Report about Brazil and Latin America
RFI
Reportagens de nossos correspondentes na região sobre fatos políticos, sociais, econômicos, científicos ou culturais, ligados à realidade local ou às relações dos países com o Brasil.
Episodes
Clube de Mulheres de Negócios em Língua Portuguesa inaugura núcleo na Cidade do México.
8/13/2023
O projeto, fundado em março de 2020, em Portugal, para promover o intercâmbio empresarial entre mulheres empreendedoras e profissionais autônomas que falam português, já está presente em quatro continentes.
Larissa Werneck, correspondente da RFI no México
Criado pela brasileira Rijarda Aristóteles, que mora em Portugal desde 2014, o Clube de Mulheres de Negócios em Língua Portuguesa começou reunindo executivas e estudantes universitárias que falam português em encontros presenciais, em Lisboa, para aumentar suas possibilidades de venda de produtos e serviços para promover a liberdade financeira, principalmente entre as estrangeiras que moravam no país. No entanto, com a pandemia da Covid-19, assim como a vida de todas as mulheres, o clube também ganhou um novo significado.
“Unir mulheres empresárias, empreendedoras e profissionais liberais em torno de uma rede de network que pudesse conectar mulheres de várias partes do mundo unidas pela língua portuguesa. E por que a língua portuguesa? Porque além de ser uma das línguas mais lindas de todos os tempos e além dela ser a quarta, quinta, mas falada no mundo, ela traz possibilidades de criatividade e inovação ao Brasil.”, explica a fundadora Rijarda Aristóteles.
No mesmo ano, Rijarda deixou a carreira acadêmica para realizar o seu propósito.
“Resolvi investir e focar em algo que começou a fazer muito sentido, que foi exatamente criar uma plataforma de network com foco em resultados positivos, ou seja, o nosso negócio é um dos primeiros aqui em Portugal que tem na sua constituição ser um negócio de impacto social positivo. Então eu criei essa plataforma, comecei a conversar com algumas amigas, porque a gente tem que lançar mão de amigas no primeiro momento, e aí tive a minha primeira embaixadora no Brasil e a segunda aqui em Portugal. E aí nós começamos a construir esse movimento.”, diz ela.
Após três anos de fundação, os resultados são muito positivos. Atualmente, são duzentas e quarenta embaixadoras, presentes em doze países, além de mais de quatrocentas empreendedoras que passaram pelo Programa Empreender Feminino, que promove formação teórica e prática, de maneira virtual, em aulas ao vivo e acesso a conteúdos gravados. Além disso, com o fim da pandemia, os ambientes de negócio e de capacitação proporcionados pelo clube já voltaram a ser, também, presenciais. Este ano, mais de 500 mulheres, de diferentes nacionalidades que falam português, se reuniram durante dois dias na cidade de Fortaleza, no Ceará, durante a segunda edição do Conecte-se, um evento de capacitação e networking que contou também com uma feira de produtos e serviços.
Português como língua franca
Nesta semana, o Clube de Mulheres de Negócios em Língua Portuguesa ganhou mais um núcleo na América Latina: o México. A primeira reunião foi realizada na última quinta-feira, na Cidade do México. Segundo a embaixadora do grupo no país, Lilia Lustosa, um dos objetivos do núcleo mexicano é ampliar a presença do clube em outras cidades para que as empresárias possam, além de gerar negócios dentro México, expandir para outros continentes.
“Não precisa ser brasileira, nem portuguesa, nem moçambicana, mas precisa falar português, pode ser mexicana falando português, pode ser de qualquer nacionalidade. Então se você quer fazer negócio com Portugal, você não precisa ir para Portugal abrir uma empresa, você vai arrumar um colaborador, uma parceira, você vai fazer um contrato com ela ou um acordo que seja. Mas você não precisa estar lá e você vai conseguir vender seu produto em Portugal ou onde quer que seja, porque o clube já está em doze países, então de cara já são doze países onde você pode fazer negócio, além do México”, explica Lilia.
O Clube de Mulheres de Negócios em Língua Portuguesa permite a participação de todas as mulheres que tenham negócios juridicamente constituídos ou em vias de constituição.
Maria Teresa Dória, que trabalha há 25 anos como estrategista de expansão de mulheres empreendedoras,...
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Embaixada do Brasil no México inaugura o Instituto Guimarães Rosa
7/16/2023
Atualmente, existem 24 unidades do Instituto Guimarães Rosa no exterior, sendo 13 na América Latina e no Caribe, seis na África, três na Europa e duas no Oriente Médio. A nova unidade faz parte de um projeto do Itamaraty de unificação dos centros culturais do Brasil, que tem o objetivo de integrar a política cultural brasileira, estimular o intercâmbio e ampliar a difusão da língua portuguesa na sua variante brasileira.
Larissa Werneck, correspondente da RFI na Cidade do México
João Guimarães Rosa foi médico, escritor e diplomata. Reconhecido como um dos principais nomes da literatura brasileira por sua narrativa e linguagem inovadoras, é autor de grandes obras como "Grande Sertão: Veredas".
O escritor, que neste ano completaria 115 anos de nascimento, foi o escolhido pelo Itamaraty, em 2021, para dar nome ao então Departamento de Cultura, em Brasília. A partir dessa mudança, todos os centros culturais que o Itamaraty têm ao redor do mundo passaram a se chamar Instituto Guimarães Rosa.
Gustavo Raposo, chefe do setor educacional da Embaixada do Brasil no México, explica que a mudança consolida o entendimento que o Itamaraty tem sobre a importância da língua portuguesa para a integração latino-americana.
“Essa unificação ocorre em torno de Guimarães Rosa que, além de escritor, teve um papel importantíssimo na Segunda Guerra Mundial, quando atuava no Consulado em Hamburgo, salvando muitas vidas. Então, é a partir desse personagem tão rico que queremos unificar nossa proposta de estimular o conhecimento da língua portuguesa. De Brasília são enviadas as diretrizes para essa rede de institutos, e aqui no México a gente parte de uma experiência bem-sucedida de outros países para, justamente, dar mais força para a promoção da cultura brasileira no exterior, principalmente o idioma”, diz Gustavo.
Além de aulas de português na sede, que fica no bairro de Polanco, na Cidade do México, o Instituto Guimarães Rosa realiza exames de proficiência da língua portuguesa, além de projetos para estimular o conhecimento sobre o idioma.
“Nós temos oito cátedras em universidades mexicanas e estamos trabalhando para criar uma rede e ampliar o número de cátedras. Dessa maneira, crescem as sinergias e a colaboração. A ideia é criar uma plataforma onde as pessoas possam ter acesso à programação dessas cátedras e que elas possam também contar com a coordenação da Embaixada. Também vamos retomar o BraMex, um programa de intercâmbio para alunos de graduação. A gente acredita firmemente nos laços humanos, além do laço acadêmico, que se cria com o intercâmbio. E essa é uma parte muito importante da relação bilateral”, acrescenta o chefe do setor educacional.
Promoção cultural
Além de impulsionar o ensino da língua portuguesa e de ser um centro de estudos do idioma, o Instituto Guimarães Rosa tem o objetivo de promover a cultura nacional. A partir de agora, todas as atividades apoiadas pelas embaixadas brasileiras levarão o selo do Instituto. De acordo com Rodrigo Almeida, conselheiro e chefe do setor cultural da Embaixada do Brasil no México, ambos países passam por um momento importante de retomada de vínculos e de projetos bilaterais em diferentes áreas.
Em abril, o então Secretário de Relações Exteriores do México, Marcelo Ebrard, e o Ministro de Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, se encontraram na Reunião da Comissão Binacional México-Brasil, na Cidade do México. A partir desse encontro foi produzido um comunicado conjunto sobre projetos que devem ser realizados em parceria.
“Mais de um terço desse documento diz respeito a atividades culturais, o que dá uma dimensão da importância que esse setor tem para os dois países. A principal novidade é a criação do Ano Dual, que significa que será um ano do Brasil no México e, ao mesmo tempo, um ano do México no Brasil, em função dos 190 anos de estabelecimento de relações diplomáticas", explica.
"As comemorações já começam nesse segundo semestre e vão até o ano 2024. É um momento de muita...
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“Páginas Verde e Amarelas”: conheça o guia de empreendedores brasileiros em Madri
5/7/2023
Se um brasileiro chega a Madri, seja para passar uma longa temporada ou para viver por tempo indefinido, é bem provável que, cedo ou tarde, ele comece a sentir falta de coisas que só tinha no Brasil. Pensando nesse público que carrega a saudade de casa, a associação sem fins lucrativos Mulheres do Brasil – Núcleo Madrid lançou o guia “Páginas Verde e Amarelas”, em parceria com o Consulado-Geral do Brasil.
Ana Beatriz Farias, correspondente da RFI em Madri
O catálogo tem o intuito de fortalecer a rede de brasileiros que vendem produtos ou ofertam serviços na capital espanhola. Por isso, é possível encontrar na lista os contatos de empreendedores de diversas áreas, desde fornecedores de doces e salgados brasileiros até autores de obras de arte, revendedores de acessórios, ligerie e óleos essenciais. Estão incluídos serviços, como tratamentos de saúde ou estética, consultoria jurídica, atividades domésticas e música ao vivo, entre outras ofertas.
“É um grande apoio, principalmente para esses núcleos que estão fora do Brasil”, diz Andréa Canone, uma das líderes do núcleo madrilenho do grupo Mulheres do Brasil. “No nosso país, a gente já sabe mais ou menos onde tem que comprar isso, onde tem que comprar aquilo. Quando você chega num país novo, fica super perdido no começo. Você não vai comprar o polvilho em qualquer lugar ou, sei lá, o feijão, que você gosta, é diferente aqui”, explica Andréa.
Na apresentação do “Páginas Verde e Amarelas”, agora disponível na internet, já está o aviso: brasileiros que estiverem interessados em anunciar produtos ou serviços no catálogo podem fazê-lo de forma gratuita. Basta se inscrever. A ideia é que cada vez mais pessoas possam ter uma boa experiência.
No final de 2021, Larissa Alff abriu, em Madri, uma empresa de marketing com outra brasileira, Elisa Portugal. Estar em contato com membros da associação Mulheres do Brasil fez toda a diferença naquele momento.
“Quando a gente abriu a empresa, as meninas do grupo Mulheres do Brasil e do “Páginas Verde e Amarelas” já começaram a perguntar sobre o nosso trabalho. O que eu acho legal desse grupo é que quando alguém precisa de alguma coisa vai primeiro procurar ali”, conta Larissa.
A empreendedora diz que, antes mesmo de criar o nome da sua empresa, já surgiu uma demanda por parte da rede brasileira. “Porque uma quer apoiar a outra, a gente quer se valorizar. Então, se a gente precisa de um pão de queijo ou de um bolo de aniversário, a gente vai no “Páginas Verde e Amarelas”, vê no grupo quem é que tem aquele serviço ou produto, para só depois procurar fora”, disse Larissa à RFI.
O projeto do catálago nasceu de um grupo criado no WhatsApp pelo núcleo de Madri da associação Mulheres do Brasil, que já reunia tanto empreendedores brasileiros que vivem em solo madrilenho quanto aqueles que sentem falta dos produtos da terrinha e queriam saber de quem comprar. Com o tempo, os laços vêm sendo fortalecidos e novos contatos profissionais são feitos dia a dia.
Segundo Andréa Canone, quando a ideia de conectar empreendedores brasileiros surgiu, as voluntárias do Mulheres do Brasil começaram a telefonar para possíveis interessados incentivando a participação no projeto. Rapidamente, formou-se uma lista de 100 pessoas. A partir de então, as organizadoras decidiram esquematizar os contatos e criar o guia. Quando a notícia chegou às redes sociais, o plano se consolidou por completo. “Depois do lançamento a gente teve muita procura”, comenta Andréa.
Cartilha de direito da mulher
Antes de criar o catálogo “Páginas Verde e Amarelas”, o núcleo de Madri do grupo Mulheres do Brasil lançou a cartilha “Dignidade, proteção e apoio à mulher brasileira na Espanha”, com informações sobre violência de gênero, guarda e tutela de menores e serviços de apoio.
A publicação é, na verdade, a reedição de um texto que estava disponível no Consulado Brasileiro em Madri, como explica a advogada e colíder do comitê de direito da mulher, Thaís de Camargo Rodrigues. O documento...
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Patrícia Bastos leva canções e ritmos da Amazônia a festival no México
10/22/2022
A cantora brasileira Patrícia Bastos participa da 50ª edição do Festival Cervantino, em Guanajuato, no México. O evento, que reúne nomes nacionais e internacionais da música, do teatro, da dança, das artes plásticas e da literatura, vem se consolidando como um dos mais importantes da América Latina e do mundo. No show do próximo dia 28 de outubro, a cantora apresentará ao público mexicano canções que reúnem ritmos, cantos populares e histórias da região amazônica.
Larissa Werneck, correspondente da RFI no México
Nascida no Amapá, Patrícia Bastos começou a cantar profissionalmente aos 18 anos. Desde o início da carreira, sua música é marcada pela união de ritmos afrodescendentes, como o batuque e o som do marabaixo, uma das principais manifestações culturais e folclóricas do norte do Brasil. E é com essa mistura musical popular que a cantora pretende encantar o público mexicano.
“Essa é minha primeira apresentação no México e eu estou muito ansiosa para participar do Festival Cervantino, já que é uma grande oportunidade de mostrar a cultura de um lugar tão distante para os mexicanos que é o Amapá, na Amazônia. Eu espero subir no palco e dar o recado com os nossos tambores e marabás, com a nossa música da Linha do Equador, que é tão alegre”, diz Patrícia.
Repertório dos shows inclui o zouk, ritmo popular nas fronteiras do norte brasileiro
Para atrair ainda mais o público latino, Patrícia Bastos incluiu o zouk no repertório dos shows que realizará no México. Além da apresentação no Festival Cervantino, ela fará apresentações em Puebla e na Cidade do México, onde contará com a participação especial da cantora cubano-mexicana Leiden.
“Esse intercâmbio de culturas é muito importante. Apesar de só conhecer a Leiden à distância, eu sou muito fã do trabalho dela. Trocamos muitas mensagens até escolhermos as músicas da nossa apresentação. E a música mexicana é muito contagiante também, repleta de histórias bonitas e interessantes, assim como a nossa música. Eu acho que nosso encontro nos palcos será muito bonito”, completa a cantora amapaense.
Brasil tem histórico de participações no Festival de Guanajuato
A 50ª edição do Festival de Guanajuato vai até o dia 30 de outubro. Ao longo dos últimos anos, a participação brasileira tem sido marcante, como explica Gustavo Raposo, chefe do setor cultural da Embaixada do Brasil no México, que está apoiando a vinda da cantora.
“Para a gente, é muito importante participar do Festival Cervantino pela sua história e pela sua importância para a cultura. Trouxemos artistas de diferentes vertentes musicais, como Chico César, que participou de maneira virtual em 2021. Tivemos também a Dona Onete, do Pará, em 2019, e Yamandú Costa, em 2018. São atrações muito diversas musicalmente, e dessa maneira mostramos que o Brasil tem muito a oferecer. E este ano, nós estamos muito felizes com a vinda da Patrícia Bastos, e a apresentação dela nos enche de alegria”, afirma Gustavo.
Indicação ao Grammy Latino em 2017
A mescla de ritmos amazonenses rendeu a Patrícia várias premiações. Além disso, ela foi indicada ao 18º Grammy Latino, em 2017, na categoria Melhor Álbum de Raízes Brasileiras com Batom Bacaba, uma produção realizada em parceria com Dante Ozzetti e Du Moreira.
“Conseguir chegar a uma premiação desse porte é muito importante para anunciar o que se faz e ao que se propõe a música da Amazônia produzida no Amapá. Ser indicada nessa categoria é um prêmio de reconhecimento do que venho fazendo ao longo dos anos, uma música identitária ancorada na tradição, com arranjos contemporâneos, que ajuda a escrever a identidade cultural do meu país. Isso me enche de alegria e reforça o papel da arte e do artista.”, celebra a cantora.
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No território do Xingu, indígenas se sentem abandonados pelo governo brasileiro
10/15/2022
Mais vulneráveis às doenças das cidades e morando em regiões de difícil acesso, a saúde dos indígenas da Amazônia é muito frágil. No parque indígena do Xingu, o maior território protegido do Brasil, vivem 16 povos diferentes. Nos últimos anos, eles também sofrem dos efeitos do desmatamento e das mudanças climáticas.
Sarah Cozzolino, correspondente da RFI no Brasil.
Camila é atendida sobre uma cama ginecológica improvisada na aldeia indígena Waura. Ela sente uma dor na barriga há dois anos, desde que ela toma um remédio para não menstruar, pois ela é um dos médicos tradicionais da aldeia. "A gente tem cigarro para curar a pessoa que está doente", explica Camila. "O espírito fala qual é a dor que ele está sentindo, qual espírito que tá fazendo mal a ele", completa.
Camila é um dos 6 pajés da sua aldeia, no parque indígena do Xingu, no Mato Grosso. Para os indígenas, existem vários tipos de médicos tradicionais : os pajés, como Camila, que se comunicam com os espíritos, e os raizeiros, especialistas em chás a base de ervas e raízes.
Durante a pandemia de Covid-19, esses médicos tradicionais foram muito solicitados, como explica Caio Machado, presidente e co-fundador da ONG Doutores da Amazônia : "eles começaram a usar a medicina tradicional deles, como um chá que eles tomam. Uma coisa que chamou muito a nossa atenção é que naquela região há cerca de 10.000 indígenas e eles tomaram esse chá. E desses 10.000 indígenas, morreram 2 indígenas. Até os não indígenas estavam começando a tomar esse chá. Isso quer dizer o que? Que a medicina tradicional é muito forte!", avalia.
Apesar das recomendações de isolamento social para lutar contra a propagação da covid-19, os indígenas conservaram a sua forma de vida em coletividade. "Quando a Covid-19 chegou, veio a medida de fora, dizendo para separar… Mas não teve jeito", lembra Tapi Yawalapiti. "Não tem como a gente quebrar nossa organização social, de ficar longe da família… Então foi muito difícil para a gente adaptar uma regra que veio lá da cidade, dentro da aldeia". O cacique Yawalapiti é filho do antigo cacique Aritana, grande líder da luta indígena do Xingu, que morreu em 2020, vítima da pandemia.
Nessas regiões isoladas, o acesso aos atendimentos especializados pode ser muito complicado e os hospitais ficam fora do território indígena, a várias horas de carro. Por isso, a ação anual da ONG "Doutores da Amazônia" é muito necessária : os indígenas conseguem ter acesso a dentistas, ginecologistas e oftalmologistas, entre outros. "Sofremos muito preconceito e discriminação racial na cidade, então às vezes a gente não é bem-vindo nos hospitais, lamenta o cacique. A gente é esquecido, abandonado no hospital. Então, aqui, todo mundo tá muito feliz, os médicos atendendo… e as pessoas voltando para suas aldeias muito felizes. Então isso é muito importante. E uma vantagem em comparação com o atendimento da cidade", diz o cacique.
Alerta para mudanças climáticas
Tapi Yawalapiti observa com apreensão a grama queimada de sol, no pólo Leonardo Villas-Bôas, onde acontecem os atendimentos da ONG. É a época das queimadas, e o cacique está cada vez mais preocupado com a mudança climática na Amazônia. "Nós que moramos na floresta, sabemos cuidar da floresta, sabemos cuidar do rio, sem poluir, acredita Tapi. Mas a gente esta notando que o tempo mudou. Então hoje, se você tacar fogo aqui, vai embora, perde controle. Na década de 1990, não tinha isso. Então hoje a gente tem que ter muito controle de queimada, muito", afirma.
O desmatamento é visível nas fronteiras do parque. Na estrada, da capital de Goiânia até a entrada do Xingu, é necessário atravessar hectares e hectares de plantações de milho e soja. "Tem onze municípios em volta do nosso território", explica Iakari Kuikuro. "Estão derrubando muitas árvores, mato, para plantar soja, arroz, e muito mais… Eu estou muito preocupado com o futuro", diz. Ao pensar na situação, Iakari Kuikuro não consegue reter as lágrimas. "Daqui para frente, como...
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Panamá: Inflação, corrupção e escassez de alimentos motivam protestos, relata brasileira
7/30/2022
“Buenos días, Panamá!” É da varanda com vista para a Cidade do Panamá que todos os dias a goiana Viviane Naves saúda seus seguidores de uma rede social. Deste ponto privilegiado da capital panamenha ela usa o humor para se conectar com o país onde chegou em 2020, em plena pandemia da Covid-19. Também é de lá que agora ela acompanha as manifestações que, nas últimas semanas, vêm agitando este país da América Central.
Por Elianah Jorge, correspondente da RFI em Caracas
A insatisfação que tomou conta das ruas de diversas regiões e da capital panamenha começou a ser sentida logo após o fim do confinamento e foi motivada principalmente pelo alto custo de vida. “Após esse período de euforia por recuperar a vida normal do cotidiano, começou essa sensação de que tudo estava caro, da falta de alimentos nos supermercados pela dificuldade de chegar [a mercadoria aos estabelecimentos]. Havia uma sensação de dificuldade de trabalho, das pessoas conseguirem dinheiro”, ela lembra.
Neste país onde o Produto Interno Bruto (PIB) per capta é de US$ 14,5 mil, de acordo com o Banco Mundial, o desemprego chega a 10% e a informalidade gira em torno de 50%, informa a Contraladoria Geral do Panamá. E com a economia dolarizada, o custo de vida é bastante alto. “A comida aqui é muito cara. O custo de vida no Panamá é bem caro. Isso me assustou muito no início. Desde o início eu sentia essa preocupação [por parte do povo].”
O recente fenômeno da inflação no Panamá fez com que o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) chegasse a 5,2% em junho deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. A taxa pode ser moderada se comparada com a de outros países, mas vem pesando no bolso das famílias. A alta mais significativa foi a de 40% no preço da gasolina durante o primeiro semestre de 2022.
“O que eu vejo que deixa mais cara a condição de vida é a comida e os remédios. Então veio a guerra na Ucrânia e o preço da gasolina aumentou muito por aqui, de uma hora para outra. Isso foi muito forte”, destaca Viviane.
Indígenas
Por causa da distância entre as zonas agrícolas e as cidades de médio e grande portes, o preço do combustível, que não é produzido no Panamá, gerou um efeito dominó. “Tudo ficou mais caro ainda porque muitos alimentos vêm de caminhão da região de Chiriqui (a cerca de 420 km da Cidade do Panamá), onde há produção de café e de muitos tipos de produtos. Tudo ficou mais caro e isso também pesou muito para os produtores.”
Uma das principais forças desses protestos sãos os indígenas, muitos deles detentores de terras em determinadas áreas do Panamá. Ao lado dos produtores de alimentos, eles têm sido a principal pedra no sapato do governo de Laurentino Cortizo.
Por causa da pressão social, o presidente, que chegou ao poder em julho de 2019, decidiu congelar em US$ 3,25 (cerca de R$ 16) o preço do galão da gasolina, que antes chegou a custar US$ 5. Junto com o anúncio feito nesta terça-feira (26) estão subsídios a outros produtos, como o arroz e o atum.
Os sindicatos e outras associações não ficaram satisfeitos com as medidas. Eles também pedem a redução do preço dos alimentos, energia, remédios, e o aumento do orçamento da Educação, além do combate à corrupção, o que continua motivando os protestos. As perdas estimadas por causa das manifestações e paralisações das últimas semanas superam a quantia de US$ 500 milhões.
“Da [minha] varanda dá para ver os protestos. Eu vi o caminho que eles [os manifestantes] estavam fazendo e desci para me juntar ao protesto. Foi quando eu encontrei o humorista Kenny Dancer, que faz muito sucesso aqui com a personagem ‘La Ministra’”, conta a ex-fisioterapeuta que agora trabalha como tradutora e produtora de conteúdo.
“São pessoas que estavam com muita raiva principalmente pela corrupção que existe dentro do Panamá, dos partidos políticos. Nos protestos as pessoas reclamavam muito dos subsídios que os políticos têm até para bebidas alcoólicas. Eles recebem garrafas de rum! Esse tema foi muito forte dentro dos...
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Voluntariado é caminho para adaptação no exterior, dizem brasileiras no México
6/11/2022
Brasileiras que vivem no México realizam trabalhos voluntários para diferentes organizações. Além de apoiarem causas importantes, elas contam que a atividade ajuda na familiarização com a vida fora do Brasil.
Larissa Werneck, correspondente da RFI no México
Em uma busca rápida na internet por programas de voluntariado no exterior, é possível encontrar uma grande quantidade de projetos e organizações que realizam trabalhos voluntários em diferentes regiões do mundo, que oferecem às pessoas a possibilidade de contribuir para ações que vão desde o desenvolvimento de comunidades desfavorecidas até programas de proteção ao meio ambiente. As vantagens são muitas, tanto para os beneficiários dos projetos, quanto para os voluntários.
Além do sentimento de ajudar quem necessita e de colaborar para a transformação social, ser voluntário fora do Brasil traz muitos benefícios, entre eles, a possibilidade de conhecer novas culturas e novos costumes, o aprendizado de um idioma e a criação de novas relações sociais, sejam elas profissionais ou pessoais. No caso de famílias expatriadas ou em transição, as vantagens vão além: o voluntariado pode ser um grande aliado no processo de adaptação à vida em um novo país.
Foi o que aconteceu com a Karla Machado, mineira de Belo Horizonte que mora no México há treze anos. “Quando a gente chega no México, como expatriada, a gente tem muito tempo ocioso, né? E, logo que eu cheguei, eu fui apresentada um grupo de brasileiras que já faziam um trabalho voluntário na Abrame, que significa Amigas Brasil-México. Esse grupo realizava encontros para arrecadar dinheiro, produtos de limpeza e alimentos para abrigos que necessitavam de assistência. Além de fazer voluntariado, esses encontros são uma forma para a gente se enturmar e de receber dicas sobre o novo país, como informações sobre médicos e serviços, por exemplo”, afirma.
Os anos foram passando, e Karla começou a se envolver ainda mais nos projetos, assumindo novas funções a cada ano. Hoje, ela é coordenadora da Abrame, organização que atualmente direciona o trabalho para dois abrigos: um para pessoas idosas e outro para crianças e jovens em situação de pobreza que foram afastados das famílias por questões de violência e abuso.
“A Casa Hogar San Francisco, que fica em Toluca, no Estado do México, era um lugar muito precário, sem armários nem camas para as crianças dormirem. Além disso, elas não tinham como levar merenda para a escola. Com o trabalho das nossas voluntárias, conseguimos fazer reformas na casa e organizar doações de alimentos, que são realizadas mensalmente. Eu fico muito feliz porque algumas das crianças que nós conhecemos aos 8 anos de idade já estão na universidade”, conta Karla.
Já o trabalho no Asilo Emanuel, localizado em Coacalco, também no Estado de México, começou há dez anos. Atualmente, vinte homens e mulheres vivem no lugar, que necessita de reformas urgentes. “Sempre ajudamos com doações de dinheiro, alimentos e produtos de higiene. Agora, vamos apoiar na reforma do asilo. Uma brasileira que é arquiteta está fazendo o projeto sem custo e nós vamos levantar os recursos para as obras”, diz a coordenadora da Abrame.
Famílias brasileiras apoiam fundação para crianças com câncer
Outra organização que recebe o apoio de famílias voluntárias brasileiras no México é a Fundación Mark, criada há 16 anos pela mexicana Sonia Zuani. A fundação leva o nome do seu filho, diagnosticado com leucemia, aos seis anos de idade.
“Inicialmente o tratamento do Mark foi em um hospital público do México e, infelizmente, eles não cuidavam da parte emocional das crianças internadas. Eles não permitiam que elas levassem jogos e não havia espaços lúdicos de atividades direcionadas para elas. A fundação foi um sonho do meu filho, que quis criar um lugar para que crianças,como ele, pudessem brincar e se divertir. Ela foi constituída no mesmo dia em que ele faleceu. Esse foi o seu legado”, diz Sonia.
Atualmente a Fundación Mark possui sete...
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Museu de Arte Latino-americana de Buenos Aires homenageia 100 anos da Semana de 22
2/19/2022
Com a série de eventos "Antropofagia Revisitada", o Museu de Arte Latino-americana de Buenos Aires (Malba) presta homenagem ao centenário da chamada Semana de 22, que marcou o começo do modernismo brasileiro. O movimento influenciou a arte em toda a América Latina, passando pela Bossa Nova, pelo Tropicalismo e até o Rock Brasil, que completa 40 anos.
Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
Até a próxima semana, o Malba mantém uma visita guiada pelas 15 peças modernistas de artistas brasileiros que fazem parte da coleção do local, que conta com obras de Tarsila do Amaral, Lígia Clark, Di Cavalcanti, Portinari, Hélio Oiticica, entre outros.
Em sintonia com o centenário da emblemática Semana de 22, o museu argentino e a Embaixada do Brasil em Buenos Aires organizaram uma série de atividades, presenciais e virtuais, com artistas e acadêmicos, brasileiros e argentinos, sob o conceito de "Antropofagia Revisitada" que incluiu mesas redondas e apresentações.
Macunaíma, de Mário de Andrade, ganhou uma nova tradução em espanhol. Os debates puseram a lupa sobre as temáticas em voga na época, Mulheres, Negros e Índios no modernismo brasileiro. Se Tarsila do Amaral propunha "devorar" a arte europeia com o seu quadro do "homem que come gente", o Malba inaugurou o Café Tarsila, onde uma parte do Abaporu foi transformado em biscoito e pode ser devorado.
Influência brasileira
Por alguns instantes, o Malba desta semana de 2022 remetia ao Theatro Municipal de São Paulo, palco daquela semana de 1922. Aquele Brasil de cem anos atrás também completava o seu primeiro centenário de independência e requeria identidade própria. O modernismo brasileiro propunha devorar a arte europeia não para copiá-la nem para se submeter a ela, mas para transformá-la em brasileira, com elementos próprios daquela nova nação.
Ao longo das décadas seguintes, o modernismo contribuiria para uma identidade de vanguarda através pintura, da escultura, da poesia, da arquitetura, da literatura e da música.
Diego Murphy, responsável pelo passeio através das obras brasileiras, explica que a Semana de 22 catalisou o que acontecia de forma generalizada pela América Latina, tornando o movimento brasileiro a referência que influenciaria a arte em toda a região.
"No começo do século 20, os países da região discutiam qual era a sua identidade. Vários olhavam para a Europa, mas alguns começaram a olhar para dentro de si. Enquanto no resto da América Latina as discussões aconteciam de forma individual, caótica e pouco clara, no Brasil, aconteceram de forma muita clara e contundente. E isso começa a se irradiar do Brasil a toda a América Latina", explica Diego Murphy à RFI.
Naqueles anos 1920, dois movimentos ecoavam pela América Latina: a "Antropofagia brasileira" e o "Muralismo mexicano" que tinha uma conotação mais política, após a Revolução Mexicana.
"O Muralismo mexicano é muito forte e se irradia pela América Central, mas também nos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, havia muita resistência a esse movimento tão político. A Antropofagia brasileira, em contraposição à Europa, tem muita influência na região, mas, sobretudo, na América do Sul, especialmente no Chile e na Argentina. Não chega a surgir um movimento, mas surgiram individualidades que geraram frutos interessantíssimos na arte", compara Murphy.
A curadora chefe do Malba, Maria Amalia García, conta que os vanguardistas argentinos se espelhavam nos brasileiros.
"Durante os anos 1920, tudo o que aconteceu na Semana de 22 do Brasil teve impacto na Argentina. Os modernistas argentinos observavam com atenção o que acontecia no Brasil. Os intelectuais e os artistas argentinos tiveram um vínculo fluído com o Brasil e com todas essas publicações e núcleos vinculados também com a vanguarda local", aponta Maria Amalia García à RFI.
Abaporu em Buenos Aires
O ponto de ebulição da Semana de 22 aconteceu em 1928, quando Tarsila do Amaral pintou um quadro como presente de aniversário ao marido, o poeta e escritor...
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Treinadora de golfinhos brasileira acredita que interação entre animais e público favorece preservação
9/26/2021
Aos 8 anos de idade, Cinthya Coutinho foi pela primeira vez a um parque aquático. Aquele momento despertou na brasileira o sonho de trabalhar com golfinhos, baleias orcas e outros cetáceos. Ela chegou a estudar veterinária, mas decidiu que biologia marinha seria o melhor caminho para chegar à meta. Também percebeu que precisaria morar fora do Brasil para trabalhar com o que sempre quis. Ainda na faculdade, ela foi preparando o terreno, fazendo contatos para consolidar a almejada carreira.
Elianah Jorge, correspondente da RFI na Venezuela
Cinthya conta que o começo da carreira foi bem difícil. "Quando cheguei nos Estados Unidos, fiz um trabalho voluntário no zoológico e depois entrei como estagiária no aquário. Vida de estagiário não é fácil. E aqui não é diferente", recorda. O estágio da brasileira incluía lavar, limpar, preparar os peixes para alimentação e monitorar os golfinhos. Mas ela conseguiu uma vaga e ficou satisfeita. No início, foi treinadora aprendiz até conquistar, etapa por etapa, o posto de treinadora sênior.
É no Miami Seaquarium, um dos parques aquáticos mais visitados da Flórida, que Cinthya trabalha. Ela vive seu sonho de infância, mas reconhece que o cotidiano como treinadora é exigente e a dedicação, praticamente integral.
“O que ninguém sabe é que a gente tem que estar no parque 24 horas por dia quando nasce um bebê. A gente não tem feriado, nem sábado e domingo, Natal ou Ano-Novo. A gente tem que trabalhar!", destaca. Mesmo tendo uma filha, Cinthya conta que há dias em que precisa trabalhar até a madrugada. "Tem vezes que eu trabalho 16 horas por dia, e as pessoas que estão do lado de fora não sabem disso. As pessoas só veem que a gente vai para o trabalho e que brincamos com os golfinhos.”
A rotina no parque começa bem cedinho, com o preparo da comida dos animais e com a limpeza dos tanques e piscinas. Além, claro, dos treinos e ensaios diários para que profissionais e bichos façam bonito na hora do show. Pela regra, é preciso que sempre um treinador esteja de plantão no parque. Para este profissional, não há sábado, domingo ou feriados.
A vida agitada é amenizada pelo contato diário com os animais. A brasileira cuida e treina golfinhos-nariz-de-garrafa, focas, leões marinhos e também uma baleia. O aquário onde Cinthya trabalha também abriga tubarões, tartarugas marinhas, aves, répteis e peixes-boi.
De cara com a orca
Para a brasileira, é um prazer interagir com os bichos. “A maior alegria que eu tenho é ver a carinha de cada um dos animais, passar o dia com eles, ver o reconhecimento deles e a relação que você cria, o convívio do dia a dia", avalia. "Você ensinar algo para eles, treinar algo que ajude na saúde deles... A relação com os animais é a melhor parte do trabalho”, declara.
Em 2010, uma experiente treinadora morreu após ser atacada pela orca Tilikum, no parque SeaWorld.
Batizada com o nome da famosa personagem do escritor Vladimir Nabokov (1899-1977), Lolita é a mais antiga orca cativa do mundo e atualmente a única do parque onde Cinthya trabalha. O show deste animal de quase seis metros de comprimento e de mais de três toneladas de peso é a atração mais esperada do aquário.
Mesmo lidando diariamente com um superpredador, como é o caso de Lolita, Cinthya garante não ter medo.
“No meu aquário nunca aconteceu nenhum acidente. Claro, trabalhando com animal é tudo sempre imprevisível. Os treinadores conhecem os animais muito bem. Mas, como eu digo, qualquer bicho tem boca pode morder. Isso faz parte do trabalho”, resume.
Conexão com animais
A treinadora explica que nesta carreira o prazer pela interação com os bichos é o que prevalece.
“A gente começa ganhando mal nessa profissão. É um trabalho que não se faz pelo dinheiro. É por amor! Para os outros departamentos e para os CEOs dos parques, eles não são tão focados nos animais. Para eles é um negócio. Mas para quem está ali todos os dias, e cuidando dos animais, é por amor”, enfatiza.
Parece complexo ensinar animais aquáticos a...
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Como o Reino do Brasil ajudou na Independência da Argentina e do Chile há 200 anos
8/7/2021
Em 1821, o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves foi o primeiro a reconhecer a Independência das Províncias Unidas do Rio da Prata, atual Argentina, e também do Chile. O reconhecimento internacional era um aval fundamental para que os novos países pudessem consolidar o processo de libertação. Porém, mais do que Portugal, o projeto de reconhecimento dos novos vizinhos era um interesse do Reino do Brasil.
Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
O crucial reconhecimento das independências da Argentina e do Chile está completando 200 anos, tendo os dois vizinhos o mesmo patrocinador desse passo que abriu o caminho para a legitimação internacional do processo: o então Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. Mas, dos três reinos, foi o do Brasil o grande interessado e impulsor da decisão.
"O reconhecimento da Independência por parte do Reino de Portugal e do Brasil abriu um caminho importante para outros reconhecimentos posteriores. Foi o primeiro passo", indica à RFI o historiador Roberto Azaretto, apontando o exemplo seguido pelos Estados Unidos em 1822 e pela Grã-Bretanha em 1825.
Posteriormente, será a Argentina a primeira a também reconhecer a Independência do Reino do Brasil e a formação do novo Império.
"O passo que o Reino de Portugal e do Brasil deram foi importante para a consolidação do processo de Independência porque foi o primeiro de um reino importante com influência no Rio da Prata e na Europa. Teve um efeito político forte", acrescenta à RFI o historiador Guillermo Cao.
Os dois novos países tinham declarado as suas Independências anos antes num frágil processo que requeria de legitimação internacional para evitar uma reconquista por parte da Espanha.
No caso do Chile, a Espanha chegou mesmo a reconquistar o território por um breve período. Já as Províncias Unidas do Rio da Prata ou Províncias Unidas do Sul, a situação não era menos frágil. Em 1820, disputas de poder entre as províncias no Rio da Prata tinham levado a região a uma guerra civil. O Governo de Buenos Aires tinha a representação das Relações Exteriores, mas disputava o poder com as demais províncias.
O reconhecimento, portanto, teve um efeito internacional, mas também interno, ajudando a consolidar o poder de Buenos Aires. O nome Argentina surgiria, como alternativa, seis anos depois, mas só se consolidaria 50 anos depois.
Presença no Brasil permitia proximidade
O Brasil tinha sido elevado à categoria de Reino em 1815. Possuía bandeira e armas próprias. O Rio de Janeiro era a capital do Império, de onde o Rei D. João VI percebia que os movimentos de Independência na vizinhança eram irreversíveis.
A Revolução Liberal do Porto, em 1820, exigia a volta do Rei a Portugal e o estabelecimento de uma monarquia constitucional. Antes de partir, D. João VI preparou o terreno para os interesses do Brasil na região.
"A Casa de Bragança no Rio de Janeiro percebeu a importância do processo que acontecia no Rio da Prata. Era uma Corte europeia, mas, ao estar no Rio de Janeiro, tinha uma percepção mais próxima do que acontecia no continente. O Reino Unido de Portugal e Brasil viu que o processo de Independência era irreversível e que precisava inserir o Brasil na América, vincular-se com os países que estavam surgindo. Precisavam que o Brasil, já incorporado ao Reino, se vinculasse com essa nova geografia política que surgia", explica Roberto Azaretto.
No dia 26 de abril de 1821, o Rei D. João VI retornou a Portugal, depois de 13 anos no Brasil. Dez dias antes, o então ministro dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, Silvestre Pinheiro Ferreira, escreveu uma carta, por parte do Rei, na qual reconhecia a Independência das Províncias Unidas do Rio da Prata.
Na carta, Pinheiro Ferreira anuncia que "Sua Majestade Fidelíssima não hesitará em reconhecer a independência dos Estados vizinhos ao Reino do Brasil que forem estabelecidos, instalados e obedecidos pelos seus respectivos povos".
"O Rei sempre quis manter relações estreitas com os...
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Brasileiras usam excedente de soja para melhorar nutrição na Bolívia
7/17/2021
A Bolívia está entre os dez maiores produtores mundiais de soja. Mas também ainda é um país carente de recursos, onde parte da população não tem acesso à alimentação adequada. Inspiradas em fazer a diferença, as empresárias brasileiras Flavia Cabral e Karina Cabral criaram há mais de 18 anos a Fundação Soya y Vida, radicada no departamento de Santa Cruz, no sudeste boliviano.
Por Elianah Jorge, correspondente da RFI na América Latina
Com este trabalho social elas apoiam mais de 5.000 pessoas por ano com doações de soja e de produtos derivados da oleaginosa. Marina Cabral, filha de uma das fundadoras e que também ajuda a levar adiante este sonho feito realidade, dá detalhes:
“Esse projeto surgiu quando as pessoas que fizeram a Fundação reconheceram a baixa nutrição das pessoas aqui na Bolívia. Pelo fato de a carne ser uma comida um pouco mais cara e a soja ser um grão com muita produção em território boliviano, principalmente aqui em Santa Cruz, ela é barata e tem bastante proteína”, conta.
“Então, em vez da pessoa comprar a carne, que é cara, ou então ela dar a soja para o porco comer e depois comer a carne do porco, ela pode consumir a soja diretamente e assim melhorar o consumo de proteína. E de uma forma que não é preciso gastar tanto para ter acesso à nutrição um pouco mais barata”, explica.
Programa brasileiro
Foi graças a um programa colocado em prática na década dos anos 1980 pela Embrapa, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, vinculada ao Ministério da Agricultura, que as Cabral decidiram fazer a diferença na terra que as recebeu, explica Flávia.
“A gente veio do Brasil e lá tem um trabalho muito interessante da Embrapa em eles se preocupavam em aproveitar os benefícios nutricionais da soja na alimentação. Chegando aqui, em conversa com as amigas, falamos sobre fazer alguma coisa. Começamos aos poucos com essas amigas. Os amigos que acreditavam na gente iam doando e assim íamos fazendo, e tudo foi crescendo.”
Seis anos após o início do projeto, as integrantes da família Cabral perceberam que o programa ganhava maior dimensão, parte delas graças às doações de voluntários. Era preciso ampliar e formalizar a estrutura, conta Flávia.
“Percebemos que para entrar em empresas para que elas fizessem doações - muita gente queria doar-, mas não tínhamos documentação. Então formalizamos a Fundação e fizemos tudo. Hoje em dia a gente recebe doações de multinacionais. O negócio cresceu muito mais do que a gente esperava”, continua.
Na Fundação boa parte dos membros ativos são brasileiros, perfil similar ao dos produtores de soja na Bolívia: muitos chegaram do Brasil, mas há também bolivianos e argentinos.
Entre os maiores produtores mundiais
A terra e o clima tropical do sudeste boliviano favorecem a produção da oleaginosa. No departamento de Santa Cruz estão 90% das plantações de soja do país.
Essa característica posiciona a Bolívia entre os dez maiores produtores mundiais de soja. Na região sul-americana, o país andino ocupa a quarta posição entre os semeadores do grão. A safra anual da soja gira em torno de 2,7 milhões de toneladas. Desse volume, 60% são exportados. A produção da soja gera mais de 110 mil empregos diretos e indiretos, e representa cerca de 6% do Produto Interno Bruto boliviano.
As integrantes da família Cabral estão entre os mais de 14 mil produtores de soja radicados em Santa Cruz.
Com o excedente da colheita a Fundação Soya y Vida, apoiada por outros produtores, faz a diferença nas mesas bolivianas.
“A Soya y Vida atende a mais de 5.000 pessoas, entre orfanato de crianças e adolescentes, hospitais, clubes de mães (que é algo onde mães do mesmo bairro se unem para a ajuda mútua), asilos, centros para pessoas com necessidades especiais... Então são mais de 12 toneladas de alimentos, seja em forma de leite, soja em grão ou em purê, e em 18 municípios diferentes”, enumera Marina, que é filha de Flávia.
O foco da Fundação Soya y Vida é melhorar a qualidade de vida da população carente...
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Brasileiros contam as dificuldades de morar na Colômbia, país palco de violentos protestos
5/22/2021
“Aqui na Colômbia não existem direitos. O colombiano sempre abaixa a cabeça para tudo, mas agora não. Eles levantaram a cabeça e não abaixam mais. Eles querem brigar pelos seus direitos, pela reforma tributária e eles vão até o fim, com isso eu estou de acordo, mas não concordo com o vandalismo que está prejudicando a todos”.
Por Elianah Jorge , correspondente da RFI
As palavras da potiguar Micarla de Almeida apontam o que motivou milhares de pessoas a ocupar as ruas da Colômbia nas últimas semanas - apesar da pandemia da Covid-19. O estopim dos protestos foi o aumento de impostos proposto pelo presidente Iván Duque. A medida despertou a ira popular.
Quem também mora na capital Bogotá é o paulistano Mauricio Troncoso. Ele dá detalhes sobre a abrangência das mudanças que incentivaram as manifestações.
“Dessa vez começou com o motivo da reforma tributária. O governo queria colocar um imposto de 19% sobre o combustível, serviços básicos de água e de luz. Esse imposto geraria várias consequências no dia a dia da população. Esse projeto já caiu, mas há outras reformas na área da saúde e das aposentadorias. Os protestos continuam para tentar vetar esses outros projetos”.
A economia desse país de 50 milhões de habitantes - e que faz fronteira com o Brasil – foi gravemente afetada pela pandemia. Em apenas um ano o número de pobres passou de 35,7% para 42,5%, em grande parte alavancado pela ausência de políticas estatais aos mais carentes. Explica Micarla:
“Subsídio do governo isso não existe. Quem diz que recebe subsídio aqui na Colômbia está mentindo”.
Sem encontrar apoio no governo, restou ao povo protestar nas ruas, enfrentar o fantasma invisível da pandemia e as truculentas forças de segurança estatais. Estas, por sua vez, respondem com fogo contra manifestantes que atacam com pedras e outros artefatos improvisados.
Vários países, entre eles os Estados Unidos, e organismos internacionais vêm lançando alertas ao governo colombiano contra a violência a civis. A Anistia Internacional pediu o fim da ajuda militar dos Estados Unidos ao governo colombiano após a escala de mortos nos protestos.
Mauricio prefere não ir aos protestos.
“A polícia revidou de uma maneira ainda mais violenta, usando armas de fogo. Pessoas desapareceram, pessoas morreram. Então os manifestantes reagem com mais força. Há um sentimento de indignação”.
Desde o começo das manifestações, em 28 de abril, pelo menos 43 pessoas morreram, a maioria civis; e cerca de 1.700 ficaram feridas. .
A violência desatada nos protestos intimida Micarla:
“O colombiano abriu os olhos, mas não é quebrando, destruindo as coisas. A insegurança está imensa. Eu já tinha trauma de sair sozinha, agora eu praticamente não saio”.
Mauricio é terapeuta e continuou trabalhando, seja online ou presencialmente. A tensão motivada pelos protestos tem sido tema das consultas:
“Os meus pacientes todos se sentiram afetados. Você sai à rua e tem gente morrendo, tem gás lacrimogêneo... O ponto do ônibus está destruído ou a pessoa não tem como chegar em casa porque há um protesto. O clima de insegurança é alto nesses dias”.
A empresa onde Micarla trabalhava, no ramo de aviação, mudou as políticas internas. Em vez do salário mensal, os funcionários trabalhariam por hora e precisariam arcar com custos de transporte e alimentação no horário de trabalho. Não valia a pena, explicou a brasileira.
Para ajudar nas contas, ela começou a vender cestas de café da manhã. A princípio se deparou com a imposição da quarentena radical, e agora, com as vias bloqueadas pelos protestos.
“Como vamos conseguir nos manter se o governo não ajuda? (A conta dos) serviços e do aluguel vão chegar para pagar. Tem fralda, tem supermercado, como a gente vai se manter se não tem de onde tirar? O pouco que estávamos conseguindo fazer (de dinheiro) o governo não deixa sair por causa da quarentena total”.
Na Colômbia o custo de vida é alto. O salário mínimo é equivalente a R$1.200. Em marco deste ano a inflação...
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Decadência de "Torres Gêmeas" da Venezuela reflete ascensão e declínio do país, relata brasileira
5/9/2021
O complexo urbanístico do Parque Central, localizado no coração de Caracas, é o perfeito retrato da Venezuela de antes e de agora. Quando foi inaugurado, em 1983, os edifícios e o país eram sinônimos da riqueza e vanguarda de uma potência petroleira. Agora, esta que foi a estrutura urbana mais famosa da América Latina continua sendo o símbolo do país – ambos empobrecidos, sucateados e maltratados.
É lá que, há 30 anos, mora a comerciante paraense Imara Santos. “No Brasil, a coisa estava difícil e quando cheguei aqui encontrei um país próspero. Com um salário mínimo venezuelano, dava para fazer compras, pagar aluguel e ainda sobrava para comprar presentes. Não era milagre, era a moeda [bolívar] que tinha força", relembra.
Dados de 1990, um ano antes da chegada do Imara ao país, apontam que a Venezuela era a quarta economia da região. O Produto Interno Bruto (PIB) chegava a US$ 48 bilhões e o salário mínimo era equivalente a U$148,20. A pobreza extrema não passava de 23,18%.
A brasileira é uma das quase 15 mil pessoas que moram no complexo composto por oito edifícios residenciais e dois prédios empresariais, de 225 metros cada um, conhecidos como as Torres Gêmeas de Caracas. Até 2003 elas ocuparam o primeiro lugar na lista de arranha-céus mais altos da América Latina. Atualmente estão em 27° e 28° lugares neste ranking – uma queda similar à da economia venezuelana, se comparada a dos demais países.
40 mil pessoas por dia
O Complexo do Parque Central se assemelha a uma cidade dentro da cidade. Além da excelente localização em uma nevrálgica área da capital venezuelana, o Complexo abriga museus, cinemas, teatros, dezenas de estabelecimentos comerciais, entre eles supermercados, e a estação Parque Central do metrô caraquenho. Lá também funcionam ministérios e organismos estatais. Antes da pandemia, cerca de 40 mil pessoas circulavam diariamente por ali.
“Isso era um mundo, uma cidade para mim. Tudo era um luxo, luxo total. As ascensoristas pareciam aeromoças lindas, impecáveis, perfeitas. Tudo (aqui) funcionava perfeito.”
Não é à toa que a brasileira usa o verbo no passado. O Parque Central já era. Hoje em dia, é sinônimo de deterioração, adjetivo que pode ser aplicado também para descrever o país.
Em 1998, o PIB venezuelano conseguiu se manter dentro das cinco maiores economias da região. Mas em 2011 foi o último ano em que a economia da Venezuela cresceu, atingindo um PIB de US$ 334 bilhões. Depois, só decaiu, culminando em 2018, quando a crise fez desaparecer 44% das riquezas nacionais. A pobreza disparou e os casos de desnutrição começaram a aumentar.
"Caindo aos pedaços"
A falta de manutenção transformou para pior o Parque Central. Similar ao que acontece em boa parte de Caracas, lá o fornecimento de água encanada é deficiente. As infiltrações formam poças nos corredores planos, e cascatas nas escadas. Nos edifícios residenciais, empresariais e nas galerias comerciais, falta iluminação adequada.
“O Parque Central está caindo aos pedaços. Tem todo tipo de problema. O condomínio é barato, mas não funciona. Está tudo destruído. Tudo! É uma coisa muito triste, um verdadeiro caos", lamenta a moradora brasileira. "Não é nem sombra do que foi.”
Atualmente o Complexo do Parque Central faz lembrar o filme “Mad Max”, produção australiana exibida em 1980 no Brasil, que mostra um território abandonado à própria sorte. Não é raro o surgimento de focos de incêndio nas estruturas do complexo. Em 2004 o fogo consumiu um terço de uma das Torres Gêmeas. Pelo menos dez andares da Torre Leste, onde funcionavam ministérios e organismos estatais, ficaram completamente destruídos. Apesar das 15 horas de labaredas, a estrutura conseguiu se manter de pé. Já em 2013, foi a vez da Torre Oeste sofrer um incêndio, de menores proporções.
Perigo
Nos prédios comerciais e residenciais, boa parte das escadas rolantes e dos elevadores não funcionam. É preciso transitar pelas escadarias. No entanto, o roubo de lâmpadas e de fios, além dos...
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Brasileiro cria projeto de aulas presenciais para alunos carentes na Bolívia
2/20/2021
Para ajudar os alunos de áreas carentes de Santa Cruz de la Sierra, a maior cidade da Bolívia, o professor brasileiro João Veríssimo criou, junto com a empreendedora Mónica Flores, o projeto Aula 4x4. Para evitar a propagação da covid-19, as aulas de matemática e línguas, para alunos do ensino fundamental, são dadas em espaços abertos nas comunidades.
Por Elianah Jorge, correspondente da RFI
O professor brasileiro aplica um protocolo sanitário rígido em suas aulas. O uso de máscara é obrigatório, a distância entre alunos e voluntários deve ser respeitada e todos devem levar álcool em gel para participar das aulas.
"São grupos de no máximo quatro pessoas, sentadas em um quadrado imaginário, com um metro de distância entre cada uma”, explica João Veríssimo. "As crianças vêm para o encontro, para a Aula 4x4, de uniforme. A grande maioria busca reconstruir este único espaço de socialização que eles têm.”
A iniciativa representa um alívio para as famílias, diz o professor brasileiro. “A maioria conta com esse projeto para manter os filhos, não apenas com um nível mínimo de aprendizagem, mas também ocupados. Todas as crianças e jovens deste país, no sistema público, passavam o dia sem nada para fazer, até o ano passado”, lembra.
As doações são fundamentais para a continuidade do projeto. “Todo o material que precisamos foi doado. Fizemos uma divulgação nas nossas redes sociais e alguns grupos se prontificaram a doar dinheiro ou material. Com o dinheiro compramos os quadros”, explica.
O Aula 4x4 foi implantado em dois bairros de Santa Cruz de la Sierra e já conta com pelo menos 60 estudantes, mas começa a se expandir. "Temos um terceiro bairro que demonstrou interesse e que agora, neste mês, iniciará os primeiros contatos para levar o projeto", detalha o professor.
A ideia agora é levar o projeto para as universidades. “Temos planos de nos associarmos a universidades para trabalhar com estudantes dos centros de pedagogia e psicopedagogia das universidades e dos centros de formação de professores da Bolívia.”
Apoio das comunidades
O apoio de moradores das comunidades também é fundamental. São eles que literalmente abrem os pátios e quintais de suas casas, explica João Veríssimo. “Alguns não tem um pátio onde podem receber um grupo de até quatro pessoas, então pede emprestado o pátio do vizinho ou de algum outro participante do projeto que more perto”.
Outro cuidado levado em conta na organização do Aula 4x4 é a restrição de circulação de pessoas alheias à comunidade. "Os facilitadores precisam ser do bairro para que na comunidade não entre gente de fora e aumente o risco de contaminação", explica. "Essa logística interna é algo que precisa ser bem pensada. As soluções são sempre encontradas pelos moradores. Levamos a ideia, pais e mães de família, e às vezes também as crianças, têm os meios paras superar as limitações”, conta.
Epidemia paralisou ensino no país
Até agora, foram detectados cerca de 239 mil de casos da covid-19 na Bolívia. Mais de onze mil pessoas morreram no país. Diante do avanço da pandemia, o governo provisório de Jeanine Áñez, que terminou em novembro de 2020, encerrou o ano letivo no primeiro semestre do ano passado.
“O país não conseguiu estabelecer neste período nenhum modelo educativo e decidiu aprovar automaticamente todos os alunos”. As instituições de ensino continuam fechadas no país. Apenas nas cidades pequenas, com menor risco de contágio, os alunos conseguem ter aulas presenciais.
Com a chegada do atual presidente da Bolívia, Luis Arce, ao poder, em novembro, a situação melhorou, diz o professor brasileiro. Em fevereiro, o governo instaurou um modelo de educação à distância por rádio, televisão e redes sociais, beneficiando os quase três milhões de estudantes inscritos nos ensinos fundamental e médio.
O brasileiro explica que a iniciativa das aulas virtuais esbarra na falta de infraestrutura da Bolívia, beneficiando as classes mais altas. “A maioria da população não tem acesso a internet...
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Documentário sobre Venezuela coproduzido por brasileira está na disputa pelo Oscar
2/6/2021
O cenário é uma comunidade de palafitas às margens de um lago poluído por petróleo. As personagens são os moradores do lugar, que têm um cotidiano atrelado à uma disputa política. Esse é o pano de fundo do documentário “Era uma vez na Venezuela, Congo Mirador”, da diretora Anabel Rodríguez. A coprodução do filme, que concorre em duas categorias entre os pré-candidatos ao Oscar, está a brasileira Malu Campos, que conversou com a RFI.
Por Elianah Jorge, correspondente da RFI na Venezuela
“O documentário emociona tanto quanto um filme de ficção. Consegue com muito equilíbrio mostrar os dilemas e as mazelas enfrentadas pela comunidade: a degradação da natureza, o cotidiano dos moradores... Uma das cenas mais marcantes para mim é quando as crianças limpam o petróleo do corpo após uma tarde de brincadeiras na água. Tudo isso ela mostra com espaços, com respiro e muita poesia”, descreve Malu Campos.
A obra compartilha com o público de forma sutil e ao mesmo tempo impactante, a vida dos moradores do Congo Mirador, um lugar que parece saído de uma ficção. Inicialmente, eram centenas de casas móveis, instaladas nas águas do Lago de Maracaibo.
Até pouco tempo, deste local da Venezuela eram extraídos diariamente milhares de barris de petróleo. Hoje em dia, a jazida petrolífera derrama o óleo bruto nas águas, agora contaminadas.
Com poluição e sem saneamento básico, os moradores do Congo veem no assoreamento mais um motivo para transportar suas casas, com o auxílio de embarcações, rumo a destinos melhores.
Para a realização do documentário, a equipe gravou mais 400 horas de imagens durante cinco anos de filmagens. A gravação registrou desde o desenvolvimento das crianças, até a deterioração do vilarejo, passando pela realização das eleições anuais no país comandado por Nicolás Maduro.
Cerca de 700 famílias chegaram a morar no Congo Mirador. Não há dados atualizados, mas estima-se que cerca de 30 delas ainda resistem a buscar um melhor destino e continuam no local.
Encontro entre diretora venezuelana e produtora brasileira
A diretora Anabel descobriu a comunidade de palafitas por acaso. Ela foi filmar o Relâmpago do Catatumbo, fenômeno meteorológico em que se registram mais de um milhão de raios por ano. A atividade, que costuma atrair pesquisadores e documentaristas de todo o mundo, gera 10% do ozônio atmosférico do planeta.
Foi neste momento que a brasileira e a venezuelana se conheceram. Pouco depois, Malu se uniu a Anabel na coprodução do documentário “Era Uma Vez na Venezuela, Congo Mirador”.
“Esse fenômeno acontece no Lago de Maracaibo (região leste da Venezuela, perto da fronteira com a Colômbia). Lá a diretora aproveitou para filmar também os contrastes entre a riqueza da indústria petroleira e a pobreza da comunidade”, detalha Malu.
O título da obra remete às origens do nome Venezuela: a pequena Veneza, em tradução livre. Assim a região foi chamada por Américo Vespúcio (1454-1512), por volta de 1499. A denominação se popularizou, embora grande parte do território venezuelano nada tenha a ver com a cidade italiana.
A Venezuela empobrecida, imersa em um jogo político e com moradores sofridos, que insistem em sustentar no rosto um genuíno sorriso, foi documentada pela produção em pouco mais de 90 minutos.
O enfoque político da obra ganhou profundidade com a relação que a diretor Anabel construiu com uma das protagonistas do documentário. Com isso, ela teve acesso a figuras do chavismo, geralmente herméticas aos meios de comunicação não estatais, segundo a coprodutora brasileira.
“Ela (Anabel) esteve filmando durante cinco anos na comunidade, e terminou desenvolvendo uma amizade muito estreita com a Tamara, seu entorno e os representantes do partido (Socialista Unido da Venezuela), que iam trabalhar com a Tamara. Como representantes do Congo Mirador, eles tiveram a oportunidade de participar de um programa organizado pelo governador da época (o militar na reserva Francisco Árias Cárdenas) para mostrar um pouco do...
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Pioneira do brigadeiro na Venezuela, brasileira vira a rainha do “brigatone”
1/2/2021
Vivendo em Caracas desde a década de 90, a doceira carioca Mônica Gentil esperava vender apenas trinta “brigatones” neste Natal, mas sua invenção fez um sucesso inesperado entre a clientela venezuelana. Resultado: a brasileira recebeu mais de 80 encomendas da sua invenção: uma mistura de panetone com o tradicional brigadeiro.
Elianah Jorge, correspondente da RFI em Caracas
“As pessoas aqui gostam de panetone, então por que não fazer um recheado com brigadeiro?”, contou Monica à RFI Brasil. “Quando você corta o panetone tem aquele creme dentro, com um toque brasileiro. As pessoas adoraram. Foi bacana e estou super agradecida com a resposta do venezuelano ao produto”, disse.
A história dela com a Venezuela começou nos Estados Unidos, onde foi estudar na década de 1990. Foi lá que conheceu o namorado venezuelano, que também estudava no país, e decidiram se casar. Em seguida, os dois voltaram para Caracas.
Mônica se tornou confeiteira há 14 anos. Ela queria dedicar mais tempo à família, mas sem deixar de trabalhar. O sucesso com os quitutes feitos para as festas familiares mostrou que o hobby podia virar profissão.
“Todo mundo pedia e perguntava: por que você não faz isso para vender? Passei um tempo no Brasil, fiz uns cursos, me especializei e trouxe pra cá o brigadeiro em formato de festa, um pouco mais sofisticado, elaborado. O sucesso foi total”, conta.
Brasileira foi pioneira na venda do brigadeiro na Venezuela
Mônica é uma pioneira. Foi ela quem apresentou ao mercado venezuelano, há mais de uma década, o tradicional brigadeiro, antes desconhecido no país. “Ao oferecer o meu produto nas mesas de doces das festas, percebi que ninguém oferecia o brigadeiro. Então foi realmente um sucesso”.
No caso da carioca, a clientela foi conquistada, literalmente, no boca a boca. Foi assim que ela chegou a preparar mais de oito mil docinhos para uma única festa. Para quem começou sem maiores pretensões, ter uma extensa agenda de clientes foi uma doce consequência.
A inovação é a chave do negócio. “O venezuelano adora novidade e está sempre buscando ser diferente do outro. Daí a importância de eu manter o menu sempre atualizado, trazendo sempre coisas novas dentro das possibilidades que tenho em obter os ingredientes, ou trazendo de fora. A cada dois, três meses tenho sabores novos (para os doces)”.
Com o fim da escassez, grande parte dos ingredientes usados no preparo das delícias são obtidos na Venezuela. Isso aconteceu a partir da flexibilização aplicada, no final de 2019, pelo governo de Nicolás Maduro nas políticas de comércio internacional.
Mas nem sempre foi assim. Na época da escassez, período entre entre 2013 e 2018, e caracterizado pelas longas filas nas lojas, com prateleiras vazias, ela recorreu à criatividade.
Além de “trabalhar com o que ainda existia”, Mônica teve sorte de ter poucos produtos estocados, o que lhe garantiu alguns meses de flexibilidade. Mesmo assim precisou enxugar o menu e dar um jeitinho. “Para atender esses poucos pedidos até leite condensado aqui a gente aprendeu a fazer”.
O tempo passa e a fiel clientela continua fazendo encomendas. Mônica acompanha, desta forma, o crescimento das famílias. “Eu fiz o casamento, depois o batizado dos filhos do casal, em seguida a primeira comunhão. Isso pra mim é super prazeroso”, explica ela sobre a expansão de seu negócio a longo prazo.
Crescimento constante
Com a epidemia a quarentena significou uma pausa nos trabalhos da carioca, mas não um freio. Mônica usou o período para aprender ainda mais e divulgar seu trabalho através das redes sociais.
“No início da pandemia, quando a gente não podia sair, decidi que era tempo de investir mais em mim, no meu trabalho. Estou sempre estudando e achei que devia investir mais nas redes sociais. Deixei de atualizar minha página na internet e fazer publicidade em revistas e troquei tudo pelo Instagram”, diz.
O resultado do curso veio através da chuva de pedidos de “brigatones”, docinhos e bolos para as festas de fim...
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Covid-19: epidemia avança no Uruguai e fronteira com o Brasil preocupa governo
11/28/2020
O avanço da Covid-19 no Brasil é motivo de preocupação para o Uruguai. O país com o melhor desempenho da região no combate ao SARS-Cov-2 é considerado um caso de sucesso, mas a presença de um número cada vez maior de brasileiros na fronteira do país, além de outros fatores, pode desestabilizar a situação.
Márcio Resende, correspondente em Buenos Aires
A estratégia aplicada no combate à pandemia pelo Uruguai, além de eficaz, é única na região: o pais controla os contágios mesmo dando liberdade total aos seus cidadãos.
Mas, apesar da posição invejável que ainda ocupa, o número de casos tem crescido desde setembro e, nas últimas semanas, gerou alerta entre autoridades e especialistas.
Com o aumento do perigo no Uruguai, as atenções se voltam para a fronteira com o Brasil, por onde o vírus entra mais fácil a partir das seis cidades binacionais.
Essa preocupação com o Brasil é grande, como admite o ministro da Saúde do Uruguai, Daniel Salinas. Em entrevista à RFI Brasil, o ministro define a fronteira com o Brasil como "o calcanhar de Aquiles" do Uruguai.
"Essa fronteira é uma preocupação porque, de alguma maneira, gerou quatro surtos. E o último surto não está sob controle. É um desafio enorme e vai continuar sendo. É o grande calcanhar de Aquiles", admite Salinas.
O sucesso do Uruguai está baseado na grande capacidade de testes, de rastreamento dos contatos e isolamento. Essa receita de testes apoia-se também num eficiente sistema de Saúde e no apego dos uruguaios às normas. Não foi necessário nenhuma quarentena obrigatória: a população acatou as recomendações dos especialistas. Hoje, tudo está permitido no país.
Brasil dispensa ajuda, dizem autoridades
O Uruguai interpreta o lado brasileiro da fronteira como cidade uruguaia do ponto de vista da proteção mútua. O governo do Uruguai quer ajudar o lado brasileiro com testes, mas o Brasil tem dispensado a ajuda.
"As autoridades sanitárias brasileiras não estão recorrendo às nossas capacidades diagnósticas. Não estão pedindo a ajuda que poderíamos dar nos diagnósticos. Há mais circulação viral do lado brasileiro que do lado uruguaio. Isso é um fato", explica o ministro Daniel Salinas.
Das seis cidades binacionais, a principal preocupação é com Santana do Livramento, no Brasil e Rivera, no Uruguai. Para se chegar ao lado uruguaio, basta atravessar a rua. E todos os dias centenas de brasileiros atravessam a rua para compras do lado uruguaio. Nos fins de semana, podem ser até cinco mil pessoas por dia.
"Como irmãos que somos, procuramos colaborar o máximo possível e o nosso desafio é esse ponto vermelho na fronteira. A cidade de Rivera, de 93 mil habitantes, tem 2,6% da população uruguaia, mas concentra 26% dos casos do Uruguai. Então, é evidente que existe um problema", exemplifica Salinas.
Além da fronteira com o Brasil, as outras duas preocupações do Uruguai incluem o comportamento dos jovens e os casos importados de coronavírus por via aérea, apesar de o país ter decidido manter as fronteiras fechadas para o Turismo, responsável por 8% do PIB uruguaio.
"Estamos renunciando ao Turismo. É um sacrifício considerável de divisas para a Economia, mas é necessário porque depois viria um descontrole", afirma Salinas, baseando-se na experiência europeia com as férias de verão.
"Atualmente, cerca de 30% dos casos de coronavírus no Uruguai são de pessoas que estão isoladas em casa, mas assintomáticas. De cada 10 casos, nove são atendidos a domicílio. Apenas um requer internação. De cada 100 pessoas internadas, três precisam de UTI. Desses, 45% sobrevivem. Nossas taxas estão entre os quatro primeiros países do mundo. Estamos nesse pódio", celebra o ministro Daniel Salinas, comparando o país à Nova Zelândia, à Coreia do Sul e ao Japão.
Aumento de casos
No começo de julho, o Uruguai chegou ter apenas 12 casos ativos de coronavírus. O país estava perto de anunciar que tinha vencido a pandemia.
"A sensação de que a pandemia já tinha acabado fez com que o uruguaio perdesse o...
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Superando dificuldades, brasileiro faz sucesso com empresa de salgadinhos na Venezuela
11/21/2020
Leandro Pontes se instalou em Caracas onde criou, junto com a esposa, a venezuelana Gabriela Vitale, a empresa de salgadinhos brasileiros Tu Lanchinho. Superando as dificuldades de montar um negócio em um país em crise, o casal também busca mostrar, através da comida, um pouco da cultura brasileira.
Elianah Jorge, correspondente da RFI Brasil na Venezuela
O empresário paulista chegou na Venezuela em 2016, época de grande escassez no país. As filas abundavam e comprar produtos industrializados era muito difícil. A falta da comida com gosto de Brasil levou Leandro a colocar a mão na massa. Ele começou a preparar coxinhas, risoles, pães de queijo, bolinhas de carne e outros quitutes.
“Tudo começou com a saudade de comer aqueles salgados brasileiros, da comida do Brasil, do tempero do Brasil. Começamos a cozinhar em casa. Gabriela e eu fazíamos salgados para comer num sábado, num domingo. Íamos atrás das receitas familiares. Alguns salgados que a gente faz são receitas familiares, da minha avó”, explica o Leandro.
Nas festinhas entre amigos, o casal levava os salgadinhos sem maiores pretensões e o que era prazer começou a virar negócio. Foi literalmente no boca a boca que a empresa ganhou forma.
“Começaram a chegar pedidos e a gente começou a ver que tinha saída, que era uma ideia legal. Um dia pensamos: por que não trazer o (sabor do) Brasil aqui para Caracas, para a Venezuela?”, conta o empresário.
Apesar dos mais de dois mil quilômetros de fronteira em comum, Brasil e Venezuela ainda são desconhecidos um do outro. Esta distância era minimizada pelo trabalho do Instituto Cultural Brasil Venezuela. Com o fechamento da instituição, em novembro de 2019, a lacuna entre os países se ampliou.
Cafuné
Leandro e Gabriela também buscam mostrar a cultura brasileira através do perfil da empresa em uma rede social. Lá eles explicam costumes e palavras usadas no Brasil, como cafuné e lanchinho, que dá nome ao negócio.
“Pelo Instagram de Tu Lanchinho estamos sempre tentando explicar quais são nossos produtos e seu significado em espanhol. Além disso, estamos fazendo um trabalho de cultura, de idioma. Temos publicações onde explicamos, por exemplo, qual é o significado de Tu Lanchinho e como se pronuncia o nome da empresa”, conta a venezuelana.
Apesar da escassez de alimentos ter chegado ao fim na Venezuela, Leandro não encontra no comércio local alguns produtos usados em pratos brasileiros. Para resolver o problema, ele recorre a importações. Em geral os produtos brasileiros vêm dos Estados Unidos. Antes do fechamento da fronteira, por causa da pandemia, ele também comprava ingredientes em Roraima.
Outro grande problema é a desvalorização do bolívar, a moeda local, que levou a economia venezuelana a uma dolarização de fato.
“Linguiça calabresa não tem aqui. Temos que importá-la e isso aumenta um pouco o custo de produção. A gente tem que importar o polvilho para fazer pão de queijo, isso também mexe no nosso custo. O problema mais grave é a inflação. A gente precisou dolarizar os produtos a partir de uma tabela de custos e com um preço justo para quem compra e para quem vende”.
Inflação e projetos
Segundo o parlamento da Venezuela, controlado pela oposição, a inflação interanual chegou a 3.332%. De acordo com a empresa Ecoanalítica, que faz avaliações econômicas, de março deste ano - quando começou a quarentena - até o final de outubro, os preços dos alimentos subiram cerca de 671% no país.
Mas a complexidade econômica não é empecilho para Leandro e a produção da Tu Lanchinho vem crescendo. Por semana, o casal elabora mais de mil salgadinhos, sem contar as dezenas de brigadeiros e demais quitutes.
Decididos a continuar na Venezuela, Leandro e Gabriela querem automatizar a produção, “mas sem perder o toque caseiro”. Eles, que começaram o negócio do zero, têm planos mais ambiciosos:
“No futuro, pensando mais adiante, temos o sonho de montar um local com salgados da nossa fábrica e que sejam consumidos ali. Um lugar com música...
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"Preso" na Venezuela, paulistano corre atrás de soluções para voltar ao Brasil
10/10/2020
Gustavo Feitoza chegou à Venezuela como turista, pouco antes do governo de Nicolás Maduro impor a quarentena para fear a propagação da Covid-19. Ele é um dos brasileiros que não receberam resposta do pedido de resgate enviado ao Itamaraty. Sem conseguir sair do país, ele se tornou testemunha do drama vivido pela população.
Por Elianah Jorge, correspondente da RFI Brasil na Venezuela.
Há sete meses, Gustavo Feitoza, paulistano de Campinas, vive em uma cidade do interior da Venezuela, onde chegou em plena epidemia. Rapidamente, ele fez amizade com seus vizinhos, com quem se comunica pela janela, pelo muro ou pelos aplicativos de telefone. Os relatos que ouve, diz, são emocionantes. “Um deles contou que eles mataram pombas para comer. A gente se sentiu tão chocado com essa história que dividimos nossa comida com eles”.
Há anos a Venezuela está em hiperinflação. Isso minou o poder de compra e aumentou o empobrecimento da população. Gustavo explica que o consumo de produtos de origem animal agora é acessível a poucos. “A maioria da população aqui é vegana, não por opção, mas porque está tudo muito caro, tudo dolarizado. Comprar carne, leite ou ovos é impossível. A maioria se alimenta de grãos e de verduras, frutas e legumes”, explica.
Gustavo está hospedado na casa de uma amiga, assim consegue equilibrar o orçamento. “Fiz toda uma manobra para esticar o dinheiro que trouxe para passar três meses aqui, mas estou há sete”, explicou. Durante todo este tempo, sem reposta do Itamaraty sobre o pedido de resgate, ele tenta buscar alternativas para voltar ao Brasil. O espaço aéreo venezuelano está fechado e não há previsões sobre quando voltará a abrir.
Sair por terra é complexo: é necessário um documento, chamado de “salvo-conduto”, para circular pelo país durante a quarentena. Mas o problema vai além. O país, que tem uma das maiores reservas de petróleo do mundo, sofre com a escassez de gasolina. Uma cena comum, que pode ser observada em muitas cidades da Venezuela, é ver pessoas empurrando o carro para chegar ou sair do posto de gasolina.
Nesta semana, chegaram três cargueiros trazendo gasolina importada do Irã. A escassez de combustível levou o governo a impor um rodízio para poder abastecer o carro de acordo com a placa. Neste contexto, as pessoas buscam alternativas para fazer os traslados, conta o brasileiro. “A falta de gasolina complica a vida de todo mundo. Aqui no bairro, ter bicicleta é um luxo. Temos que caminhar para chegar a todos os lugares que precisamos. Até tem carro aqui em casa, mas como não tem gasolina não dá para colocar o carro para rodar”.
Sem eletricidade e sem gás
Os moradores de Caracas são considerados privilegiados, embora a capital também tenha os mesmos problemas. Porém nada se compara ao sofrimento dos que estão no interior. Essa situação suscitou protestos em diversas cidades venezuelanas.
Feitoza é um dos milhares que sofrem com os cortes e racionamentos de energia elétrica que há anos acontecem diariamente na Venezuela. Agora todo o país também enfrenta a escassez de gás doméstico. “Por causa da falta de gás doméstico, a gente utiliza o fogão elétrico. Mas aí a gente entra em outra problemática. Não dá para contar todos os dias com a energia elétrica. Às vezes ela é cortada sem nenhum aviso prévio”, comenta.
Depois de tantos meses longe de casa e sem perspectiva de quando conseguirá sair da Venezuela, Gustavo diz que se sente privilegiado "porque pode comprar o arroz, o feijão, muitos não podem. É de partir o coração”. A escassez de gás doméstico levou parte da população a adotar o fogão à lenha. Essa prática tem gerado danos à saúde dos que precisam queimar madeira para preparar a comida.
Um relatório, divulgado em abril deste ano e apoiado pela Organização das Nações Unidas, apontou que a Venezuela está em quarto lugar no índice de países com a pior crise alimentar do mundo. A situação venezuelana é mais crítica que a da Etiópia, que ficou em quinto lugar na lista.
O documento aponta que...
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Brasileira conta como é a vida na Guiana Inglesa, um país de vanguarda econômica
8/15/2020
Há 14 anos Maisa Silva se casou e foi morar em uma região desconhecida para muitos. De lá pra cá, essa amazonense virou referência no mundo dos negócios na Guiana Inglesa, um país com 750 mil habitantes, “muito diferente” e que faz fronteira com Brasil, Venezuela e Suriname.
Elianah Jorge, correspondente da RFI em Caracas
Ela tem duas empresas. Uma dedicada ao setor de cosméticos e a outra, ao de negócios. Acostumada a prestar consultorias internacionais, Maisa tem que explicar onde mora:
“De onde você vem? De Gana? Não, da Guiana. Geralmente eu falo que venho do Brasil. Mas se perguntam onde eu moro, digo que no Caribe, que todo mundo sabe onde fica. Mas se falar Guiana não é todo mundo que conhece. As pessoas nem sabem que existe”.
Maisa começou seu negócio assessorando brasileiros que queriam se estabelecer no país. Bastante comunicativa, se integrou na sociedade guianense a ponto de se mimetizar com os locais.
Além disso, contou com o apoio da sogra. Ela a orientava como lidar com a comunidade e os costumes locais, facilitando a adaptação a um país tão diverso e cujo idioma oficial é o inglês britânico.
A população guianense é composta por cerca de 43% de indianos, quase 30% de afro-guianeses, 16% de guianenses mistos e 9% de indígenas. Além de estrangeiros de diversas partes do mundo
Fazem parte desse mosaico “três religiões muito fortes: os católicos, seguidos pelos hindus e muçulmanos”.
Maisa conta como é essa mistura no dia a dia:
“Mesmo sendo muito racistas entre eles, com os negros e os indianos, nessa questão dos feriados de cada religião eles se respeitam bastante. Nessa parte eu tiro o chapéu”.
Na capital Georgetown moram cerca de cinco mil brasileiros. Muitos são donos de hotéis, lojas de equipamentos para mineração e restaurantes. A maioria chegou há décadas para explorar o garimpo.
Os brasileiros para os guianenses
“Os guianenses gostam de tudo que é do Brasil e que é feito no Brasil. Eles são fascinados. Existe a barreira do idioma, mas mesmo assim as brasileiras se casam com os guianenses e existe uma conexão muito grande”.
Em Lethem, cidade guianesa a poucos quilômetros da capital de Roraima, 80% do comércio é movido por brasileiros que atravessam a fronteira para fazer compras no país vizinho.
Já nos garimpos, localizados no interior do país, os “brasileiros são vistos como a melhor mão-de-obra”, conta Maisa.
Na percepção da empresária, “os guianeses parecem não gostar do próprio país”. Na página referente à Guiana Inglesa do Portal Consular do Itamaraty, há a informação de que cerca de “45% da população vivem fora do país, principalmente no Canadá, Estados Unidos e países do Caribe”.
Em breve haverá um boom econômico na Guiana, mas o país ainda é pobre:
“Temos uma infraestrutura precária, bueiros a céu aberto, a infraestrutura sanitária é horrível. Não temos hidrelétrica no país. Ainda estamos na era do gerador movido à gasolina”
O país recorre à queima de bagaço de cana para gerar energia ou a geradores, como explicou Maisa.
Nas ruas os carros dirigem em mão inglesa, quando o sentido de circulação é pelo lado esquerdo da via, e é alto o índice de acidentes fatais. “É meio arcaico. Às vezes a gente dirige no meio de burros, de cavalos, de bodes atravessando”, explica Maisa.
Mudanças à vista
No início de agosto deste ano, o muçulmano Irfaan Ali, do Partido Progressista Popular (PPP, foi declarado presidente pela Comissão Eleitoral da Guiana Inglesa cinco meses após as eleições.
“Este novo presidente não tem muita experiência na política, mas o vice-presidente tem, já que ocupou este cargo tempos atrás”, conta Maisa ao explicar que a Constituição da Guiana Inglesa não permite que a mesma pessoa volte a ocupar a cadeira presidencial.
O país está em vias de ser um dos mais prósperos da América do Sul. Em dezembro passado começou a ser explorado uma gigantesca jazida de petróleo, encontrada na costa da Guiana em 2016. A estimativa é de que a produção local passe de 52 mil barris de...
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