamos fazer a primeira competição de ideias de negócios inclusivos, em que a ideia é colocarmos pessoas LGBT e não LGBT a...
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Bruno Fernandes: "Sinto mesmo o apoio de Cabo Verde"
10/16/2024
O pugilista Bruno Fernandes nasceu em Portugal, cresceu em França e representa Cabo Verde. Falhou por pouco o apuramento para os Jogos Olímpicos de 2024, mas tem esperança de uma qualificação para Los Angeles 2028 agora que conta com o apoio do Comité Olímpico de Cabo Verde nesta disciplina que este ano deu ao país a primeira medalha olímpica da sua história.
Bruno Fernandes cresceu nos arredores de Paris e por ser "um rapazinho um bocadinho agitado" começou cedo a praticar o boxe, disciplina que o seu irmão mais velho já praticava, acabando por desenvolver uma carreira profissional. Após vários anos de combates amadores, em 2023 foi identificado pelo Comité Olímpico de Cabo Verde após um terceiro lugar numa competição internacional, começando aí a sua relação com a equipa olímpica cabo-verdiana.
Este foi um apoio que mudou a trajectória deste atleta luso-cabo-verdiano.
"Tive apoio da parte de pessoas que não conhecia mesmo e que hoje em dia sem eles é difícil seria difícil continuar, porque já hoje estou a sentir mesmo o apoio que Cabo Verde com o Comité Olímpico atrás de mim. Então é uma força a mais que antigamente eu não tinha força", descreveu Bruno Fernandes em entrevista à RFI.
Mesmo fazendo já uma carreira profissional no boxe e tendo uma rotina de treino intensa, Bruno Fernandes mantém um outro trabalho que lhe permite manter-se financeiramente. No início de 2024, Bruno Fernandes abriu mesmo uma recolha de fundos para ajudar a custear as despesas ligadas à sua participação em torneios internacionais, tendo tido um retorno da diáspora cabo-verdiana e de franceses que o surpreendeu.
"Para mim foi um bocadinho estranho pedir ajuda às pessoas porque eu sou uma pessoa que gosta de fazer as coisas por mim mesmo. Não gosto de pedir ajudas porque eu penso que as pessoas também têm os seus próprios problemas, então acho que as pessoas não vão me ajudar, mas estava totalmente errado porque eu pedi uma ajuda e tantas pessoas me deram um apoio. Nunca imaginei isso. Então, isso é uma força, mas também que me dá determinação para ir mais para frente", indicou.
Tendo falhado por pouco o apuramento para os Jogos Olímpicos de Paris 2024, Bruno Fernandes, que se situa na categoria dos 71 quilos, prepara-se agora para Los Angeles 2028 e mesmo se há quem diga que o boxe pode não vir a ser modalidade olímpica daqui a quatro anos, este atleta não acredita nessa possibilidade.
"É verdade há uma polémica e que estão a dizer que se calhar já não vai haver boxe nos Jogos Olímpicos de 2028. Mas eu não acho. Porquê? Porque vai ser nos Estados Unidos e é o país onde há mais atletas de boxe e não acho mesmo que isso vai ser possível. Mas tudo é possível no mundo. Eu acredito que o boxe vai estar ainda nos jogos de 2028 e que vamos ainda ter mais espectáculo", concluiu.
Bruno Fernandes já tem agendado o seu próximo combate, no fim de mês de Novembro, em Villepinte, nos arredores de Paris.
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“O presidencialismo é uma solução para São Tomé e Príncipe”
10/15/2024
O antigo Presidente de São Tomé e Príncipe, Fradique de Menezes, defende que o presidencialismo é uma solução para o país. A questão foi recentemente colocado pelo primeiro-ministro, Patrice Trovoada, admitindo propor a mudança para um regime presidencialista antes das eleições gerais de 2026. Fradique de Menezes considera que o presidencialismo pode clarificar alguns conflitos, quando a instabilidade política e a elevada dívida externa continuam a adiar o desenvolvimento do país.
RFI: O senhor mostra-se preocupado com aquilo que considera ser a " dívida externa terrível" de São Tomé e Príncipe e diz que o país, após a independência, não soube fazer as escolhas certas. O que o leva a fazer estas afirmações?
Fradique de Menezes, ex-chefe de Estado de São Tomé e Príncipe: Os países que tinham meios para sobreviverem tiveram a sua independência e conseguiram singrar . São Tomé e Príncipe quis fazer o mesmo, mas não nos preocupamos muito com o sector económico para a sustentabilidade da soberania, da independência do país.
Quando assumi [o cargo de chefe de Estado], em 2001, o país já tinha uma dívida de quase 400 milhões. Negociamos essa dívida e conseguimos o perdão. Hoje, estamos outra vez mergulhados numa dívida que ronda os 400 milhões de dólares.
Mas como é que se explica esse endividamento?
O país não produz, não exporta, não tem os mecanismos para procurar meios financeiros adequados. Não soubemos desenvolver outros sectores que nos pudessem ajudar economicamente.
Mas refere-se a que sectores?
Poderíamos tentar -como falamos tanto sobre as possibilidades deste país- transformar São Tomé e Príncipe num "Hub" para acolher os grupos económicos. Grupos esses que pudessem implemetar uma série de políticas destinadas ao comércio aqui da zona geográfica onde nos encontramos. Esta é uma das possibilidades de um país insular como o nosso, porque o consumo interno é muito fraco.
Mesmo se tivéssemos um poder de compra elevado, não seria suficiente para poder fazer funcionar as indústrias locais. Porém não nos preocupamos muito com isso e nem fizemos os devidos investimentos no sector agrícola, nas chamadas roças.
O país continua a comprar comida, a comprar medicamentos...
Compramos quase tudo. Produzimos, evidentemente, aqueles produtos agrícolas tradicionais como a banana, a fruta-pão, a mandioca e o milho. Mas muito pouco, até porque muitas vezes não encontramos esses produtos no mercado.
Isto tudo faz com que hoje, com uma população que não cessa de crescer, uma juventude ávida em ter acesso à educação - como é normal- não consegue ter bolsas de estudo. Ainda continuamos a receber uma ou outra bolsa de estudos, em alguns países, mas tem sido muito difícil.
Faltam medicamentos no mercado, peças para fazerem funcionar o aparelho produtivo. Hoje podemos dizer que não adoptamos uma política económica ao mesmo nível da política social e política de discussão [diplomacia]. Porque aí somos bons.
Desde a entrada em funções, em Dezembro de 2022, que o Governo são-tomense tem estado a negociar um programa de crédito alargado com o Fundo Monetário Internacional- FMI- num entendimento difícil. Em Setembro, o primeiro-ministro Patrice Trovoada disse que esperava que as negociações evoluíssem. O que espera destas negociações?
Segundo as informações que o senhor primeiro-ministro nos trouxe, no seu regresso há dias ao país, parece que as negociações estão a seguir bem e que há uma solução para a assinatura de um acordo. É evidente que esse acordo é importante para São Tomé e Príncipe, um acordo para continuar a ter acesso ao mercado financeiro e para que os possíveis investidores possam continuar a vir ao país.
Defende ser necessário um apoio das Nações Unidas para a definição de um programa para transformar o país. Que programa seria esse? Um programa que acabasse com a dependência do país?
Exactamente. Penso na ilha das Seicheles, um pequeno Estado, em termos de tamanho São Tomé e Príncipe vem logo a seguir. As coisas que eles...
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Museu Mafalala: o guardião da história do mais icónico bairro de Moçambique
10/14/2024
O Bairro da Mafalala é uma zona histórica, berço de resistências políticas e culturais. Daqui saíram os antigos presidentes moçambicanos Samora Machel e Joaquim Chissano, o futebolista Eusébio, os escritores José Craveirinha e Noémia de Sousa, e tantas outras personalidades, algumas das quais retratadas em murais pelo bairro. Em 2019, nasceu o Museu Mafalala que tem promovido actividades para continuar a dinamizar a história deste bairro. Fomos à descoberta deste “caldeirão cultural” com Ivan Laranjeira, o director do museu.
Bem-vindos ao Museu Mafalala, no coração de Maputo. Um labirinto vibrante de vozes, pessoas e cores que sobressaem das ruelas e becos, barracas e bancas, casas precárias com chapas de zinco e alguns murais a homenagear personalidades locais.
Estamos no Bairro da Mafalala, uma zona histórica que foi e é berço de resistências políticas e culturais. Daqui saíram os antigos presidentes moçambicanos Samora Machel e Joaquim Chissano, o futebolista Eusébio, os escritores José Craveirinha e Noémia de Sousa, mas ainda hoje continua a ser um caldeirão cultural que cozinha páginas de história. Para as concentrar, nasceu, em 2019, o Museu Mafalala, dirigido por Ivan Laranjeira, um filho do bairro, que nos levou por caminhos inesperados até aos murais que homenageiam esta história e tiveram curadoria do museu.
São cerca de 20 mil pessoas de diferentes etnias e religiões que aqui vivem, uma síntese de migrações mas também do segregacionismo colonial português. O bairro ainda é associado a pobreza e a consumo de drogas entre a juventude, mas é muito mais do que isso. E basta serpentear as ruelas para o perceber.
Ivan Laranjeira resume que o bairro é que é o museu e o museu que ele dirige é simplesmente o guardião da memória que acolhe exposições, actividades culturais e uma biblioteca. É neste edifício que conversúmos sobre a importância da Mafalala para o país.
RFI: O que é o Museu Mafalala?
Ivan Laranjeira, Director do Museu Mafalala: O Museu Mafalala é um centro de interpretação, é um lugar onde as pessoas podem interagir com a história do bairro da Mafalala e podem, sobretudo, ter um contacto nas várias épocas em que o bairro e a cidade foram evoluindo. Ter uma noção mais concreta daquilo que é a história da Mafalala e das pessoas e das personalidades que daqui saíram.
Quais foram essas personalidades que daqui saíram? Há muitas importantes para a história de Moçambique e algumas estão representadas em murais aqui no bairro...
A Mafalala é orgulhosa em dizer que produziu dois presidentes de Moçambique, Samora Machel e Joaquim Chissano, um primeiro-ministro Pascoal Mucumbi, o maior jogador de futebol de todos os tempos, Eusébio da Silva Ferreira, os maiores músicos e poetas de Moçambique, casos de Fany Mpfumo, de José Craveirinha, Noémia de Sousa, Rui de Noronha e o toureiro Ricardo Chibanga. Todos da Mafalala para mencionar alguns porque é uma lista interminável e até hoje o bairro continua a produzir grandes personalidades do país, gente que cria tendência e que ajuda a criar este orgulho da moçambicanidade.
Como é que se explica que haja esta efervescência que faz com que daqui saiam estas personalidades que vão marcar a história de Moçambique?
Penso que tem muito a ver com a característica do próprio bairro. É um autêntico caldeirão cultural. Temos aqui gente de toda a parte de Moçambique, da região austral, da costa suaíli, pessoal de Zanzibar, das Comores. Isto contribui imenso para a forma de ser, de estar do bairro da Mafalala e para a capacidade inventiva e criativa dos que aqui vivem. Tudo isto foi sempre assim ao longo dos anos e dos tempos e continua a ser sempre uma referência, a Mafalala, por ser também o único bairro na periferia que dialoga com o centro e com o resto. Portanto, a sua localização também é estratégica e faz com que toda a gente queira cá estar. Isto contribui para a miscigenação e dessa miscigenação cria-se este sentido de nação e criam-se também grandes homens.
Esses grandes...
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